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Francisco Beltrão
sábado, 24 de maio de 2025

Edição 8.211

24/05/2025

Professores de redação “ligaram” o alerta para tema menos polêmico

Esta é a opinião de Carla Lavorati, professora do Glória.

Carla Lavorati, professora de redação do Ensino Médio do Colégio Nossa Senhora da Glória.

A escolha do tema foi uma surpresa? Carla Lavorati, professora de redação do Ensino Médio do Colégio Nossa Senhora da Glória, comenta que a prova do Enem desse ano ocorreu envolta de rumores sobre a interferência do governo federal na seleção das questões e também na escolha do tema da redação.

“Pensando nas possibilidades de direcionamento na prova, acredito que muitos professores de redação ‘ligaram’ o alerta para as possibilidades de cair um tema menos polêmico. No entanto, ainda que ocorresse um direcionamento, sabia-se que o gênero textual (dissertativo-argumentativo) permaneceria como modelo. E que a tradição do tema é vir sempre acompanhado de textos de apoio.”

Construção de uma tese
Nesse caso, devido ao modelo da redação ser composto por esses itens já conhecidos do grande público, Carla acredita que sempre é possível construir uma boa argumentação, desde que os alunos saibam interpretar os textos de apoio e façam uso produtivo das informações disponibilizadas para construir sua tese e seus argumentos em defesa de um ponto de vista.

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“Quando tive conhecimento do tema, lembrei de uma propaganda da rede Globo em parceria com a Unicef, que foi veiculada por muito tempo em canais abertos de televisão. Nessa propaganda, uns bonequinhos de pano, representando diferentes pessoas, cantavam: ‘Eu não tenho nome, e quem não tem, sem documentos eu não sou ninguém, eu sou Maria, eu sou João, com certidão de nascimento, sou cidadão!’. É um tema importante, com certeza, tendo em vista que é expressivo o número de pessoas que ainda são invisíveis para o governo, por não apresentarem documentação básica. Mas sempre é difícil prever o que vai cair exatamente, já que muitas questões podem ser consideradas como problemas importantes e pertinentes a serem discutidos.”

Quando faltam argumentos, quais as suas dicas?
Conforme Carla, essa reclamação é constante em todos os processos avaliativos do Enem. “O que eu tenho a dizer, para os alunos que pretendem ter mais segurança na hora de argumentar, é desenvolver – juntamente com as habilidades de escrita – as habilidades de interpretação textual. Os textos de apoio traziam informações tanto explícitas, ditas mesmo nas linhas do texto, como também continham informações implícitas.” Ela exemplifica que o texto de apoio 2 continha o mapa da invisibilidade, no qual eram expostos os números de indivíduos sem o registro básico por região do Brasil. Nesse mesmo texto de apoio, era citado que a dificuldade de registro que atinge milhões de pessoas não fica restrita às dificuldades financeiras, até porque afirma-se, no mesmo texto, que o registro se tornou gratuito em todo o Brasil, a partir da Lei n° 9.534, do ano de 1997.

“Ou seja, só nesse comentário, muita informação importante poderia ser usada para construir uma boa argumentação. Assim, entre as linhas e entrelinhas do texto, deduz-se que existem outros fatores complicadores que devem ser enfrentados para acabar com a invisibilidade desses indivíduos. Analisando os números do mapa disponível e somando à interpretação dos dados e à declaração do texto de apoio 1, que diz que as pessoas que ainda não possuem documentação são ‘todas pobres, quase todas negras […] adultos, velhos e crianças’; já é possível formular uma tese forte e dela depreender bons argumentos.”

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Repertório cultural
Carla ressalta que os “não” cidadãos são formados por uma parcela significativa da sociedade que já é excluída historicamente, que também tem dificuldades de acesso a outros bens como educação. “Esses dados poderiam ser relacionados – por um aluno que tenha um bom repertório cultural e uma visão crítica da realidade – com a necessidade de criação de um projeto político educacional que garanta o acesso ao ensino de qualidade para todos os brasileiros, contribuindo com a integralidade do que se define como cidadania.”

Ela acrescenta que seria possível construir também uma proposta de intervenção forte e contundente, todas retiradas da interpretação atenta dos textos de apoio.
“Já que, como foi afirmado pelo tema e textos que o compõe, apenas a gratuidade dessa documentação não foi suficiente para garantir o fim da invisibilidade desses milhões de cidadãos que ainda não possuem o registro civil.”

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