Como o objetivo da “Meninos, eu li” é ser a mais original possível, escolhi um livro não muito conhecido. “O Sumiço da Santa” foi publicado em 1988. É um dos últimos volumes lançados pelo autor.
Para os católicos, Santa Bárbara. No candomblé, Iansã. Em “O Sumiço da Santa”, Jorge Amado aborda sincretismo religioso, mestiçagem, crítica política e comportamento social. É a primeira vez na coluna do Jornal de Beltrão que falo de uma obra deste baiano – escritor que teve suas histórias traduzidas em mais de 50 idiomas e, além de ser o meu predileto, é encarado por mim como um exemplo de vida a ser seguido.

Na Bahia, onde santos e orixás são a mesma coisa
“O Sumiço da Santa” é ambientada na Salvador dos anos 1970. Portanto, estamos na Ditadura Militar. Uma exposição de arte sacra mobiliza a cultura, imprensa e autoridades locais. A grande atração do evento organizado pela Igreja Católica é a vinda de uma imagem de Santa Bárbara, que para os candomblecistas é Iansã.
Essa imagem, há quem acredite ter sido esculpida por Aleijadinho e chega à capital da Bahia de barco, vindo de Santo Amaro da Purificação, terra de Caetano Veloso e de Dona Canô.
Aliás, neste livro Jorge Amado presta homenagens a algumas figuras importantes baianas, incluindo-as como personagens da história. Além de Caetano e de Dona Canô, filho e mãe, respectivamente, também são citados o pintor Carybé, o capoeirista Mestre Pastinha e a mãe de santo Menininha do Gantois.
Ocorre que, quando a imagem chega a Salvador, ela simplesmente some no cais do porto. A partir disso, são narradas as 48 horas de busca incessante pela imagem nos quatro cantos da cidade.
Diante de todo o alvoroço, a Polícia inicia as investigações e aponta como principais suspeitos padres de vertente esquerdista.
Paralelo ao rapto, é narrada a história de Adalgisa, uma mulher muito católica, que se dedica dia e noite à Igreja, mas que ao mesmo tempo é preconceituosa com outras religiões. A sobrinha da megera, Manela, é adepta do candomblé. Sofre muito nas mãos dessa tia, em razão da intolerância religiosa.
Só que, como toda pessoa baiana e brasileira, Adalgisa é mestiça. Ela é filha de uma negra e de um espanhol – fato que faz de um tudo para esconder. O que ela não imagina é que quando criança foi consagrada em um ritual do candomblé e na hora em que menos esperar esse lado sincrético da vida vai desabrochar.
A história envolvendo o mistério do desaparecimento da Santa e os conflitos familiares e religiosos giram sempre em torno de Santa Bárbara, “a do trovão”, a Iansã.
Às vezes, a crítica engana
Comprei “O Sumiço da Santa” ainda em 2020. No entanto, logo após ele ir para a minha estante, li alguns comentários negativos na internet sobre a narrativa. E como tem mais de 400 páginas, essa crítica me afastou da obra. Tanto que ficou “na fila” por uns 8 meses.
Adquiri outros livros no período e deixei essa história em segundo, terceiro, quarto plano…Então, no início de 2021, resolvi que era a chance de encará-la. Afinal de contas, era uma meta de vida ler todas as obras de Jorge Amado (fato que conclui no início de 2022). Encarei o quase camalhaço. Então me surpreendi e me encantei. Me senti envolvido com a trama, que ao mesmo tempo é divertidíssima e misteriosa.
Referência
Título: O Sumiço da Santa;
Gênero: Romance;
Autora: Jorge Amado;
Número de páginas: 277;
Editora: Companhia das letras;
Ano de lançamento: 1988.