Uma homenagem a Ana Primavesi e à agroecologia.
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Christophe de Lannoy
Dia 15 de abril foi escolhido pelo Ministério da Agricultura para lembrar a importância da conservação dos nossos solos. Dia de nascimento do primeiro responsável pelo Serviço de Conservação de Solos dos EUA, Hugh Hammond Bennett.
Mas para o Brasil a professora dra. Ana Maria Primavesi é a primeira a ser homenageada por seus estudos e sua obra O Manejo Ecológico do Solo e o Manejo Ecológico de Pragas e Doenças, entre outras obras da maior importância para a agricultura tropical. Ela percebeu que nos países tropicais, como o Brasil, a tecnologia a ser empregada para conservar os solos deveria ser diferente da dos países temperados.
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Ana Primavesi faleceu o ano passado, aos 99 anos de idade, em São Paulo. Austríaca, chegou ao Brasil com o marido, também agrônomo, depois da segunda guerra mundial. Foram professores na Universidade Federal de Santa Maria. Ela dizia: “a minha paixão é o solo, porque tudo depende do solo, inclusive os homens”. Era fascinada em observar como a terra melhorava, como a água renascia e como tudo podia se desenvolver a partir da vida do solo. Em uma palma de terra existem cinco bilhões de seres vivos.
O solo deve ser fofo, dispor de água e ar para que as raízes se desenvolvam à vontade. Para isto é fundamental a matéria orgânica, a rotação de cultura, a existência de quebra-ventos (evitar que o ar promova a seca). O solo é composto de muitos microelementos químicos que devem existir em equilíbrio, caso contrário as plantas adoecem e as pragas tomam conta. Ou seja, nós temos nos alimentado com plantas, sementes ou frutas duplamente desequilibradas, primeiro pelas deficiências minerais por não cuidar bem da vida do solo e, segundo, pelos agrotóxicos que aplicamos para combater as pragas que decorrem dessas deficiências.
Nós seres humanos não nos damos conta de que, ao nos alimentarmos de plantas deficientes e envenenadas, acabamos por desequilibrar nosso organismo ao longo do tempo. Por isso, a alimentação saudável é de suma importância para uma vida longa e boa. Seus estudos hoje têm um valor ainda maior, por conta da dura realidade que enfrentamos com a pandemia. Quem tiver a felicidade de manter elevada capacidade imunológica, sinal de vida saudável e equilibrada, tem muito mais condições de resistir à pandemia.
Por isso, a obra de Ana Primavesi hoje é mais atual do que nunca. Sabe-se, por exemplo, o quanto é comum a existência de altas doses de venenos em três frutas muito consumidas: batata, tomates e moranguinhos. A professora contava que uma vez um agricultor que plantava batatinhas lhe disse que ele não comia dessas batatas. Ela perguntou, então, por que o senhor planta batatas. Ele respondeu: ‘pra vender!’ Conheci pessoalmente a professora Ana Primavesi. Em meados dos anos 80, visitei os novos assentamentos no município de Mangueirinha.
Lembro que a recomendação técnica era de 20 a 30 toneladas de calcáreo por alqueire para corrigir a acidez do solo. Um custo altíssimo e, com mais a destoca, inviabilizava os assentamentos. A professora Primavesi examinou o solo e disse: coloquem calcáreo para nutrir o solo de cálcio não para corrigir toda a acidez, permitam que, com a matéria orgânica e a cobertura do solo, a terra se torne fofa e então as raízes vão se desenvolver em profundidade, compensando as deficiências do solo.
Comecem aos poucos a melhorar a terra. Me comove ao ver hoje, naquele mesmo município, agricultores que promovem a soja sustentável e colhem mais de 200 sacas por alqueire. Fazem isso: rotação de cultura, uso de adubo orgânico e controle ecológico de pragas, dando chances para que o solo se torne fofo e cheio de vida. Aprendamos com Ana Maria Primavesi.
Cristophe de Lannoy
Engenheiro agrônomo e sociólogo rural