
Shalom. Muito já se falou nesta mesma coluna sobre a relevância e o valor jurídico do afeto dentro do direito de família. Em especial se abordou sobre a possibilidade de, no mesmo registro civil de uma criança, em se ter dois pais e uma mãe, por exemplo, onde além do casal biológico o menor também foi criado por uma terceira pessoa.
Tal situação pode ocorrer quando existe uma terceira pessoa efetivamente participante do relacionamento do casal, formando o que se tem chamado de “trisal”, ou em formato mais comum, quando o casal se separa e apesar da convivência do pai biológico com a criança, o padrasto também passa a ter um papel de intenso contato com o menor estabelecendo um forte vínculo afetivo.
Contudo, o que se pretende ressaltar na presente matéria é sobre a importância de ter dois pais, por exemplo. Será que que além do valor afetivo, valeria a pena requerer em juízo um reconhecimento de um segundo pai, somente para receber duas heranças, ou, eventualmente duas pensões alimentícias? Que valores morais estariam realmente em jogo? Cada qual seguramente deve ser senhor das suas razões e saber exatamente a extensão e os motivos pelos quais levam um filho a ajuizar uma ação judicial para o reconhecimento da dupla paternidade!
Mas antes de tomar essa atitude talvez fosse razoável colocar-se no lugar dos “pais” tanto o afetivo quanto ao biológico, a fim de saber se as suas reações estarão dentro do esperado. Pode ser um ato de empatia genuína compreender se o pai biológico aceitaria passivamente e compreensivamente tal atitude, de ver ao seu lado numa certidão de nascimento o nome de outra pessoa, outro pai, para ser mais específico.
De um lado então se tem o direito do menor em ver acolhida pela justiça essa possibilidade quanto ao pai de “criação” e de outro o desgaste com o pai biológico. Nem sempre essas circunstâncias podem ter os efeitos esperados! Por esse motivo, justamente por se tratar, no fundo, de uma tentativa de se reconhecer o afeto como um ato de amor, também deve ser considerada uma boa e honesta conversa com todas as partes envolvidas, sempre no intuito de, ao formalizar um novo parente afetivo de um lado, não acabar destruindo um relacionamento de outro, ainda que o vínculo biológico permaneça.
Obviamente, se for caso de um pai biológico que de fato nunca criou de verdade o seu próprio filho, esses dilemas seriam mais facilmente resolvidos, ainda que o futuro possa reservar novas possibilidades, inclusive a de que aquele menor, após alcançada a maioridade, possa querer conhecer mais a fundo o pai biológico e além de saber quais os motivos que afastaram os dois, possa ser construida uma relação a partir dali, do momento do reencontro.