Para o vírus não tem a menor importância, mas que para o cidadão — ou folião —, pode representar a diferença entre alegria e tristeza diante da realidade de alerta e perigo que insiste em desfilar para muito além dos carnavais.
“Diga, espelho meu, se há na avenida alguém mais feliz que eu”, diz o refrão de um dos sambas-enredos mais consagrados do Carnaval do Rio de Janeiro. Levado para o sambódromo pela União da Ilha em 1982, “É hoje o dia” ficou imortalizado na mente dos cariocas na década de 1980.
Com certeza, os brasileiros estão ávidos pelo próximo Carnaval, no início de março. O último foi em 2020, muito tempo para um povo que extravasa em quatro dias todos os sapos, cobras e lagartos engolidos a seco nos outros 361 dias. Infelizmente, o bom senso manda recolher outra vez as fantasias e adiar o samba no pé ao som da bateria. O risco de a quarta onda de Covid na Europa chegar ao Brasil é considerado praticamente incontornável.
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O novo avanço do vírus já derrubou bolsas mundo afora, provocou revezes nas expectativas de crescimento da economia em 2022 – que já não eram das melhores – e colocou o Planeta em alerta. Embora ainda não existam elementos concretos para avaliar os rumos da pandemia, inclusive em nosso País, os cientistas não descartam a possibilidade da volta de alta nos registros de casos e óbitos. O horizonte próximo é tão mais sombrio quanto o relaxamento de medidas de proteção, como distanciamento social e uso de máscaras. Medidas essas básicas, mas que continuam suscitando polêmicas no País que, apesar dos pesares, alcançou um nível de vacinação considerado bom. Porém, os 62% totalmente vacinados (duas doses) continuam abaixo do ideal para conter a transmissão e acabar com a pandemia, que é acima de 70% da população.
O banho de água fria provocado pelo avanço da nova cepa do coronavírus, originada na África, é de longo alcance. Quiséramos todos que seus efeitos fossem as restrições à folia de Momo ou às festas de Natal e Ano Novo, tão esperadas depois de dois anos de freio de mão puxado por imposição da Covid 19. Além da proibição da entrada de viajantes vindos da África do Sul e de outros cinco países africanos, determinada pelo governo federal, espera-se o cancelamento do Carnaval e de outras medidas de flexibilização, como a abolição do uso de máscaras em locais abertos. A sensação de insegurança deve permanecer nos próximos dias com a confirmação de novos casos na Europa, onde a nova variante já eliminou a breve normalidade recuperada durante alguns meses. A diferença desta quarta onda para as anteriores é que a Ômicron, como foi batizada a cepa africana pela Organização Mundial da Saúde (OMS), traz a ameaça de driblar as vacinas.
Ou seja, se isso se confirmar – o que ainda levará algum tempo para a ciência saber –, todo o esforço feito até agora cairá por terra. Mas quem sabe a evidência de que o acesso desigual às vacinas criou a Ômicron faça os líderes mundiais olharem menos para seu próprio umbigo e se disponham a uma ação coordenada para ajudar os países africanos subdesenvolvidos a proteger seus cidadãos e, assim, montar uma barreira contra a Covid-19 em todo o Planeta. Porque a pandemia já avançou bem mais que a humanidade, que continua com muitas fronteiras, além das geográficas. Algo que para o vírus não tem a menor importância, mas que para o cidadão — ou folião —, pode representar a diferença entre alegria e tristeza diante da realidade de alerta e perigo que insiste em desfilar para muito além dos carnavais.