Geral
Minha mãe costumava me falar isso antigamente: “Tá querendo tudo mastigado?”. Para quem não entendeu, significa que o outro está querendo tudo pronto, tudo já explicado. Quando tentava utilizar um atalho através do conhecimento dela para resolver uma tarefa, era essa fala que surgia acompanhada do “não”. No entanto, é perceptível que, de uns tempos pra cá, realmente tudo está mastigado. Tentarei explicar.
Qual programa da televisão brasileira te exige um pensamento mais apurado? Em uma novela, por exemplo, não existe espaço para reflexão. As informações estão prontas para serem absorvidas, muito bem explicadas. Termos e tendências são simplesmente absorvidos por seus telespectadores. E os programas de humor? Esses fazem uso de bordões simples que qualquer homem das cavernas entenderia.
E as músicas? O que falar das novas composições? Sim, está tudo mastigado também, pronto para uma agradável digestão. Fácil de internalizar e repetir, fazendo alusão ao sexo ou não, as músicas não trazem mais quaisquer críticas sobre nada. Comparando às canções que surgiram nas décadas de 70, 80 e 90, seja a bossa nova, tropicalismo ou rock, as letras eram carregadas de conteúdos que exigiam um tempo para compreender as entrelinhas. Caso contrário, o entendimento sobre o que havia por trás daquela letra passava despercebido.
Se alguém está acostumado a receber tudo mastigado, o que acontece se, repentinamente, tiver que aprender a mastigar? O furor que houve nos últimos dias sobre um possível cancelamento do Bolsa Família mostra o que pode acontecer se a boca fechar. Mecanismo perigoso esse que simplesmente joga tudo pronto sobre a massa. Todavia, apesar de alguns melindres, parece operar muito bem.
O funcionamento disso tudo também é muito simples. Oferte algo de fácil entendimento, que não desenvolva pensamentos críticos, e certamente não será árduo sugestionar para determinados caminhos. É como manter dentro de um cercado, com bordas visíveis, mas não questionáveis. Logo, passamos a receber todas as informações sempre dentro de um limitado campo de visão. Um padrão que mantém outros padrões.
O que é possível dizer é que saber mastigar, apesar de mais cansativo, é muito melhor do que receber algo já pré-digerido.