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Francisco Beltrão
sexta-feira, 06 de junho de 2025

Edição 8.220

06/06/2025

José Dalle Laste:A boa terra de Salgado Filho, do queijo e do vinho

José Dalle Laste é um dos produtores que fazem comercialização na 16ª Festa do Vinho e do Queijo de Salgado Filho deste fim de semana. Sua história é semelhante à maioria das outras histórias: agricultor que veio do Sul, atraído pela boa terra do Paraná, ajudou a desbravar e construir esta região e daqui não pretende mais sair.
Sua propriedade, que é cortada pela antiga estrada Salgado Filho-Francisco Beltrão (antes do asfalto, que mudou o traçado), de 22 alqueires, é um capricho. Tanto pela estrutura e organização como pela diversificação. Além de vinho, ele produz leite, aves, suínos e outros produtos da roça. E dois de seus cinco filhos, já casados, permanecem trabalhando com ele.
José Dalle Laste nasceu em Carlos Barbosa (ainda pertencia a Garibaldi – RS), em 17 de agosto de 1937. Aos três anos, a família mudou para Itá (SC). Em 28 de maio de 1962, José casou com Lourdes Fantinelli e uma semana depois mudava para Salgado Filho, onde seu pai, Olindo, havia comprado, dos irmãos Arcelino e Arduíno Dávi, uma propriedade de nove alqueires. O pai acabou retornando para Santa Catarina, mas cinco, dos onze irmãos de José, também se estabeleceram em Salgado Filho: Jacó, Antônio, Lourenço, Nilo e Ana.
Os cinco filhos de José e Lourdes Dalle Laste – Elizete, Moacir, Adelar, Amarildo e Odair – já lhes deram oito netos.
A arte de fazer vinho ele aprendeu com os pais (Olindo e Júlia Spader Dalle Laste), que haviam aprendido com os avós (Jácomo Dalle Laste, pai de Olindo, veio da Itália).
Segunda-feira desta semana, enquanto chovia e esfriava, José Dalle Laste recebeu o Jornal de Beltrão em sua cantina, para esta reportagem.

JdeB – O frio no inverno, pra uva é bom?
José – Pra uva, quanto mais frio melhor é. Antes de ela começar a brotar, porque depois que brota tem que esquentar pra ficar boa.

JdeB – Voltando bem atrás, quando o senhor começou a ajudar o seu pai fazer vinho, o que lembra?
José – Ah, eu me lembro que quando o meu pai fez o primeiro vinho, eu ajudava ele, era eu que esmagava o vinho com os pés. Que antigamente, todo mundo sabe, não tinha desengaçadeira, não tinha máquina nenhuma pra moer, e tinha que moer com os pés. E eu era o que  meu pai mais procurava pra moer.

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JdeB – E o senhor gostava?
José – Gostava, só que doía as costas, porque o porão era meio baixinho e tinha que ponhar uma caixa, e dentro daquela caixa tinha que ficar meio acrocado. Daí sofria um pouco por causa disso.

JdeB – O seu pai fazia bastante vinho?
José – Ele fazia bastante, fazia uma média de uns 4 mil, 5 mil [litros] por ano de vinho, e um parreiral bem bonito, lá em Santa Catarina, em Itá.

JdeB – E é tradição da família, o seu avô também fazia vinho?
José – Todos eles. O meu avô, e principalmente um tio meu, irmão do meu pai, que morava bem pertinho, aquele produzia 25, 30 mil litros. Tinha um parreiral muito grande, uma família muito grande. Eles é que faziam bastante. Nós ajudava eles, eles vinham ajudar nós, se trocava uns dias pra trabalhar no vinho, na colheita da uva.

JdeB – E que segredo seu pai lhe contou pra fazer vinho bom?
José – Bom, o segredo, o que tem que fazer é colher uva quando tá bem madura, quando tem o grau certo, e tem que escolher os grãos podres e os grãos verdes, tem que afastar tudo, não pode deixar junto. E daí esmagar ela bem, e deixar fermentar.

JdeB – E se é um ano de muita chuva, o senhor põe açúcar?
José – Sim, daí tem que por açúcar, tem que completar até os 18 graus. Senão ele fica amargo, fica com acidez. E não pode pôr demais também! Tem que ter a medida certa.

JdeB – O senhor produz vinho desde que chegou aqui?
José – Isso, quando eu vim pro Paraná, começamos, fizemos um parreiral não muito grande, só pro consumo da família. Daí nós colhia uva todo ano, vendia também porque o pessoal aqui quase não tinha parreiral, eu fui um dos primeiros que plantei parreiral, vendia uva aí pro pessoal da cidade e fazia o vinho pra consumo da família.

JdeB – E vendia vinho?
José – Naquele tempo nem vendia, o que sobrava fazia vinagre, senão quando vinham os vizinhos a gente passava uns dias, o domingo e as noite tomando vinho, pra passar as horas.

JdeB – E o senhor sempre tomou? Nunca lhe fez mal um vinho?
José – Ah, nunca. Eu sempre, todo dia, uns 2, 3 copo de meio dia, no almoço. Mal nunca fez, a não ser que tome demais, daí pode até ser que faça mal.

JdeB – Nem que esteja gripado, e no verão também vai?
José – Ah, sim, no verão sempre, sempre, direto. Gripe ou não, sempre tomei vinho.

JdeB – Chegou a ficar bêbado alguma vez?
José – (risos) Agora, depois que cheguei no Paraná, não, mas com meus companheiros, com meus primos, nós fazia algum porre lá em Santa Catarina. É por farra, a gente fazia, um queria beber mais que o outro. (risos). Então, antes de vir pro Paraná. Mas depois, aqui, nunca fizemos porre.

JdeB – O que foi que trouxe seu pai, o senhor e depois seus irmãos lá de Itá, perto do Rio Uruguai, aqui pra Salgado Filho, em 1962?
José – Olha, o que atraiu nós aqui aquele tempo foi a colheita do feijão, porque o feijão é o que valia dinheiro, feijão cavalo e feijão preto, e as terras eram mais fortes aqui no Paraná, nós viemos a Salgado Filho porque aqui o feijão dava até dois sacos, dois e meio, até três por quilo de planta.

JdeB – Sem adubo?
José – Sem adubo, sem nada.

JdeB – Como era a terra que vocês compraram, tudo mato ou já tinha parte derrubada?
José – Não, quando eu vim aqui, o meu pai veio um ano antes e comprou um terreno. Já tinha moradia, tinha um pouco desmatado e o resto era quase puro sertão. Derrubamos bastante mato.

JdeB – E o feijão dava bem na terra de mato?
José – O melhor é na terra de mato, mas depois ele continuava, podia lavrar a terra que dava bem igual, a mesma coisa. O terreno é próprio pra feijão mesmo, naquele tempo, hoje já não dá mais tão bem.

JdeB – E debulhava no mangual?
José – É tudo no mangual. Debulhava no cacete. Depois, dali dois anos que eu morava aqui, comprei uma trilhadeira, inclusive a primeira trilhadeira que veio a Salgado Filho foi eu que comprei, uma Vencedora, comprei em Francisco Beltrão. Uma trilhadeira Vencedora, que até me encontrei com meu parente lá, o Traiano, eles eram vendedores e eu comprei deles, eles me ajudaram, fizeram um preço bom, e daí comecei a trabalhar pra malhar feijão, milho e trigo aí pro pessoal, pros vizinhos aqui de Salgado Filho. Ninguém tinha trilhadeira.

JdeB – Vendeu porcos e comprou a trilhadeira.
José – O porco era o que valia que nem ouro quase, tipo sete porco eu comprei uma trilhadeira, paguei com motor e tudo. Sete porco gordo.

JdeB – E ainda hoje o senhor usa a sua trilhadeira?
José – Uso ainda. Tá ali guardada, nunca tombei, nada, tá ali quase que nem nova. E tô usando sempre aí pra quando tiver milho pra trilhar. Só milho, porque feijão a gente não planta mais.

JdeB – Comparando com aquele tempo, a terra de Salgado Filho continua boa?
José – Continua, só eu acho que as doenças que apareceram mais, a terra seria boa ainda, se fosse terra nova, mas tem muita doença, naquele tempo não tinha tanta doença no feijão, e nada, e hoje em dia já tem que ser bem tratado, senão não colhe nada.

JdeB – O parreiral também tem doenças?
José – O parreiral tem um pouquinho de doença, mas não tanto porque eu cultivo um parreiral de uva bordô, e a uva bordô é mais rústica, quase não dá doença. Mas sempre tem que ficar de olho, tem que ir tratando também pra ela produzir bem e dar uma uva doce, tem que ser tratada.

JdeB – E a venda do vinho, hoje, é fácil?
José – Áh, o vinho eu consigo vender, e vendo tudo aqui em casa, não saio pra vender, pra fora, eu fiz uns freguês ali pra Beltrão, Pato Branco, ali pro lado de Cascavel, Capitão Leônidas Marques tem uns freguês bom, eles vêm pegar tudo aqui em casa.

Jdeb – O senhor chega a comprar uva pra vender o vinho, não é?
José – Ah, sim, eu compro dos vizinhos, a metade quase do que produz, por exemplo 30% a gente compra uva daí.

JdeB – E o que o senhor diz da Festa do Vinho e do Queijo?
José – Áh, a festa, pelo que mostra, tá bem animada, acho que vai ser uma… todas festas que deu em Salgado Filho, uma sempre foi maior que a outra, e eu acredito que esta também mostra de ser que nem a do ano passado ou maior também.
JdeB – E pros produtores de vinho e de queijo, qual é a importância que tem, seo José?
José – Mas olha, a importância é que, por exemplo, pra vender o vinho, o pessoal vem ali pra degustar o vinho, e depois ele vai pra casa, e dali uns dias ele já vem pegar e em uma quantia maior. Porque na hora ali é difícil levar bastante por causa do excesso de peso e tudo, mas a maioria vem pegar depois, vem pegar na casa. E pros produtores de queijo a mesma coisa, eles vendem uma quantia bem grande de queijo, queijo e salame. Mas eles também fazem fregueses de fora, de longe, que depois vêm pegar na festa.

JdeB – E o senhor investiu bem aqui, caprichou na sua cantina, sua propriedade toda está bem caprichada. Isso aqui é também consequência da boa terra que o senhor encontrou e do trabalho que o senhor fez?
José – É isso mesmo. A gente foi trabalhando e caprichando, e daí vendo lá na cidade, de construir, porque o vinho tem que ter um lugar também adequado, não é um produto aí que qualquer lugarzinho serve pra isso. O vinho tem que ter uma cantina, ou vamos dizer uma construção assim que não esquente muito, porque o vinho não pode esquentar de dia bastante e de noite esfriar, ele tem que ficar num ambiente mais ou menos sempre igual, pra ele ficar bom. Daí resolvemos construir um pouquinho, aí a prefeitura ajudou, financiamos também, uma parte, na Cresol.

JdeB – O seu pai conseguiu que o senhor seguisse esse gosto pelo vinho, e o senhor encaminhou os filhos também?
José – Mas olha, eu tava dizendo pra eles, vocês têm que aprender, eu tô ensinando pra eles porque eles têm que aprender e depois continuar fazendo sempre, porque o parreiral tá ali, e tá produzindo bem, um parreiral bom, tem que ter o capricho também de continuar e fazer.

JdeB – Hoje, qual é a importância do vinho pra sua propriedade?
José – Ah, representa… dá uma receita mais ou menos boa pela quantia de terra que a gente ocupa, dá uma receita até razoável em vista de outras plantas que a gente planta ali, o milho é barato, o feijão não dá mais, e o porco também, dá pouco. Na verdade, o vinho é que dá mais lucro até do que outras coisas que tem na propriedade.

JdeB – O seu pai voltou pra Santa Catarina, mas o senhor não parece estar a fim de deixar Salgado Filho, não é?
José – Ah, não. Eu já tô com 73 anos, acho que vou ficar aqui pra sempre, até que tem os filhos aí, eu ajudando eles, e eles me ajudando.

JdeB – E como o senhor vê o futuro de Salgado filho?
José – Tá meio parado, meio devagar, mas ainda a gente acredita no futuro de Salgado Filho, porque não tem como nós agora sair daqui pra ir em outro lugar, eu não vejo mais futuro pra lá, porque vai querer vender um terreno aqui, por ser acidentado ele já não vale muito, e vai querer comprar num lugar melhor, compra muito pouco terreno. Então tem que ficar aqui onde o terreno, nem que acidentado, a gente tem um parreiral, tem vaca de leite, tem um aviário, cria uns porco, aqui é um lugar que a gente pode ficar sem botar um capital muito grande, que aqui a gente já tem tudo. A gente criou família aqui, estamos criando, já tão vindo os netos, e vamos ficar por aqui.

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