6.1 C
Francisco Beltrão
quinta-feira, 29 de maio de 2025

Edição 8.214

29/05/2025

Artigo: data máxima vênia, sem preconceitos à cor da pele

Artigo: data máxima vênia, sem preconceitos à cor da pele

Lamentável a decisão do STF, unânime, diga-se de passagem, no último dia 26 de abril, ao julgar improcedente a ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) n. 186. Neste sentido, considera constitucional a política de cotas raciais para ingresso em universidades. Em uma análise superficial do caso, chega-se à conclusão de que seria plenamente justo e justificável o programa de cotas para a etnia negra, que hoje corresponde a 97 milhões de brasileiros (IBGE 2010), mais de 50% da população, e que soma um número praticamente inexpressivo de representantes no meio acadêmico. Ledo engano. Como não poderia deixa de ser, os ministros do STF apresentaram motivos bastante eloquentes e fundados nos anseios da população para justificar seus pareceres, mas não são isentos de falha de percepção. Por exemplo, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, nos mesmos argumentos do voto do ministro Gilmar Mendes, disse que as ações afirmativas fazem parte da responsabilidade social e estatal para que se cumpra o princípio da igualdade. Peço vênia aos excelentíssimos para discordar. Segundo a doutrina, o princípio da igualdade, consignado no caput do art. 5º da CF/88, tem como postulado tratar os iguais de maneira igual e os desiguais de maneira desigual. Logo, configura-se ofensa a este princípio conceber essas vantagens à população negra, que não tem, e isso é sistematicamente comprovado, nenhum deficit de aprendizado ou outro impeditivo que a cor lhe confira para necessitar de tal auxílio.

Em contraposição ao argumento do parágrafo acima, o meritíssimo ministro Cezar Peluso afirmou que é fato histórico incontroverso o deficit educacional e cultural dos negros, em razão de barreiras institucionais de acesso às fontes de educação. Ora, Excelentíssimo, há barreiras institucionais para o acesso à educação, mas estas barreiras não são racistas, elas não prejudicam apenas os afrodescendentes, mas caucasianos, amarelos, vermelhos, azuis, roxos, rosas etc. Não é uma questão de cor da pele, mas sim socioeconômica, pois são economicamente desfavorecidos que têm dificuldades de acesso à educação. Do modo que foi posto, parece que são só ricos os brancos e só pobres os pretos. Aplaudo a ressalva do ministro Gilmar Mendes a esse aspecto: “O critério exclusivamente racial pode, a meu ver, resultar em situações indesejáveis, como permitir que negros de boa condição socioeconômica e de estudo se beneficiem das cotas”.

Nos anos 60, nos Estado Unidos, e parece que tudo o que se faz por lá vira modelo para se fazer aqui, o racismo era muito maior e mais acentuado que o encontrado mais de 60 anos depois no Brasil. Lá, os negros, que hoje correspondem a 12% da população (pesquisa eleitoral para presidente dos EUA em 2008, Folha Online), sofreram, no referido período, discriminações semelhantes ao apartheid da África do Sul. Eram proibidos de frequentar as mesmas escolas que os brancos e até mesmo de sentar no mesmo banco de ônibus que os caucasianos. Coisa que jamais aconteceu por aqui. Foi necessária, então, uma política de cotas para negros, para diminuir as desigualdades raciais, repita-se, “raciais e não sociais”, muito embora que neste caso uma estava atrelada à outra. Não havia, lá, oportunidade para o ingresso de negros em universidade por uma questão de cor, e não pecuniária.

- Publicidade -

Outro ponto, pouco analisado na decisão do STF, é que, por incrível que pareça e a contrassenso do que diz o IBGE, a população negra não é maioria no Brasil, é minoria. Explica-se: o Brasil é um país miscigenado, não há, salvo raras exceções, negros e brancos. Há um amálgama de todas essas etnias em um povo, o brasileiro, que não é branco, não é preto, não é vermelho, não é amarelo; é brasileiro. Portanto, cotas para negros nada mais seriam que cotas para pessoas de pele escura, o que, sem prejudicial de contrariedade, é racismo. Deve haver, sim, cotas para o ingresso nas universidades. Estas cotas não devem se limitar à análise da cor da pele, mas à condição socioeconômica do público alvo. Só assim estaremos realmente justificando o princípio da igualdade. Muito embora que ao conceder as cotas para os mais pobres, as universidades atestam a incompetência da política pública de ensino, mas esse assunto não é pertinente para a lide em questão. Por fim, faço menção à assertiva do ilustríssimo ministro Marco Aurélio que ressaltou que as ações afirmativas devem ser utilizadas na correção das desigualdades sociais, com a ressalva de que o sistema de cotas deve ser extinto tão logo essas diferenças sejam eliminadas. Críticas à parte, referido texto serve como forma de reflexão, para que os leitores tenham como concepção, inobstante posições de direita ou de esquerda, o espírito de defesa de baluartes constitucionais como o princípio da igualdade em todos os seus aspectos.

 

Vinícius Murari Borges, acadêmico do 3° ano do curso de Direito da Unipar.

Prof. Me. Alexandre Magno Augusto Moreira, coordenador de Direito da Unipar.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Destaques