Colégio Pio Brasileiro

No final dos anos 70, começo de 80, estive uma semana em Santa Maria (RS), na casa de Ivo Lorscheiter. Naqueles dias, o cardeal Scherer, de Porto Alegre, foi assaltado e deixado nu nos arredores de Porto Alegre. Dom Ivo soube do assalto quando voltava de uma comunidade no interior. Estava ao seu lado no “auto”, como dizem os gaúchos. Sua ligação com dom Scherer era fraterna. Dom Ivo mereceu dele, ao longo de sua vida de seminarista, várias manifestações de apreço, quer nos tempos dos seminários de Gravataí e Viamão, quer nos muitos anos que passou em Roma no Pio Brasileiro, graduando-se na Universidade Gregoriana e nela fazendo seu doutorado, além de bispo auxiliar de Porto Alegre, morando na mesma casa com o cardeal Scherer.
Dom Ivo me colocou numa casa da diocese frente ao palácio, na Rua Silva Jardim. No quarto ao lado, estava o padre Paulo Aripe, mais conhecido como padre Potrillo, autor da Missa Crioula, poeta e tradicionalista.
Potrillo era, então, diretor da Rádio Medianeira. Não tinha eu a dimensão da tradição gaúcha, não conhecia ainda Barbosa Lessa nem Ozório Santanna Figueiredo, o maior conhecedor da história de São Gabriel e região, autor de mais de vinte livros, entre eles os clássicos “Carreteadas Heróicas” e “Maneco Pereira, o homem que laçava com o pé”. Não pude, por ignorância do universo gauchesco, aprofundar minha conversa campeira com o padre Aripe, de quem dom Ivo havia me dito: “Você ficará aos cuidados do padre Aripe. Ele é doutor em Rio Grande, autor de livros, diretor de nossa rádio e autor da missa crioula”. Tenho do padre Aripe dois livros autografados. Estava em Passo Fundo quando soube de sua morte, no Alegrete – como dizem os xirus de lá – em maio de 2008.
Nessa ocasião, pedi a dom Ivo, então secretário da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), que me desse uma credencial-apresentação aos Bispos do Brasil. Disse a dom Ivo que, embora não tivesse fé, sempre escrevi sobre o papel educador e social da Igreja. E assim tenho feito. Ao longo de 40 anos, Brasil afora e adentro, fui hóspede de dezenas de bispos, como provam meus artigos. Minha pouca, pouquíssima fé jamais impediu que tivesse amigos padres, bispos e arcebispos.
Quando dos 60 anos do Pontifício Colégio Pio Brasileiro, fundado em 1934, pedi a dom Ivo um depoimento pessoal sobre os anos que passou naquele colégio dirigido pelos Jesuítas até 2014. Hoje, o Pio Brasileiro, na Via Aurélia, 527, Roma, é comandado pela CNBB. Há muitos anos interesso-me pela história desse colégio. Cabe registrar: conheci, em 1968, o padre Luiz Gonzaga Monnerat, jesuíta, que foi reitor do Pio Brasileiro no tempo do papa Paulo VI. Falou-me, então, também do Pio Latino, que antecedeu o Pio Brasileiro, e em que estudaram o Cardeal Arcoverde e o Cardeal Leme.
O padre Monnerat era primo de dona Zezé Monnerat Bandeira Vaughan, esposa de meu amigo e mestre doutor Raymundo Bandeira (de quem já falei n vezes nesta coluna). Nos anos 80, troquei várias cartas com o Pe. Monnerat sobre sua família na Suíça e em Monerá, Estado do Rio, onde o inefável Tio Januca tinha a Fazenda Rosa dos Ventos, que por mais de 100 anos fora dos Monnerat.
Dom Ivo foi secretário e presidente da CNBB dividindo seu comando com seu primo dom Aloísio Lorscheider (a grafia certa seria com t, mas o cartório errou). Dom Ivo teve várias rusgas com o governo militar. Alguns causos hilários como o do general que tentou suspender a tradicional romaria de Nossa Senhora Medianeira, em Santa Maria, para evitar tumulto, aglomeração de massa… Chegou esse general a falar com o presidente Geisel, que o aconselhou a não se meter em brigas de sacristia…
Como contribuição para a História do Pio Brasileiro de Roma, hoje com 82 anos de existência, transcreverei na próxima coluna o depoimento que dom Ivo me enviou em 1994. Já tenho remetido meus artigos ao Pio Brasileiro. O mais recente foi em setembro de 2009, como prova um postal do padre João Roque Rohr, SJ, então reitor.
Lá pelo ano 2000, passei a me corresponder com o padre jesuíta Vendelino Lorscheiter, irmão de dom Ivo, que vivia há 50 anos no Japão. Foi dom Ivo que me sugeriu que mandasse meus artigos a seu irmão, apreciador de receber cartas do Brasil. Ganhei do padre Vendelino alguns livros em inglês sobre o Japão. Hoje tenho uns 200 livros sobre o Japão e sobre os japoneses no Brasil, fora os que doei a minha filha Lígia, que passou uma temporada em Tóquio.
Outro dia li uma biografia do Imperador Hiroito e Reminiscências do General Douglas Mac Arthur, que governou o Japão no pós-guerra, ambas em inglês. Faço este registro porque recebi do padre Vendelino uma foto com seu irmão (dom Ivo) em Tóquio, em 1984, e quero homenagear a ambos, mandando este artigo para os jesuítas brasileiros que vivem em Tóquio, onde está sepultado o padre Vendelino, que viveu quase 60 anos no Japão. (Continua)