20.4 C
Francisco Beltrão
terça-feira, 27 de maio de 2025

Edição 8.213

28/05/2025

Eu e os livros

“Você foge da sua vida para os livros”, me disseram um dia, já não sei mais quando. Uma dessas frases da qual nos defendemos por anos, talvez para sempre. Talvez seja essa a origem de meu impulso irrefreável por livros.

Descobri, ao longo do tempo, que posso levá-los a todo lugar. Se eu precisar me mudar — minha biblioteca é minha casa. Depois de posicionados os móveis, arrumadas as roupas, os pequenos objetos, pendurados os quadros, falta somente uma coisa: os tijolos do meu mundo — que trazem, cada um, um mundo; esses tesouros que se fecham sobre si mesmos guardando, em narrativas alheias, nosso segredo.

E sempre tem a pilha de próximos livros, aquela pequena montanha que só cresce, ela pode estar na cabeceira da cama ou ao lado do sofá (cuja fila de tempos em tempos preciso redefinir), mede a distância entre o que minha vida é e o que eu gostaria que ela fosse.

- Publicidade -

Sim, é com os livros que tenho a sensação de chegada, é o sofá preto ou a poltrona na sacada, me acolhem, com um exemplar aberto, o meu lugar preferido em todo o universo. Defendendo-me da acusação de fuga, fui aprendendo que os livros, os romances, as narrativas, organizam o caos do mundo. Convertem sua estranheza em algum tipo de familiaridade, ou, então, vertendo em forma o que era pensamento e sensação, me permitem suportar o insuportável, sustentar as contradições da vida e das pessoas, me permitem ser tantas enquanto sigo sendo eu.

Mais uma descoberta, descobri com o tempo que a ficção não é uma brincadeira para nos entreter; ainda que, sim, possa nos entreter, mesmo que seja muito prazeroso entrar num lugar narrativo bem construído, um daqueles que nos fazem querer parar tudo até que a última página seja lida.

Ficção, é coisa séria: é a matéria-prima do sonho e, então, o que nos permite imaginar, o que nos permite construir, ou ao menos nos direcionar para o futuro. Ainda que, quando ele chegue, seja sempre diferente do que havíamos sonhado. Apesar da importância da leitura, lerei, lamentavelmente, tão pouco ao longo da vida. Se lermos um livro por semana desde a adolescência e vivermos o bastante, não passaremos muito de dois mil livros em toda a nossa existência.

E à acusação de fuga feita há tempo, hoje posso responder que os livros não me proporcionam fuga nenhuma porque eles também são minha vida, também fazem parte dela e me ajudam a compreender minha resposta para aquilo que, às vezes, não tem resposta.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Destaques