Amneris “Néris” e Élcio Tomazoni, Arlindo Berticelli e Arlindo Scheuer contam, nesta entrevista, como era a prática do bolão nas décadas
de 60 a 80 em Francisco Beltrão e região.

Amneris Prolo Tomazoni e Élcio Tomazoni, Arlindo Scheuer e Arlindo Berticell, o Soledade, alguns dos mais antigos praticantes do bolão,
em visita ao Jornal de Beltrão para contar um pouco da história deste esporte na cidade.
Foto: Flávio Pedron/JdeB
O bolão ainda é muito praticado em Francisco Beltrão pelos integrantes Associação de Bolão (Abebel), que mantém o Centro Municipal de Bolão no Bairro Pinheirinho. Nas décadas de 1960 a 1980 o esporte era praticado por muito mais pessoas. O casal Ameneris “Néris” Prolo Tomazoni, 78, e Élcio Tomazoni, 85, Arlindo Berticelli, 89 anos, o Soledade, e Arlindo Scheuer, 92 anos, estiveram no Jornal de Beltrão para uma entrevista em que falaram da época em que praticavam bolão.
Eles contam que, em Beltrão, o bolonismo era praticado no Clube União, no Caça e Pesca – ficava em frente ao Estádio Anilado -, no Bolão Zancan, do Bairro Vila Nova, e no Bar do Sampaio, na Cango. Tinha times de homens e mulheres. Em Pato Branco, o bolão era praticado por homens e mulheres nas sedes sociais do Palmeiras e do Internacional.
Soledade morou em Curitiba de 1983 a 1989 e lá jogou bolão por um clube local. Foi um dos atletas que mais se dedicou ao esporte.

O senhor lembra de quando começou o bolonismo em Francisco Beltrão? Onde era praticado, quem eram as pessoas que praticavam?
Arlindo – Era praticado no Clube União. Na época eu era presidente do clube, inclusive quando peguei o clube, tinha um tipo de bolão, daí botei umas canchas boas pra disputar o estadual.
Que ano foi isso?
Arlindo – Não lembro mais.
Soledade – Eu comecei em 1963 e joguei até que pude.
Até com que idade jogou bolão?
Soledade – Até 83, 84 anos.
E o seu Arlindo continua jogando ou não?
Arlindo – Eu parei há bastante tempo. Tinha nossos times de mulheres e de homens, mas depois nossa empresa precisava de alguém pra vender. Fiquei 15 anos viajando e acabei caindo fora do bolão. Me desliguei porque não tinha mais condições.
Lembra de alguns nomes do pessoal que disputava aqui em Beltrão?
Arlindo – Antônio Zancan…
Soledade – Roberto Grando, Foletto, Antônio Barbieri, Henrique dos Santos, Cobrinha, meu irmão Quintinho, o Edir Coelho. Tem muitos.
Seu Arlindo, os jogos começaram com o União, mas depois teve Caça e Pesca, Vila Nova…
Arlindo – Depois teve mais times, mas o bolão funcionou mesmo no União. Era mais organizado.
Pra ir pra fora de Beltrão, quem pagava as despesas?
Arlindo – Cada um pagava a sua.
Quem eram os melhores jogadores?
Arlindo – A gente tinha uma turminha boa, todo mundo jogava bem. Pra montar esse campeonato estadual deu muita correria porque a gente estava ligado com Guarapuava pra se organizar e disputar. Eu vim do Rio Grande do Sul pro Paraná, e disputei seis anos o estadual no Rio Grande do Sul, com o Atlântico, que hoje disputa o futebol de salão.
O senhor lembra quantos anos tinha quando começou a jogar bolão?
Arlindo – Tinha uns 12,13 anos.
Tinha competições aqui em Beltrão também?
Arlindo – Na época não tinha.
Lembra quando foi o primeiro ano que disputaram o estadual de bolão?
Arlindo – No Paraná foi em 1968.
Soledade – O campeonato de 68 era uma chave de quatro equipes.
Ficaram em que lugar na época, lembram?
Arlindo – Segundo lugar, perdemos em Cascavel.
Soledade – Ganhamos em Guarapuava, em Laranjeiras do Sul e perdemos em Cascavel por um palito. Naquele tempo dava um rombo nos times, que se perdia por 500 palitos de diferença. Hoje em dia não se perde por 10.
Você falou que tinha etapas? Tinha a etapa de Beltrão, de Cascavel ou era só num local a competição?
Arlindo – A competição era em cada cidade que disputava.
Élcio, o senhor começou a jogar com que idade?
Élcio – Na década de 60. O Clube União era na frente de casa, era só atravessar a rua.
Élcio – No Sete de Setembro. Depois fomos jogar bola, mais uma caixa de cerveja. Num sol, eram três horas da tarde. Mas naquele dia só brinquei, não joguei nada sério.
Seu estilo como que era?
Élcio – Meu estilo era forte. Acredite se quiser, mas eu furei a parede do União.
E o seu Arlindo, como era seu estilo de jogar?
Arlindo – Eu jogava bem, já jogava desde criança no Rio Grande do Sul.
Mas era mais de pancada, mais de soltar a bola, como que era?
Arlindo – Eu controlava conforme a cancha. Às vezes tem que jogar devagar, outras vezes tem que jogar mais forte.
E o seu Soledade, como o senhor fazia pra jogar as bolas?
Soledade – Muito devagar, bem lento. Nunca com força..
Conte da sequência dos nove.
Soledade – Foram muitas de 9 de 10 bolas. Lá no Bolão do Sampaio tinham anotado muitas somas de 90 e no Caça e Pesca também. Lá também foi meu ninho.
Como é essa questão do peso da bola?
Arlindo – Na bola é colocado chumbo pra aumentar ou pra diminuir o peso. Tem bola com dez quilos, com 12 e às vezes elas puxam pra um lado, então tem que controlar com o braço.
Cada bolão tinha suas bolas, mas o pessoal que ia competir de um lugar pro outro, levava as bolas ou não?
Arlindo – Cada clube tinha as bolas.
Então tinha vantagem pro pessoal da casa?
Arlindo – Não, na realidade o bolão é um jogo técnico, tem muita coisa que se observar pra jogar certo.
O União fazia competições regionais aqui?
Arlindo – A gente fazia muita competição. Na época o bolão era bem disputado, tinha muita gente jogando.
Esses jogos eram mais no sábado e domingo ou tinha durante a semana também?
Arlindo – Na semana tinha os treinos à noite. Uma noite era um time, na outra noite era outro.
O que o senhor diz deste esporte?
Arlindo – Esse é um esporte da amizade, não tem briga.
Hoje a gente vê no esporte muita provocação entre os torcedores. Naquela época como era?
Élcio – Quem tava fora ia pra torcer. Até o momento em que você soltava a bola era silêncio, depois que soltava começava a gritaria.
Hoje o pessoal procura desconcentrar os atletas (risos)…
Élcio – Sim. Eu joguei em Dois Vizinhos, Coronel Vivida, Marmeleiro, Renascença, Santa Izabel, Chopinzinho, Realeza, mas era tudo festa.
O senhor sempre jogou pelo União?
Élcio – Sim, morava perto do clube (na frente da casa dele). Eu gostava.
Por morar na frente do clube, o senhor lembra quantas vezes por semana atravessava a rua pra ir jogar?
Élcio – Sempre que tinha treino eu tava lá. Era gostoso, revia os amigos, era sempre uma brincadeira.
Dona Néris, sobre as mulheres no bolão, quem eram as melhores, como era adesão, quem praticava?
Néris – Não vou lembrar de tudo, mas lembro da Maria Magioni que era nossa campeã. Foi inclusive campeã do Paraná. Ela não tinha plancha, jogava bem onde a gente ia. A gente sempre deixava ela pra fechar a rosca, porque se a diferença fosse pequena, ela resolvia o problema. Naquela época no Clube União tínhamos três grupos, Águias A, B e C. Não tinha outro esporte, e o bolão dava muita alegria pro povo. A gente jogava uniformizada. E tinha rivalidade com os times de Pato Branco, mas com times de outros municípios não. O bolão é um esporte sadio, reunia família, a piazada reunia os palitos. Eu tinha uma bola que lustrava e cuidava, mas não jogava bem. Na plancha direita eu até ia bem, mas na esquerda fiz alguma banda. Nunca esqueço que a dona Izabel comprou uma bola especial, porque ela era cardíaca, ela levava aquela bolinha pequeninha de casa e jogava.
A maioria das mulheres eram esposas ou namoradas dos jogadores?
A maioria era casada. Formamos aquelas três equipes de Águias e também times de casal.
Na semana também tinha um dia pra vocês treinarem?
Tinha. Só que a gente treinava pra jogar bem e ia segurando as melhores pro A. No B e C eram as mais fraquinhas. Foram tempos bons.
A senhora lembra de algum campeonato que foi conquistado pelas mulheres?
Não lembro, mas ganhamos sim, nossa equipe A era muito boa.
E o pessoal quando ia pras competições eram homens e mulheres no mesmo dia?
Quando era de mulheres, era só de mulheres, mas também tinham as competições de casais.
Seu Arlindo, na época isso aqui era só estrada de chão. Tinha que sair de manhã daqui?
Arlindo – Saía cedinho, jogava e voltava.
E dia de chuva?
Arlindo – Às vezes não podia ir, porque a estrada era meio ruim, mas se desse pra ir a gente ia.
Queria que contasse um jogo marcante do União?
Arlindo – Marcante foi o estadual em 68.
Um jogo marcante que o seu Soledade teve?
Entre muitas de vitórias, cito quatro: no CTG Recordando os Pagos, num campeonato em homenagem ao agora falecido Antônio Zancan, em que conquistei 179 palitos. Em Curitiba, na AABB, atirei 80 bolas sem parar e conquistei uma taça. Num campeonato interno de bolão, conquistei de novo 179, no Clube Araucária. Na AABB foi com 17 jogadores, era um jogo pra inaugurar os palitos elevatórios, que são automáticos. Não tenho a soma, mas de 34 fiquei em primeiro lugar também.
E fatos engraçados que o senhor lembra?
Brincadeiras sempre saíam, mas eu era mais tranquilo. Eu gostaria de agradecer aos meus companheiros de muitos anos de bolão por terem vindo aqui hoje.
Seu Arlindo, vocês conquistaram campeonatos, gostaria que falasse dessas conquistas.
Arlindo – Tivemos muitas conquistas, mas locais e épocas não lembro mais. A gente tinha um time muito bom. Mais uma coisa sobre o bolão, eu nunca vi uma encrenca entre quem disputava bolão. Quando tá jogando, todo mundo quietinho, o bolão é um esporte muito saudável.
Hoje o bolão está se restringindo a poucas pessoas, né?
Arlindo – Começou a cair, que pena. Os (nossos) filhos são mais do futebol.
Hoje às vezes as pessoas remuneram outras pra jogar. Como era na época?
Arlindo – Na época do estadual, tinha dois de Marmeleiro, só que a gente não pagava.
O seu Soledade jogaria ainda?
Soledade – Gostaria de tentar, mas não sei se consigo.
E seu Arlindo?
Arlindo – Não tenho mais condições. Parei. Com 92 aninhos não tem mais condições de jogar. Pena que é um esporte que tá muito parado, tem que ser mais trabalhado pra não parar. A única coisa que às vezes atrapalha um pouco é a cerveja (risos).
Soledade – Meu neto me pediu uma bola e dei uma de presente pra ele. Uma bola de dez quilos, ele gosta muito de jogar bolão e cresceu aprendendo a jogar comigo.
Arlindo – Eu tenho uma bola guardada lá em casa, de lembrança.
E as lembranças Élcio, tem medalhas também?
Élcio – Medalhas não, nunca joguei campeonatos. Eu era urso ou vice-urso, companheiro pra festa.
D. Néris, um fato engraçado?
Néris – A gente jogava com muita vontade. Que nem eu falei, a gente ia em família pros jogos, foram muitas vitórias, mas faço questão de destacar a Maria Magioni. Ela foi campeã em todos os jogos que jogamos, saudades daquele tempo.