Moro na Rua Manaus, no bairro Alvorada, desde 2011. De lá pra cá já presenciei duas enchentes, mas a água não passava do que chamamos de “portão da Sanepar”, que separa a pista de caminhada do parque da rua. A água chegava até ali e já nos deixava apreensivos.
Nessa enchente do dia 1º de maio de 2014, a água mostrou sua força. Passou do portão da Sanepar e invadiu a rua. Começou a subir devagar. Os vizinhos nos acordaram, gritaram para tirar o carro da garagem. Era por volta de 6 horas da manhã. Fomos dormir novamente, afinal, não imaginávamos que a coisa fosse piorar e tínhamos que descansar para curtir o almoço festivo do JdeB no Centro de Eventos Marabá. Era Dia do Trabalhador, dia de comemorar.
Que nada. Quando saímos da cama, às 8h30, a água já tinha passado do portão do meu sobrado. E a correnteza era grande. Quem morava ali há mais tempo dizia que a coisa estava feia, que nunca tinha visto tanta água e que, se chovesse mais, a situação seria ainda pior. Conclusão: ficamos de plantão. Sem poder sair de casa, porque a água já nos impedia e porque estávamos com medo da enxurrada entrar porta adentro.
Fiquei realmente com o coração na mão, tentando disfarçar o medo. Quando percebemos que a água continuava a subir, erguemos o sofá. Felizmente, por volta das 13 horas, o sol deu o ar da graça e o tempo firmou. Marcamos um ponto na parede e vimos que a água começara a baixar. O pior tinha passado. Pra mim, foi uma experiência difícil. Não sofri nenhum prejuízo material, mas pude vivenciar um pouco a sensação de quem vive de perto esse dilema. Não saber se aquela água barrenta, suja, vai entrar ou não na sua casa é como ter as mãos atadas. Você fica sem saber se sai ou fica, se chora ou ri. Por um momento pensei nas famílias mais carentes, que perderam tudo, que ficaram até sem roupas. Que tristeza!
Se tive medo ao ver a água passando do meu portão, nem sei o que sentem aqueles que enxergam, de fora, apenas o telhado das casas. Uma enchente pode levar todos os bens materiais que as famílias sofrem para conquistar. Mas o pior que a água pode carregar é a dignidade. Uma pena saber que muitas pessoas já se acostumaram com essa triste realidade. É preciso mudar algo. É preciso mais investimentos. E mais consciência ambiental também, mais educação. No meio daquele cenário que mais parecia um mar de barro, vi gente jogando lata de cerveja nas águas do Marrecas, rindo. Seu lixo também pode agravar o problema. Pense nisso.