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Francisco Beltrão
quinta-feira, 12 de junho de 2025

Edição 8.224

12/06/2025

Síndrome de Caim

A “síndrome de Caim” (cf. Gn 4,9) baseia-se na pergunta direta e fotográfica da “cultura da indiferença”, do rompimento radical da fraternidade: “Acaso sou responsável por meu irmão?”. Adão uniu-se a Eva, sua mulher; ela concebeu, deu à luz Caim, primogênito. De novo deu à luz seu irmão Abel (cf. Gn 4,1-2). No campo, os filhos já adultos, por inveja, Caim matou Abel, seu irmão.

O Senhor interroga Caim: “Onde está teu irmão Abel?”. Sua resposta irônica e desconcertante: “Não sei. Sou o guarda do meu irmão?”. A característica da “síndrome de Caim” é: uma pessoa sem ética, sem nenhuma preocupação com o outro, sem confiança; na linguagem moderna, um “dissimulado”. Caim renega seu ofício fundamental: como irmão e por ser mais velho, tinha que respeitar e guardar a vida de seu irmão. Deus intervém, fazendo o inexperiente Caim compreender o que lhe aconteceu. Adverte-o que o rancor é como animal à espreita, junto à porta de entrada e saída, que intenta apoderar-se do homem.

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Se Deus ofereceu a sua palavra a Caim, é porque não o rejeitou, é porque deseja salvar a fraternidade. Deus não quer a morte de nenhum vivente pela violência, não tolera o sangue derramado das vítimas, às vezes sem a falta de defensores humanos. Abel foi vítima de seu irmão invejoso, mesquinho e ciumento. Não foi sem razão que, logo no início de seu ministério, o Papa Francisco, na Ilha de Lampedusa, na Itália, nos alertou através da expressão: “Globalização da indiferença”. Prossegue: “Quase sem nos dar conta, tornamo-nos incapazes de nos compadecer ao ouvir os clamores alheios, já não choramos à vista do drama dos outros, nem nos interessamos por cuidar deles, como se tudo fosse uma responsabilidade de outrem, que não nos incumbe. A cultura do bem-estar anestesia-nos, a ponto de perdermos a serenidade se o mercado oferece algo que ainda não compramos, enquanto todas estas vidas ceifadas por falta de possibilidades nos parecem um mero espetáculo que não nos incomoda de forma alguma” (EG n. 54).

Francisco, na Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate aborda o tema da síndrome de Caim outra vez: “Quando encontro uma pessoa a dormir ao relento, numa noite fria, posso sentir que este vulto seja um imprevisto que me detém, um delinquente ocioso, um obstáculo no meu caminho, um aguilhão molesto para a minha consciência, um problema que os políticos devem resolver e talvez até um monte de lixo que suja o espaço público. Ou então posso reagir a partir da fé e da caridade e reconhecer nele um ser humano com a mesma dignidade que eu, uma criatura infinitamente amada pelo Pai, uma imagem de Deus, um irmão redimido por Jesus Cristo. Isto é ser cristão!” (GeE n. 98).

O mundo não quer chorar!

“O mundano ignora, olha para o lado, quando há problemas de doença ou aflição na família ou ao seu redor. O mundo não quer chorar: prefere ignorar as situações dolorosas, cobri-las, escondê-las. Gastam-se muitas energias para escapar das situações onde está presente o sofrimento, julgando que é possível dissimular a realidade…” (GeE n. 75).

Na Carta Encíclica Fratelli Tutti, Francisco retoma o tema da indiferença, afirmando que a Bíblia nos propõe desafios concretos sobre as relações humanas e suas fragilidades, como do caso bíblico aqui apresentado. “Caim mata seu irmão Abel e então ouve Deus perguntar: ‘Onde está seu irmão Abel?’ Sua resposta é aquela que nós mesmos sempre damos: ‘Sou eu o guardião do meu irmão?’. Pela própria pergunta que ele faz, Deus não deixa espaço para um apelo ao determinismo ou ao fatalismo como uma justificativa para nossa própria indiferença. Em vez disso, ele nos incentiva a criar uma cultura diferente, na qual resolvemos nossos conflitos e cuidamos uns dos outros” (FT n. 57).

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