Memórias
Caminhava com pressa quando me deparei com a praça que frequentava na minha infância. O desvio, que era para ser apenas um atalho, transformou-se em um portal. Sensação agridoce na boca. Segui andando até pisar no gramado em que antes jogava bola com meu pai. O verde da grama estava tão cansado quanto os brinquedos que há anos residiam ali. Tudo que era de metal estava coberto por um veludo ruivo que só o tempo consegue criar.
Senti tristeza quando me aproximei de um antigo monumento ali adormecido. Quando criança, aquilo parecia imenso. Eram pilares gigantescos com círculos de concreto em suas extremidades. Para o olhar de um adulto, aquelas pilastras já não eram mais tão imponentes. Não apenas por parecerem tão menores, mas pelas rachaduras denotando que um prazo de validade estava para expirar.
Esqueci o que causava urgência e escolhi um banco para me sentar. Era o lugar onde minha mãe ficava para vigiar eu e meus irmãos. Se houvesse paredes ao redor desta praça, certamente sentiria cheiro de mofo. Não existia uma única criança brincando naquele lugar. Havia ali apenas duas pessoas que não me deixavam totalmente sozinho: O homem que varria a calçada e outro que fumava escorado no balanço. Como o palco de tanta diversão se transformou num cenário de filmes de faroeste?
De cabeça baixa, pensei um pouco e concluí: A ausência de alma desta antiga praça é o resultado de uma triste somatória de elementos. A velocidade da rotina inevitavelmente retira tempo dos pais. Ao lado disso, também se acrescenta a violência das cidades grandes e a construção atual de que diversão sempre precisa de tela, seja de celular ou vídeo game. A consequência é essa escassez de felicidade.
Lentamente, algo como uma sombra começou a se apossar de minhas memórias. As lembranças que foram aqui construídas são as mais belas possíveis. Senti que minha permanência naquele lugar estava colocando em risco aquelas recordações. Levantei-me e voltei a ter pressa. Levei comigo todo o sabor que somente a infância pode prover. Vontade de poder abraçar minha mãe. Peguei o celular e liguei para o meu pai.