O algodão agroecológico reduz em até 91% o consumo de água, 62% no consumo de energia e 46% nas emissões de GEE, além de menor toxicidade e maior geração de emprego.
A boa notícia ganhou eco com o relatório Fios da Moda: Perspectiva Sistêmica para Circularidade que traz dados inéditos sobre os impactos socioambientais das principais fibras utilizadas na indústria da moda brasileira: algodão, poliéster e viscose. O conceito de economia circular é uma visão completa e complexa para o problema da crise climática, e com este relatório brasileiro os players da indústria têxtil e moda ganham mais informações e ferramentas em direção a soluções dentro da realidade do país.
Apesar do estudo fazer uma análise das três principais fibras utilizadas no mundo, chamamos a atenção para a relação do algodão e da água neste dia. A nível global as técnicas usadas de irrigação fazem com que o consumo de água na produção da matéria prima seja uma grande vilã, é comum vermos dados de quanto uma camiseta ou calça jeans consomem de água na sua produção mas, se o algodão for brasileiro existe grande chances da realidade ser bem diferente, o algodão no país é em sua maioria produzido em sequeiro ou seja, apenas com água da chuva.
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“(…) as características específicas da produção brasileira parecem ser muito influentes para o consumo de água na cultura do algodão. O predomínio da produção de algodão em sequeiro (sem irrigação) é refletido nos valores médios nacionais para essa categoria: 2.333 L/kg de algodão (berço ao túmulo) e 1.704 L/kg de algodão (berço ao portão). Esses valores são de 4 a 5 vezes menores que os valores médios relatados em estudos internacionais, considerando o escopo berço ao portão e berço ao túmulo, respectivamente. Esse é um quadro tipicamente brasileiro, dado que mais de 70% do algodão mundial é irrigado e a média mundial de consumo de água de irrigação é de 10000 L de água por kg de fibra (VASCONCELOS et al., 2012) (…)Essa peculiaridade da produção nacional diminuiu drasticamente o consumo de água nessa etapa do ciclo de vida dos vestuários.”
Porém a preocupação com a água ainda é grande e, está ligada a contaminação : “ No Brasil, o algodão é a quarta cultura que mais consome agrotóxicos, sendo responsável por aproximadamente 10% do volume total de pesticidas utilizado no país (BOMBARDI, 2017), com uma aplicação média de 28 litros de pesticidas por hectare de algodão (ABRASCO, 2015). O impacto do uso de pesticidas é motivo de grande preocupação, devido ao alto potencial de afetar a saúde humana e o meio ambiente, podendo ocasionar a contaminação das águas superficiais e subterrâneas, mortalidade de abelhas, intoxicação, aborto espontâneo e câncer em seres humanos (ABRASCO, 2015).”
Contudo o estudo observa a movimentação do setor para a questão ambiental “(…) país tem investido em rastreabilidade e certificação para garantir uma produção com menor impacto ambiental. O Brasil é o maior produtor mundial de algodão certificado Better Cotton Initiative (BCI), respondendo por cerca de 30% do volume total de algodão BCI (BCI, 2020; TEXTILE EXCHANGE, 2019).”
No entanto a alternativa incentivada pelas pesquisadoras é o algodão agroecológico por conta dos seis pilares para a circularidade elaborados por elas, que se destaca por abordar uma avaliação que contempla além dos fatores ambientais também os fatores sociais envolvidos na economia circular :
1) Design de produto circular;
2) Design de Processos e Fluxos Circulares;
3) Sistemas Vivos: Regenerar a Natureza;
4) Recursos e Toxicidade Limitada;
5) Condições Locais: Internalizar Externalidades;
6) Sociedade: Justiça e Ecologia Social.
Nesse sentido em se tratando da fibra de algodão, a alternativa agroecológica se demonstra mais coerente. “A produção de algodão em sistema de monocultura, em geral, é bastante danosa ao ambiente, pois reduz a biodiversidade dos agroecossistemas, tornando-os vulneráveis aos ataques de pragas e doenças, assim como à perda de fertilidade dos solos. Isso implica a necessidade de usar uma quantidade cada vez maior e mais perigosa de pesticidas e fertilizantes químicos, os quais, além de poderem impactar a saúde humana, podem também poluir as águas e o solo, causando perda de biodiversidade e dos seus serviços ecossistêmicos (SAMBUICHI et al., 2017). Uma alternativa à cotonicultura é a produção de algodão orgânico em bases agroecológicas. Nesse sistema, o cultivo é realizado de forma a manter a saúde dos solos, ecossistemas e pessoas. Baseia-se em processos agroecológicos, biodiversidade e ciclos adaptados às condições locais, com o emprego de sistemas de rotação de culturas (que contribuem para a restauração da qualidade do solo) e sem o uso de agrotóxicos sintéticos tóxicos e persistentes (pesticidas e fertilizantes) e de sementes geneticamente modificadas (TEXTILE EXCHANGE, 2019b).”
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Para o consumidor analisando o ciclo de vida de peças de algodão, o estudo aprofunda várias observações e comparações entre autores e destaca que sob o olhar do consumo da água, logo em seguida a etapa de produção, a fase do uso da peça é a que mais se destaca.
“As etapas de fiação e tecelagem e de tingimento também apresentam certo grau de impacto por consumirem quantidades consideráveis de água, especialmente o tingimento (QUANTIS, 2018). A etapa de uso é a segunda principal contribuinte em termos de consumo de água. Nessa etapa, a lavagem é o principal processo contribuinte para esse impacto (BEVILACQUA et al., 2014). Em análises de cenários, estima-se que máquinas de lavar eficientes consomem 30% menos água durante a lavagem do que máquinas de lavar convencionais (PERIYASAMY; WIENER; MILITKY, 2017) . Ainda, a literatura aponta que a coloração do produto (ex.: camisa) apresenta diferenças substanciais no consumo de água no processo de lavagem, apesar de pouca diferença no consumo de energia (WANG et al., 2015). Assim, a etapa de produção da matéria-prima, seguida da etapa de uso pelo consumidor, apresenta os maiores impactos em relação ao consumo hídrico (PERIYASAMY; WIENER; MILITKY, 2017).”
“A vontade de produzir um relatório sobre têxteis está ligada à urgência da transformação que precisamos fazer acontecer na próxima década se quisermos garantir condições de vida minimamente estáveis na Terra frente a um cenário climático em profunda transformação”, ressalta Marina Colerato, coordenadora do projeto.
DADOS EM DESTAQUE:
• No Brasil, o algodão é a quarta cultura que mais consome agrotóxicos, com destaque para o glifosato, que corresponde a mais da metade do volume de agrotóxicos comercializados no país;
• O algodão é responsável por aproximadamente 10% do volume total de pesticidas utilizados em território nacional;
• A etapa de produção de matéria-prima é o principal ponto crítico no impacto à biodiversidade e ocupação do solo pela cotonicultura, sendo responsável por 99% do impacto total;
• A produção agroecológica de algodão tem impacto positivo sobretudo na qualidade de vida das mulheres camponesas e na soberania alimentar.
Acesso ao relatório: https://modefi.co/relatorio-fios-da-moda
Vídeo: http://modefi.co/filme-fios-da-moda
Pack de imprensa, com release geral: https://modefi.co/fios-da-moda-pack-imprensa
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Sobre o Modefica
O Modefica é uma mídia independente criada em 2016, fundada por Marina Colerato, com objetivo de fomentar o debate e o entendimento sobre sustentabilidade de forma ampla e radical, usando o jornalismo como ferramenta de transformação. Produz reportagens, matérias, opinativos e pesquisas sobre questões ambientais, climáticas e sociais, além de podcasts e conteúdo multimídia.
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Fashion Regenerate Fashion LLC é uma consultoria que auxilia empresas de moda e produtores têxteis globais na integração de práticas sustentáveis. Suas principais áreas de trabalho incluem avaliação de sustentabilidade, criação de estratégias para produtos e negócios, treinamento e capacitação, além de avaliação de têxteis de baixo impacto. A consultoria usa os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS) como princípios orientadores para fornecer uma abordagem integral em seus serviços, e apresentou seu trabalho nos principais eventos do setor, como as conferências NEONYT, Copenhagen Fashion Summit, Textile Exchange Conference, entre outros.
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O Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EAESP) é um espaço aberto de estudo, aprendizado, reflexão, inovação e de produção de conhecimento, composto por pessoas de formação multidisciplinar, engajadas e comprometidas, e com genuína vontade de transformar a sociedade. O FGVces trabalha no desenvolvimento de estratégias, políticas e ferramentas de gestão pública e empresarial para a sustentabilidade, no âmbito local, nacional e internacional. Seus programas são orientados por quatro linhas de atuação: (i) formação; (ii) pesquisa e produção de conhecimento; (iii) articulação e intercâmbio; e (iv) mobilização e comunicação.
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A Laudes Foundation é uma fundação independente criada em resposta à demanda global urgente de acelerar a transição para uma economia global positiva para o clima e socialmente inclusiva. Para endereçar as crises do colapso climático e da desigualdade social, a Laudes apoia ações que inspiram e desafiam a indústria a utilizar seu poder para o bem. Como parte da empresa familiar Brenninkmeijer, tem como base o aprendizado de seis gerações nas áreas de empreendedorismo e investimento social privado. A Laudes Foundation dá continuidade à parte do trabalho desenvolvido pelo Instituto C&A e segue trabalhando de forma colaborativa para influenciar os fluxos de capital financeiro e transformar as indústrias da moda e da construção civil.