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Francisco Beltrão
segunda-feira, 16 de junho de 2025

Edição 8.226

14/06/2025

ENFRENTANDO O ESTEREÓTIPO

Conheça Karen e seu caminhão rosa Barbie-truck

“Ser motorista de caminhão é mais do que uma profissão para mim, é a realização de um sonho que eu tinha desde criança. Ver as estradas, conhecer lugares diferentes e sentir a liberdade da estrada são experiências únicas que me encantam todos os dias”, Karen Aline de Souza Paini, 26 anos.


Karen é motorista de um Scânia rosa, que chama a atenção por onde passa, da empresa Gabiza, de Marmeleiro. Foto: Arquivo pessoal.

Por Niomar Pereira – Apesar de serem maioria no Brasil, com 51,8% da população, as mulheres ainda enfrentam dificuldades para ingressar em certas categorias profissionais. No setor de transporte de cargas, por exemplo, a presença feminina é pouco significativa.

A Secretaria Nacional de Trânsito aponta que apenas 2,81% das Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs) para veículos pesados são de mulheres, enquanto os homens correspondem a 97,19%. A beltronense Karen Aline de Souza Paini, 26 anos, é uma das mulheres que desafiou o estereótipo e seguiu seu sonho de se tornar motorista de caminhão.

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Inspirada por seu padrasto, que era caminhoneiro, e pelas experiências de vida no interior – ela cresceu em um sítio – Karen decidiu enfrentar o preconceito e buscar um espaço na profissão que até pouco tempo atrás era raro ver mulheres atuando. “Quando ainda menina fiz algumas viagens com ele [padastro] e a minha mãe. Eu achava o máximo andar de caminhão e algumas vezes ele dava o caminhão para minha mãe dirigir na estrada de chão.”

Coração estava na estrada

Após passar por diferentes empregos, Karen percebeu que seu coração estava na estrada. Iniciou sua jornada de aprendizado assistindo a vídeos no YouTube sobre a profissão de caminhoneira e, com determinação, conseguiu alterar sua CNH para carreta. “Eu não sentia feliz em estar em local fechado, exercendo aquelas funções. Para mim era entediante.”

Além disso, a paixão pelo mundo dos transportes e a vontade de vencer um obstáculo que algumas mulheres já tinham superado, foi alimentando o desejo da Karen. “Muitas vezes passava caminhão e era mulher dirigindo eu sentia uma admiração em vê-las pilotando algo tão grande. Ficava encantada, pensando: será que é difícil, será que eu conseguiria pilotar uma máquina desse tamanho?”

Enfrentando dificuldades como a falta de oportunidades para mulheres sem experiência, Karen defende a igualdade de gênero no setor de transporte e sugere a criação de vagas com treinamento para capacitar novas motoristas. “Eu queria algo em que eu me sentisse útil, como hoje me sinto, em pegar uma carga com o compromisso de descarregar lá em outro estado. Quando você finaliza a viajem vem a sensação de dever cumprido.”

Karen Aline tem 26 anos e ingressou em uma profissão que é dominada por homens. Foto: Arquivo pessoal.

O trabalho é bruto

E ela tem mais uma dica, pois trabalhar com caminhão requer muita força física e disposição. “As mulheres que têm o sonho que estejam preparadas para enfrentar o trabalho bruto. No graneleiro eu tinha que puxar lona, desmontar tampas, amarrar carga, limpar a carreta após descarregar e era um trabalho muito cansativo. Quando era algo mais pesado que eu não dava conta pedia ajuda a alguém, mas nem sempre vão te ajudar.”

Nem tudo é maravilha no mundo de quem vive na estrada, ainda mais para uma mulher, e ela aponta a necessidade de melhorias nos postos de combustível, com banheiros adequados para as caminhoneiras. “Que os postos de combustíveis e as empresas de carga ofereçam um banheiro separado para nós. Muitas vezes a gente chega e só tem banheiro masculino, as vezes nem tranca tem nas portas e quando tem é em condições precárias de fazermos uso.”

Sobre preconceito por ser mulher, ela diz que nunca aconteceu, contudo, sabe de colegas mulheres que já passaram por isso. “Lugar de mulher é onde ela quiser. Se acontecer comigo é isso que irão escutar de mim.”

A chance para começar

Quando começou, a motorista conta que mandou currículo para várias empresas do Brasil e foi chamada por uma de Santa Catarina. Lá teve oportunidade de aperfeiçoar fundamentos da profissão, fazendo cursos de direção defensiva e aprendendo mais sobre o funcionamento dos veículos. “Depois eles colocam você viajar com um motorista que já tem experiência para ele treinar você na estrada e foi assim que eu consegui meu primeiro emprego de caminhão. Comecei com um FH 460 numa carreta LS graneleira, carregando grãos, cargas líquidas envasadas, materiais siderúrgicos entre outros.”

Depois de nove meses ela conseguiu emprego em uma empresa de Marmeleiro. Atualmente, Karen é motorista de um caminhão Scânia rosa na empresa Gabiza, onde transporta cargas congeladas e refrigeradas, além de paletizadas. Sua rotina é organizada e cautelosa, prezando pela segurança no trânsito. “Na estrada tem o perigo do trânsito, os acidentes o perigo da criminalidade e roubos que acontecem muito no nosso setor de transportar cargas.”

Assédio, aqui não!

E ainda precisa lidar com o assédio no dia a dia, cantadas e pedidos do número de telefone. Karen é comprometida em um relacionamento e conta como faz para despistar. “Por ser um ambiente predominantemente masculino, é natural que como mulheres chamemos a atenção, mas o respeito deve sempre vir em primeiro lugar. Conforme trabalhamos, buscamos apenas que nosso espaço seja respeitado. Queremos nos relacionar bem com todos, trocar ideias e conversar sem que haja más intenções envolvidas. Felizmente, muitos colegas sabem conversar e nos respeitar, mas infelizmente, ainda existem alguns que não agem dessa forma.”

Por ser todo rosa, o caminhão ganhou o apelido de Barbie-truck. Inclusive, Karen quer ir ao cinema de caminhão para ver o filme da Barbie, recém-lançado e que criou um “onda rosa”. A motorista se sente realizada em sua profissão e acredita que é preciso persistência, capacitação e coragem para alcançar os sonhos. Se diz abençoada por ter realizado seu objetivo de ser uma caminhoneira e espera que, no futuro, mais mulheres conquistem seu espaço na estrada.

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