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Francisco Beltrão
domingo, 25 de maio de 2025

Edição 8.211

24/05/2025

O relógio que o Cláudio não comprou

compra

Tenho um amigo que, anos atrás, saiu de sua empresa disposto a comprar um relógio de pulso. Ele não estava a fim de comprar um Rolex, mas queria algo diferenciado, de marca boa. O preço não importava tanto. Ele se dirigiu a uma das empresas referência no segmento e pediu para ver as opções. A atendente não começou bem, mostrou primeiro os produtos mais comuns. Educadamente, ele olhou, até provou um e outro, mas informou que não era bem isso que procurava. Pediu pra ver outros modelos. A vendedora então lhe trouxe outro mostruário, que, a exemplo do primeiro, estava abaixo da expectativa. O Cláudio percebeu que precisa ser mais claro: “Moça, eu gostaria de ver aqueles relógios que estão na vitrine”. Sabe-se lá porque, preguiça, falta de senso, TPM, falta de amor à profissão, com desdém ela perguntou: “Moço, você tem certeza que quer ver aqueles?”. Ele não quis mais ver nada. Agradeceu pelo atendimento, saiu porta afora e se dirigiu a uma empresa concorrente. Por sorte, foi bem atendido e comprou o relógio que usa até hoje.
Apesar de a lambança ser da vendedora, quem mais perdeu não foi ela, e sim a empresa que a mantinha. E a loja não perdeu apenas uma venda, perdeu um cliente. E estamos falando de um alemão que, como ele mesmo diz, não é teimoso, é “convicto”. Ele não esqueceu a história que já beira a uma década – eu também não esqueceria – e garante que só volta lá se não tiver outra opção. Aposto que se pedir ao Cláudio uma recomendação de onde comprar relógio ele vai te dizer primeiro onde não comprar. Ou seja, o número de vendas e clientes perdidos por um único atendimento mal feito possivelmente irá se multiplicar por anos. Cada vez que um colaborador dá uma furada dessas, cria uma mancha que se propaga feito petróleo derramado no mar, ninguém sabe exatamente pra onde as correntes vão levar, nem medir completamente as consequências. Mas elas virão, mesmo que a gente demore pra perceber.
Mas vamos recapitular. A frase “Moço, tem certeza que quer ver aqueles?” é só a cereja bichada com a qual a vendedora enfeitou um bolo que começou a desandar já na escolha dos ingredientes. Um bom vendedor não começa a mostrar primeiro os produtos mais baratos, pois ao fazer isso subestima, julga a capacidade de compra, e até ofende o cliente. “Se começa sempre de cima pra baixo; primeiro os mais caros, deixa o cliente escolher o que cabe no bolso dele, não é a gente que define o que ele pode comprar”, ensina o Gelson que, apesar de ser Trevizan com Z, é meu primo. E, apesar de ser meu primo, é bom vendedor.
E a gente sabe do esforço das empresas pra treinar seus vendedores, sua equipe. E sabe que toda a organização está sujeita a fatos assim, porque é composta por pessoas. E pessoas não agem de forma padronizada, não estão imunes à influência dos sentimentos. Um problema pessoal, um desentendimento com o colega, e o castelo de cartas que é o ser humano desmorona, muitas vezes sobre o cliente. Esse caso do relógio pode ter sido um em mil. A mesma vendedora pode ter feito excelentes atendimentos. Mas o bom atendimento, raras exceções, é lembrando e comentado. O que fica na memória do cliente é a falha, o menosprezo. E talvez ele nem lembre mais da cara do vendedor, mas da loja, não esquece. Mais um motivo para investir em treinamento. Se mesmo treinando, falhas acontecem, imagine se não treinar. É aquela velha e batida frase, se você acha caro investir em educação, experimente investir em ignorância.

 

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