O professor Romeu Carletto, de Verê, completou a pé os 775 km de Saint Jean Pied de Port, na França, até Santiago de Compostela, ao Norte da Espanha.

“O Caminho de Santiago de Compostela é uma rota secular de peregrinação que converge, independentemente de ser o Aragonês, o do Norte, o Português ou o Francês, para a capital da Galícia, titulada Patrimônio Histórico da Humanidade desde 1992. É na cripta da secular catedral que, acredita-se, repousam os restos mortais do apóstolo Tiago, o Maior, irmão de São João Evangelista”, conta o professor Romeu Carletto, de Verê, que percorreu entre setembro e outubro de 2015 os 775 km do Caminho Francês que separam Saint Jean Pied de Port, na França, até Santiago de Compostela, no Norte da Espanha.

Desde a Idade Média, os motivos que levam os peregrinos a trilhar esses caminhos são diversos, podendo ser religioso, espiritual, como busca por encontrar-se consigo mesmo, pagar promessa, como ação de graças e também como roteiro turístico. Ao completar a peregrinação, recebem a “Compostela”, certificado, aqueles que percorreram os últimos 200 km de bicicleta ou os últimos 100 km a pé ou a cavalo. Ainda assim, a grande maioria anseia, quando possível, percorrê-lo na sua totalidade.
Na entrevista que segue, Romeu Carletto fala sobre sua experiência ao percorrer este caminho e os desafios encontrados durante o percurso, superados pela determinação do peregrino.

JdeB – Como foram os preparativos para iniciar a viagem? Por causa do percurso longo, fez alguma preparação específica?
Romeu – Na parte física, os preparativos iniciaram há cinco anos com caminhadas frequentes de curta distância, e foram intensificados no último ano, com caminhadas de média distância e academia. E quanto aos equipamentos necessários (mochila, saco de dormir, roupas etc.), desde a compra da passagem, em julho.
Há muitos caminhos possíveis, qual deles escolheu e por quê?
O caminho escolhido foi o francês, que leva esse nome por começar em Saint Jean Pied de Port, na França. É o mais longo e o preferido pela grande maioria dos peregrinos, além de ser considerado o mais original dos caminhos. Também é o que apresenta as mais bonitas paisagens, desde seu início, pois o primeiro dia já inicia com a travessia dos Pirineus, na fronteira entre França e Espanha.
A Credencial do Peregrino é o documento fundamental para a viagem. Foi difícil consegui-la? Como se deu o processo?
A credencial é fundamental porque é a comprovação de que você é um peregrino e funciona como um passaporte, e como tal vai sendo carimbada durante o percurso, para depois ser apresentada na Oficina do Peregrino da Catedral de Santiago para receber a Compostela. É necessária sua apresentação para poder hospedar-se nos albergues em todo o percurso. Obtê-la é muito fácil, podendo ser no Brasil ainda, através das associações que representam o caminho, ou no início da peregrinação. Para ter validade, a credencial precisa ser fornecida por uma dessas associações (no Paraná temos duas, em Londrina e em Curitiba), ou por um albergue paroquial ou municipal na França ou Espanha.
São muitos dias de caminhada, como preparou a bagagem?
Há muitos sites com informações sobre o caminho. Eu li muito sobre todos os aspectos que envolviam a peregrinação, e a preparação da bagagem era algo que me preocupava, em função de que somos os responsáveis por carregá-la. Todas as informações convergem na sugestão de que o peso da mochila não deve exceder os 10% do nosso peso corporal, então, deve-se levar o que é estritamente necessário. O que levar depende, em partes, também, da época escolhida para a peregrinação. No meu caso, era a saída do verão e início do outono. As temperaturas já estavam bem amenas e no final já fazia frio.
Como é a estrutura por todo o caminho? Os peregrinos têm locais específicos de hospedagem?
De maneira geral, há por todo o percurso uma boa estrutura de acolhida e acompanhamento do peregrino, principalmente porque o Caminho Francês é o mais procurado. É evidente que cidades maiores oferecem uma melhor estrutura no comparativo com as menores, porém, isso não garante as melhores experiências. Há, basicamente, três opções de hospedagem: os albergues paroquiais (mantidos pela Igreja Católica), os municipais (mantidos pelos municípios) e os privados. Os que oferecem as melhores experiências dentro do que é a intenção do caminho são os paroquiais ou municipais, que foram sempre minha preferência no momento de escolher a hospedagem. Neles, há um espírito de amizade, de companheirismo, de reciprocidade muito grande, além de oferecerem refeições coletivas, o que oportuniza convivência mais próximas com peregrinos do mundo todo.
Qual foi o ponto de maior dificuldade, tanto física quanto psicológica, durante o percurso?
Quando pensamos um caminho de praticamente 800 km, pensamos logo na dificuldade e na preocupação que se deve ter quanto à questão física, mas voltei convencido de que uma preparação, se não mais, tão importante quanto é a psicológica. Tudo o que se vive durante a peregrinação é potencializado: as emoções, as vivências, as alegrias, as dificuldades. Isso tudo aliado ao fato de você estar em outro país, com hábitos e costumes diferentes do seu. Um dos momentos mais difíceis que enfrentei foi durante os temporais típicos da época de transição de estação, a saída do verão e a entrada do outono. Foram dias de chuva intensa, com muito vento e muito frio.

E o melhor momento?
Peregrinar pelo Caminho é algo que mexe com o seu ‘eu’, possibilita um autoconhecimento muito expressivo, faz você reconhecer suas limitações e também suas potencialidades. O Caminho é um conjunto de experiências e vivências, por isso, é difícil escolher um momento, levando-se em consideração que ele é especial antes mesmo de iniciá-lo. Mas chegar em Santiago de Compostela me emocionou muito, pelo sentimento de plenitude que o encerramento da peregrinação desperta.
