Beltrão

Camilo Detoni, advogado em Realeza, foi da primeira turma do Ginásio La Salle de Francisco Beltrão, em 1962. Em tópicos, ele conta como foram aqueles tempos para ele. O estudo era bom, havia disciplina, mas a comida era ruim. Aulas de manhã e à tarde, mais duas horas à noite. Não gostava de ir à missa todas as manhãs. Todos tinham apelido, não havia bullying. Cada um tinha suas tarefas.
– Irmão Roberto foi quem me recrutou, mais tarde foi substituído nessa atividade pelo Irmão Cirilo. Ele visitou meu pai no decorrer do ano de 1961, recrutando alunos com vocação para irmão lassalista.
– Eu franzino, meu pai era comerciante e comprava feijão, tinha sacos de 80 kg. Café Brasil. Eu torcia para meus irmãos mais velhos não aceitarem. Aceitei na hora. Meu pai dava preferência para o mais velho e assim sucessivamente, todos não podiam sair de casa, pois precisava que alguns filhos o ajudassem.
– Disciplina ponto alto. Porém, comida era ruim. Não se podia ter dinheiro, só os externos, todos tinham que ser iguais. Se recebia comida de casa — minha mãe sempre mandava —, tinha que dividir com os colegas do grupo ao qual pertencia.
– No primeiro ano, saí de casa em meados do mês de fevereiro e retornei só na véspera do Natal. Ano inteiro sem ver pai, mãe e irmãos. Eu estava com apenas 11 anos de idade. Foi difícil, chorava à noite de saudades dos pais de molhar o travesseiro.
– Durante o almoço e jantar, era hábito leitura enquanto almoçávamos. Leitura era sequencial entre os juvenistas, ou seja, pela ordem, um após o outro, sempre se sentava no mesmo lugar.
– Eram formadas equipes de limpeza dos banheiros. Limpeza dos dormitórios. Limpeza de salas de aula. Limpeza de outras dependências (capela, corredores, pátio etc.). Lavagem das louças e talheres.
– Estudei língua francesa desde o primeiro ano, o que me ajudou no vestibular, tirando nota excelente. Estudei francês nos quatro anos do ginásio.
– Todos tinham oportunidade de aprender um instrumento. Eu, como fanático por futebol, escolhi marimba (ou xilofone), pois era fácil e, portanto, mais rápido. Hoje lamento não ter aprendido violão, gaita ou piano. Faltou uma melhor orientação.
– O estudo era no período da manhã e à tarde, com exceção das quartas-feiras e sábados, quando íamos para a Vila Nova, onde os Irmãos tinham uma propriedade rural, local onde se plantava milho, arroz, feijão e verduras em geral. Eu, como era magrinho, ficava encarregado de levar água para os que trabalhavam na capina. Só no ano de 1963 ajudei a capinar.
– À noite, após a janta, pequeno período de no máximo 15 minutos para higiene pessoal, depois duas horas de estudo antes de dormir.
– Dormitório coletivo era lugar sagrado, assim como os banheiros, não se podia conversar e nem ligar rádio ou coisa parecida.
– Graças ao bom ensino ginasial, pois foram quatro anos (admissão e 1ª série ginasial em Francisco Beltrão; 2º ano do ginásio em Adamantina-SP; 3º e 4º do ginásio em São Miguel do Oeste), não fiz cursinho para vestibular, que na época era bem concorrido, passei na hoje Unicuritiba e na Católica, pois, como tinha que trabalhar durante o dia, a Federal só tinha curso de Direito diurno.
– Lembro do Irmão Adelmo, professor de português, segundo consta era mineiro. Do Irmão Januário, professor de matemática, matéria que sempre detestei. Do Irmão Eugênio, nosso diretor. Irmão Albino, professor de História. Além, é claro, do Irmão Roberto e do Cirilo, com o qual por muitos anos tive contato, inclusive me visitou muitas vezes, sempre com suas receitas e remédios das mais variadas plantas medicinais.
– O que não gostava: ir à missa todos os dias pela manhã. Comida ruim. Chegava em casa nos finais de ano raquítico, minha mãe chorava ao me ver tão magro. Porém, as coisas boas, como disciplina, gosto pela leitura, concentração no estudo, solidariedade e amizades fraternas entre os colegas, respeito aos superiores.
– Todos tinham apelido e ninguém ligava. Não existia o tal do bullying, era considerado normal. Tanto em Beltrão como Adamantina e São Miguel do Oeste, tive apelidos, isso nunca me magoou, como disse, era encarado com normalidade.
– Colegas do La Salle que lembro da época: Vilmar Cordasso, Nilton Nodari, Hermes Caporal, Mansueto Dalla Vechia, Pedro Forte, Modesto Golin, Babinski, Izair Favreto.
– Em resumo: o Colégio La Salle me abriu as portas para o conhecimento. Não fosse o La Salle, nem imagino o que poderia ser.