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Francisco Beltrão
sábado, 21 de junho de 2025

Edição 8.230

21/06/2025

Do tempo que não se acompanhava a Copa do Mundo nem pelo rádio

Nildo Zancan no dia desta entrevista: "Eu comecei a torcer
pro Flamengo porque não sei quem que me deu uma
meia, um calção e uma camisa do Flamengo.
Nildo Zancan no dia desta entrevista: “Eu comecei a torcer pro Flamengo porque não sei quem que me deu uma meia, um calção e uma camisa do Flamengo.

 

Nildo é o décimo dos 13 filhos de Maximiliano e Angelina Strapasson Zancan: Regina, Oliva, Italina, Antônio, Zélia, Assunta, Terezinha, Lourdes, Diles, Nildo, Darcy, Pedrinho e Zenilva. Pioneiros de Beltrão, chegaram no tempo de Marrecas, em 29 de janeiro de 1948.

Nildo Francisco Zancan nasceu dia 15 de maio de 1940 na Linha Paraí, de Nova Prata (RS), hoje é município. Dia 30 de junho de 1962, casou, em Beltrão, com Valdemira Santolin, a mãe de seus cinco filhos: Marilei (casada com Arci Medeiros), Edenilson (casado com Cássia Balvedi), Paulo Sérgio (casado com Tati Canzi), Airton (casado com Carla Zamadei) e Francieli (casada com Gerson Wessler).

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Os filhos já lhe deram sete netos.
Como agricultor, Nildo cultivou terras que hoje estão no perímetro urbano de Francisco Beltrão. Por doze anos e meio trabalhou na cerealista de Osmar Brito. Depois, em sociedade com Crestani e Dall`Agenese, abriu fábrica de fogões e funilaria. Em 10 de setembro de 1975 , criou a Indústria e Comércio de Fogões Líder, que ainda tem funilaria mas seu ponto forte, hoje, é o comério de materiais de construção e está junto com a Construtora Líder, cujo engenheiro é o neto Rodrigo Zancan, filho do Edenilson.

Neste perído que se vive a Copa do Mundo no Brasil, Nildo foi procurado pelo Jornal de Beltrão para falar sobre Francisco Beltrão do tempo que o Brasil sediou a primeira Copa, em 1950, dois anos depois de sua família ter chegado aqui.

O que lembra daquela viagem do Rio Grande para o Paraná, em janeiro de 1948?
Ah, lembro que nós viemos e demoramos uns quatro, cinco dias do Rio Grande até aqui. Paramos na Água Branca, porque o pai e os cunhados compraram terra no 14, eu não sei até hoje onde  que é. Mas não tinha estrada pra entrar. Por acaso tinha um rancho, do Damásio (Gonçalves), ali atrás da Polícia Rodoviária. Na bodega, falaram com esse tal de Damásio, e colocaram as três mudanças no rancho, porque não tinha onde ir, era só cargueiro. Ficamos uns 60 dias ali. Enquanto isso, compraram uns quatro alqueires na (hoje bairro) Vila Nova, a troco de revólver, cavalo, não sei o que era, e fizeram duas casas.

Uma casa era a cozinha e a outra a casa os quartos. Depois de 60 dias, o João Greia veio buscar a mudança nossa e nós viemos a pé da Água Branca até aqui, atrás. E contam, porque a gente não viu também, que ali nos Fregonese que, naquele tempo o rancho do Paulo Moura, diz que a onça, de noite, chegou a despregar matajunta. Contam, se é verdade eu não sei. Nós chegamos lá nessas casas que fizeram em tábua lascada. E dia que nem hoje, fechado assim, todos os dias a onça descia, do morro no parque. Quando ela dava uma urrada, nós ó pra dentro, morria de medo.

Vocês ouviam o urro da onça?
Mas ó, isso era três, quatro vezes, começava lá na pedreira, no Bordignon, e ia vindo até quando desaparecia lá pra baixo. Quando era dia de sol de certo ela subia, porque só descia no dia de chuva. Chovia ela descia sempre. Isso cansamos de ver. Nós tudo piazada, se pelava de medo, ia pra dentro de casa e se fechava (risos). Falavam que iam pegar, mas era difícil, a onça é o bicho também. Depois o pai comprou mais seis alqueires, tinha dez. Pegava ali na igreja da Vila Nova, descia costeando o rio e subia até a Casa de Formação (Divino Mestre). E aquele pinheiro, tinha um rancho de três caboclos que venderam a terra, era umas 8 horas da manhã, eles se tracavam com machado pra derrubar um pinheiro só pra ver o tombo. E grito, porque eles não faziam nada, não tinha o que aproveitar, só pra ver o tombo (risos). Mas pinheiro!

Ali onde hoje é cidade.
É, hoje é cidade. Todos os pinheiros que o pai tirou, era no meio da lavoura, só um deles deu 27 dúzias de tábuas de 4 e 30. Dava pra fazer duas casas, pela quantia da madeira, de 7 por 9, em pinheiro. Porque lá dava. Mas tinha bastante, era uns 300 pinheiros mais ou menos. Em cima da (hoje) igreja da Vila Nova, descendo pro lado do parque. Dia de chuva você ia catar pinhão, não enxergava os grãos de tão escuro que era o pinhão. E uma vez, eu e minha irmã Italina (Italina Zancan, primeira professora de Francisco Beltrão) se perdemos, minha irmã vinha dar aula aqui na Cango. Nós inventamos de sair, onde tem hoje o colégio, um pouquinho pra cá, nós morava lá em baixo, e fomos atalhar pra sair aqui no Luiz Faedo.

Vocês atalharam onde é hoje o Colégio Alliança?
É por ali, mais ou menos, mais pra trás um pouco, mais pro lado da Vila Nova. Tinha uma picada e não conseguimos, saímos do mato às onze horas da manhã. Eu sei que no outro dia a Italina passou a conversa, que deu não sei o que, pra piazada. Era pras oito horas estar lá e não conseguimos.

Não tinha medo da onça?
Tinha, mas ia fazer o que? Era uma picadinha, mas muito mal e mal, porque a estrada saía, passava lá no posto Ivalu, fazia uma volta do cão, mas pra não se perder tinha que ir por lá, não tinha outro atalho. Depois, mais tempo, sim, que daí fizeram uma cerca e você ia a par da cerca, não tinha como errar, aí tu saía ali no Luiz Faedo.

Não era pela rua Londrina de agora, era mais pra trás, mais perto da Rua Maringá.
Sim, vamos dizer que aqui é o posto e nós entrava aqui, passava pelos Fregonese e depois vinha rumo à Vila Nova, naquele tempo a União da Vitória nem existia, era mato e mato mesmo.

E estudou quantos anos?
Ah, estudei até o quarto, porque daí eu comecei a trabalhar.

E daquele tempo de aula o que é que você lembra, muita bronca na piazada?
Ah, a piazada respeitava muito o professor, era castigo severo. Facilitava, até eu acho que me apanharam, porque piá é piá, grão de milho, e ficar de joelho em cima do grão de milho. Qualquer coisa que aprontava a régua véia comia em cima dos dedos. Porque não tinha. Na realidade, hoje mudou tudo, mas eu acho que não mudou pra melhor, mudou pra pior, porque naquele tempo era exigido, o pai dava tapas quando precisava, e hoje não pode mais dar um tapa, não pode mais uma série de coisas, e eu acho que a lei hoje tem alguma coisa que até sim, mas tem muita coisa favorecendo o lado errado, vamos dizer assim, que nem preso e outros e drogas, e não existe uma lei pra poder repreender. Eu acho que naquele tempo alguns exageravam, porque, às vezes, em vez de darem um tapa, davam uma paulada, no próprio filho, que tá errado também, só que criavam os filhos diferentes, era diferente o sistema, não tinha tanta coisa. Eu acho que executavam os filhos melhor do que dá pra executar.

E com o pai e a mãe também?
O nosso se tivesse com pessoas, nós nem chegava perto. Ou se tivesse e ele desse uma olhada, nós já zarpava. O pai me deu só um tapa, que eu me lembro, não sei porque, mas foi só esse tapa. Agora com a mãe era um tapinha aqui, outro ali. Mas quem socorria nós era a mãe, nós se achocava pro lado da mãe. Naquele tempo, o pai ninguém ficava proseando assim, ele era fera, era com homem ou mulher, com quem estivesse conversando com ele e nós tivesse ali, ele só dava aquela olhada e nós corria. 

Inclusive no tempo da Revolta, o senhor já estava com uns sete anos.
Sim, eu já conversava mais com ele. Eu participei da Revolta ali na rua Londrina, nós morávamos na frente do Goldoni. Eu participei da Revolta, quase matamos um monte. Porque era assim, se aparecesse jipe da Companhia, era pra meter fogo, eram as ordens, e de repente veio um jipe, e todo mundo, acho que tinha umas trezentas armas. A sorte é que eles viram, levantaram as mãos, mas eles ficaram amarelo que nem esse papel aqui, os quatro que tavam em cima, o Alcides da Rosa, Aldoíno Potrick e mais dois que eu nem sei quem eram. E eles pegaram o jipe da Companhia pra ir prender tudo que é puxa-saco da Companhia. Eles iam prender e depois tinha que ir buscar lá na delegacia, prendia um dia ou dois. Eles iam prender um cabra que era puxa-saco da Companhia, e eles não se lembravam que tava tudo sitiado. Se dava um tiro, ninguém sabia quem é que tinha dado.

Era uma trincheira que vocês fizeram?
Sim, todo mundo atrás de árvore, toco, coisa assim, não aparecia ninguém, mas quando levantava um, levantava todo mundo. Ficamos três dias ali, durante a noite também.

Das Companhias, ninguém apareceu?
Não, não. Porque eles foram presos pelo exército.

Depois vocês foram na praça também?
É, depois que as companhias foram embora. Depois veio uns policiais, oito dias depois, quatrocentos, quinhentos policiais, e nós puxava lenha pro hospital do dr. Walter. Eu descendo com a carroça e vinha aquele policiamento, seiscentos soldados – meu Deus! -, aqueles bois corriam. Viemos pra cá e morava ali na frente do Hilário, e fomos lá perto do Seminário, onde a minha irmã mora, fomos todos pra lá, a família toda. Eles pensavam que era pra enfrentar os colonos, os policiais, mas não tinha mais colonos, eles já tinham saído tudo, e  eles viram que a coisa tava feia e daí entrou o dr. Walter no meio, e proseando e proseando, até que foram embora. Porque os colonos já tinham saído tudo.

E vocês chegaram a sair de casa?
Nós fomos até onde que era o meu cunhado, do lado do Seminário, o Armando Scotti.

O seu pai participou?
Não, ele não participou.

E mais algum irmão seu participou?
Não, também não. Não sei onde ficaram. Meu pai teve que fazer contrato, pagar 500 daquele dinheiro velho, senão eles iam em cima e incomodavam. Foi obrigado a fazer contrato. Devia ser 500 cruzeiros.

E da Copa de 1950, o que lembra?
É, no ano 50, eu sei que o Brasil perdeu pro Uruguai, mas daqui eu não lembro de nada.

De quando lembra de futebol?
Olha, eu me lembro do ano 70, que apareceu a primeira televisão aqui e eu fui assistir em cima da casa de um apartamentozinho que tinha o Palu, nosso contador. Eu trabalhava no Osmar Brito. Fomos assistir lá porque ele tinha TV, mais ninguém tinha TV, mas era aquele chuvisco, você enxergava o Pelé correndo e alguns outros, mas muito mal e mal. Em 58 foi o ano da primeira partida que o Pelé entrou, que o Amarildo se machucou, e entrou o Pelé  e fez sucesso. As outras copas a gente lembra, depois mais pra frente que a gente perdeu pra França.

Vocês não acompanhavam pelo rádio?
Era muito difícil, porque nós tivemos rádio bem depois. Nós não tinha nem rádio.

Na copa de 62, foi no tempo do seu casamento, também não lembra de nada?
Em 62 era o meu casamento. Rádio nós não tinha, não tinha nada, era bem pouco.

Quando o senhor começou a jogar futebol?
Ah, desde piá. O primeiro campo feito aqui, saiu ali no parque, nas antigas mangueiras. O primeiro campo era de grama natural, que Deus mandou, não era grama plantada, arrancamos muito maricá, é uma árvore muito boa. Desde piá, já começamos a brincar, ali que eu comecei a jogar bola. Depois passamos a jogar um pouco lá nesse meu cunhado Scotti, ele tinha um potreiro que nós fizemos de campo e passamos a jogar lá também. E assim foi, em vários lugares, no CTG e aqui no nosso da Cango. Eu comecei a torcer pro Flamengo porque não sei quem que me deu uma meia, um calção e uma camisa do Flamengo. E no ano 62 eu comecei a torcer pro Palmeiras, porque não tinha graça torcer pro Santos, ele ganhava tudo naquela época. Depois comecei a torcer pelo Inter.

E hoje, torce pra qual time?
Pros três ainda (risos). 

Seus irmãos jogavam futebol?
Acho que todos.

E o Pedrinho também?
Ô, jogou muito. Ele parou antes, mas ele até que ia muito bem. Dos meus filhos, o Paulo César, se fosse ter um professor, podia ter pegado um time grande. E o Paulo César até hoje é, ainda, hoje ele tá meio descontujado, e o Nego também, e o Airton mais ou menos, só que ele tinha preguiça, ele era mais goleiro que jogava.

E o senhor continua jogando com 74 anos, quantos anos de futebol?
Se for contar, eu joguei até os 22, nós montamos o time da Ajuricaba e depois passamos pro Industrial, daí eu parei até os 42 anos, parei 20 anos. Depois comecei de novo e aí não parei mais.

Por que parou naquele tempo?
Ah, casado e daí isso e aquilo e não tinha tempo, as coisas não se ajeitaram. Fiquei 20 anos parado, daí nós fazia as partidas loucas, com o Porto Alegre, nós fazia três ou quatro partidas por ano e os gordos com os magros, e até jogamos um amistoso no campo do União e o velho Vêscovi foi o nosso goleiro, ele tinha 150 quilos e ganhamos o jogo, nunca perdemos. 

O senhor  jogou pelos gordos?
Sim, eu tinha 93 quilos. Eu tava parado, não corria, não me mexia, não fazia nada. E nós, os gordos, nunca perdemos o jogo pros magros. Nunca perdemos. Todas essas partidas loucas eram assim. Nós tinha um cara que pesava 119 quilos, trabalhava no matador no Antoninho, ele não corria, mas ele sabia o que fazer com a bola no pé. Fizemos um jogo nesse intervalo e jogamos contra o meu compadre, o Nino Rodrigues, e ele é magro, e daí o Porto Alegre que era o nosso goleiro não pode ir e foi o Faedo, e meu cunhado, o Adroaldo, e aí foi ele, e esse Nino, meu compadre, mas deu certo, que o meu cunhado rolou a bola pra mim, e eu só fiz que ia pegar a bola, e ele veio, e eu deixei a bola, e saí tocando pra lá, e ele veio e não conseguiu se afirmar, e foi uns cinco ou seis metros de bunda no chão, e eu toquei a bola pra fora e deitei.

Eu nunca me esqueço alguma jogada de como aconteceu.Depois, no Bangu que teve três jogos, um aqui, um em Nova Esperança e um Clevelândia, e nós fomos lá em 12, e em cinco minutos nosso zagueiro se machucou, e aí perdemos de 5×3, e entrou um outro que tava fora e foi a 5 a 5, 6 a 5, e foi indo, um fazia o gol e o outro time fazia o outro, até que fomos 110 minutos, quando eles fizeram 8, 8 a 8 e daí paramos o jogo, mas nunca mais. 

JdeB – Prorrogação até empatar?
Nildo – Sim, até que nós não empatassem não parava. Teve muitas partidas, mas teve umas que mais nos marcou. Em Nova Esperança, fomos em 12 e levamos um bombeiro de espertos, pra jogar também né, e no primeiro tempo senão joga e depois você joga, chegamos lá e cinco varzeanos e seis veteranos, vamos embora o César dizia, e eles davam a carne quando nós ia lá, que nem aqui nós dava, e aí eu disse vamos jogar, se perdemos, perdemos e pronto, mas vamos jogar. O único jogo que eu mandei os caras fazer e fizeram o que eu mandei, eu não sou melhor que os outros, mas muito pelo contrário, eu escalei o time e disse que hoje eu era o número seis e aquele que queria ia ficar lá de lateral, aí botei o Ivo, Alberdi, o Celvino que jogava os dois, e o goleiro nosso era o Capanema. E depois o César, o Arci, o Kiko de centravante, eu na direita e assim ia indo. E eu digo vocês não driblem ninguém, eu vou tocar pra vocês, e o Kiko e o Arci sempre meio perto, depois o César, então o que é que aconteceu, ganhamos de 5 a 0.

Eles cruzavam a bola, o Kiko fez três gol de cabeça e o Arci fez dois gol de pé. E naquele tempo, eu tinha 48 anos, deu uma jogada pro meu lado, e eu vi que o cabra vinha ferrado, eu toquei a bola pro Milton, e ele veio me jogou contra a cerca, mas eu toquei a bola e pulei pra cima, e ele bem assim, não sabe o que é futebol, e eu disse futebol eu sei, mas esse aí não, mas ele ficou bem brabo, imagina, eles tavam perdendo, aí o César queria surrar ele, e eu disse não, deixa quieto. E aí corri três vezes na esquerda, e quando chegou na terceira vez ele disse quantos anos você tem? E eu perguntei quantos anos ele tinha e disse que tinha 30, e pedi o porquê que ele tinha perguntado isso, e ele é vou ter que parar de tomar cachaça, porque das três corridas com você, eu perdi as três (risos). Bom, daí é problema teu, né.

E outra vez que nós jogamos aqui no Bangu, jogamos lá na Volta do Marrecas, e não sei se empatamos lá, mas parece que sim, e daí viemos aqui, e nós tava em 11, num sábado, e o campo ainda tinha um pouco de terra, e um véio da Volta do Marrecas, puxava a bola pra cá e pra lá, e fez do Arci e o Kiko dançar um par de vezes, e de repente eles fizeram um gol, e aí o Arci e o Kiko pegaram as camisas e jogaram e não tinha mais ninguém, nós tava em nove, jogaram de camisa no chão, daí eu disse não “cagão que nem você pode ficar pra fora” .

Daí empatamos, e eles bem assim: hoje aqui vocês não jogam mais (risos). Eu disse vocês aqui são uns cagão frouxo, e vocês não jogam mais, podem jogar outra partida, mas essas não jogam mais, e aí foi assim. E eu disse assim, que não sei se você sabe que o véio lá da volta do Marrecas e ele botou a chuteira, mas ele não conseguia jogar com a chuteira, quando terminou o primeiro tempo, ele disse não dá pra mim terminar a chuteira, porque eu não me acerto muito com a chuteira, e aí nós tava perdendo de 11 a 0 e não é que empatamos, e fizemos 12 (risos). E essas coisas ficam marcadas assim, né. 

JdeB – Você lembra quando que começou a jogar de chuteira?
Nildo – Ah, desde piá. Sempre teve chuteira, mas eu me acostumei desde piá a jogar com a chuteira. 

JdeB -E  sempre jogou em que posição?
Nildo – A maioria lateral direito e às vezes pro esquerdo, mas 90% lateral direito, meu lado mesmo é o direito.

JdeB- Apoiava também, fazia gol de pênalti?
Nildo – Apoiava sim, mas gol de pênalti era muito difícil. 

JdeB – Se machucou muito?
Nildo – Nunca me machuquei. Uma vez, no Ujuricaba eu caí de quatro metros de costas. Naquele tempo vinha aqueles sacos cheios de papelão, e eu e o falecido tinha que pilhar e olhar pra que ficasse reto ainda, e era três ou quatro puxando e um empilhando, e me escapou e eu fui de costas, sorte que achei uma pilha de sacos novos, e caí lá, bati a cabeça e me sentei assim, me amoleceu as duas pernas, fiquei trinta dias sem trabalhar e depois voltei a trabalhar normal. Nunca tive um problema de coluna, nunca e olha que eu trabalhei, não tinha tamanho de sacos, era 92 quilos, 80 direto e trabalhamos três anos eu e o Damázio e o Bonetti, nunca ninguém ficou mais que dois dias, e não vinham receber de vergonha, porque não aguentavam, e nós três aguentamos os três anos, direto, quatorze caminhões pequenos descarregaram na  balança e nós carrega mais quatro, tudo no mesmo dia, às vezes nós trabalhava até dez, onze da noite.

E eu chegava em casa, como eu era solteiro, tinha que pegar as pernas e massagear, porque tava duro que nem um pau, e era morro pra subir, empurrando a bicicleta. Depois mudei, fiquei quase quatro anos, e daí no atacado era uma brincadeira, porque carregava sal, querosene, açúcar. Nós fazia um jogo em cima da minha cabeça pra carregar, cento e cinquenta quilos quantas vezes, carregava quatro caixas de chumbo e duas caixas de cerveja, eles ponhavam em cima, e faziam trinta e quarenta metros, faziam de cento e sessenta quilos, farinha que carregava um saco e depois mais dois, e três sacos de cimento cansei de carregar, hoje nós temos um piá aqui que carrega desse jeito e é magro.

JdeB – E nunca deu problema de coluna, nem hoje?
Nildo – Não. Nunca deu problema. Eu pegava saco de cinquenta, sessenta quilos e jogava pra cima da cabeça. 

JdeB – Naquele tempo que você ficou parado só engordou?
Nildo – Sim, porque eu só voltei a jogar em 82, pra subir em cima da caminhonete pra mim era a coisa mais difícil, não conseguia de tão duro, de ficar tanto tempo parado. 

JdeB – E depois que voltou a jogar bola emagreceu?
Nildo – É com o tempo depois, me deu algumas doenças passageiras que também prejudicou, e aí eu emagreci, e depois o meu peso ficou em 76 por aí. Eu fui operado da apendicite, eu jogava três quatro vezes por semana, aí no sábado e domingo eu parava, e aí ia pra 78, na semana ficava em 76 de novo, depois que eu operei, aí fui pra 82, 83 e 84, e agora pra baixar meio quilo é difícil.

JdeB – Mas nunca mais voltou aos 90?
Nildo – Não, o máximo que eu fui acho que foi 85.

JdeB – E a tua alimentação é como?
Nildo – Olha, a gente como quase de tudo, mas procurando mais sempre salada e bastante peixe, sempre tem peixe no freezer que eu vou pescar, quando não tem eu compro. Mas bastante peixe, três vezes por semana, peixe eu gosto muito, gosto de pescar.

JdeB – E o vinho também não falta?
Nildo – Ah, o vinho sim, já fazem uns quantos anos que eu tomo todos os dias, um vinho de meio-dia, uma taça de vinho. Mas procuro pegar sempre vinho da nossa região, vinho puro. Esse da Argentina eu não consigo tomar, não me serve, o mesmo aqueles do Rio Grande também, que eles colocam conservantes, daí não me serve. Depois que eu comecei a tomar vinho assim, não parei mais, e quem me ensinou foi o meu sobrinho, já fazem uns dez, doze anos. E eu sempre antes, quando tomava vinho me atacava o fígado e me dava dor de cabeça, mas aí tomando esses vinhos de qualidade não me dão mais. 

JdeB – E na parte de comercial como que foi? Qual foi seu melhor período?
Nildo – Na parte comercial por exemplo é claro que eu comecei no Osmar Brito anos 60, eu entrei com 150 mil de dinheiro que eu não sei, fiz uma safra de trigo, uma safra de feijão e um pouco de dinheiro foi do pai, entrei com 150 mil no Osmar Brito anos 60. No ano 72 e meio eu saí. Nesse intervalo eu tinha deixado 500 mil pro falecido Vilmar, no ano 64 que ele queria que trabalhasse com ele, mas como o Osmar não me deixou e começou a melhorar, melhorou a cota e tal e não fui com o Vilmar e daí no ano 72 e meio saí do Osmar Brito e daí a cota que eu tinha lá de 17 milhões e 400, o do Guiomar deu 16 milhões e 400.

Aí eu apurei 40 milhões naquele dinheiro e entrei com o Sadi Crestani que esses 40 mil em dinheiro nós compramos uma camionete, depois comprei a fábrica do Pedro Petrycoski e deixamos um bolo junto, três partes iguais.Quase em 75, não deu mais certo e cada um pegou sua parte. Eu peguei minha parte e comprei aqui e me instalei, em75.

JdeB – E sempre foi crescendo?
Nildo – É e teve um ano que eu ganhei dinheiro com cimento, e nunca se ganha dinheiro com cimento. No ano 76 pra virar 77, não tinha cimento, 2 mil sacos, nós entregávamos mil quando entregava, porque era uma crise. Aí eu precisei depender, comprei um caminhão Vox, mas a Icavel não tinha pra entregar e fui pegar em Cascavel e com ágio. Pra equipar foi mais ou menos 40 dias e do dia 10 de dezembro até o dia 20, mais ou menos, de janeiro comércio total fechou e eu tinha que pagar o caminhão, fiquei aberto. Eu dei 300 mil e custou 620 o caminhão e mais 200 para equipar, custou 820. Aí eu fiquei com o comércio aberto, acho que no material empatamos, cano, essas coisas assim e no cimento tirei o caminhão 0 km, só no cimento. Nunca mais vai ser igual. O que eu fiz? Vendi mais de 20 mil sacos de cimento, ninguém funcionava e eu primeiro pagava e no outro dia de manhã cedo me cobravam 10% de reajuste porque tinham subido e daí eu disse me mande três caçambão que vinham 900 mil sacos cada um, não dava nenhum centavo, de manhã, por exemplo, ligavam às quatro horas da tarde, de manhã cedo tava os três caçambão aqui na frente, nem descarregavam, tudo em cima de caminhão,dos meus e dos outros, de tarde telefonava e manda mais três e me mandavam sem mandar um centavo. Primeiro pagava e não me mandava. Aí eu trabalhei 40 dias dessa forma assim.

JdeB – Vinha de onde o cimento?
Nildo – Da votoran, da fábrica de Curitiba, que até hoje. na soma que aqui eu vi, comprei um caminhão 0 km.


JdeB – Num mês e pouquinho?
Nildo – É, 40 dias. Mas eu não vencia pegar o dinheiro, era um monte de dinheiro.
Nildo – Não, nunca mais. Quando eu estava lá na época, seu Sadi Izidoro, nós ganhamos num ano uma barbaridade, nós compramos mais de 200 mil quilos de chapa, remata no estoque e deu crise de chapa no Brasil, 20 centavos nós pagamos o quilo e vendia a dois reais não sei quantos mil quilos e fogão nós plantava dez por dia, nós começávamos às oito da manhã e ia até as dez da noite todo dia. Primeiro vinha o dinheiro pra depois nós ir plantar fogão. Era uma fome que não existia daquele tamanho, lá nós ganhamos também dinheiro, eu vim pra baixo com mais de 600 fogão pronto, quando vim aqui, só que depois de um tempo patinou.


JdeB – E agora está num período bom?
Nildo – É, agora tá equilibrado. Nós tivemos muitos comércios um pouco desonestos que atrapalhou muito. Perdemos muitas contas, as contas uma vez você não perdia e agora ultimamente se perdeu muita.


JdeB – Como o senhor acompanhou o desenvolvimento da cidade. Quando chegou aqui, se perdia no meio do mato e agora é tudo urbanizado.
Nildo – Até ontem mesmo eu, pensando comigo, vê a quantia de carro que tem hoje. Até falei pra uma pessoa ali na frente, que pra você ver um carro era uma coisa difícil, nem tinha, pode-se dizer, e hoje você não tem lugar pra estacionar em qualquer rua. Foi um crescimento extraordinário, muito grande, muito forte, eu quero ver daqui a dez anos como que vai ficar. 


JdeB – Quando chegou aqui, imaginava que ia ser uma cidade grande?
Nildo – Não, se eu contar que quando chegamos aqui tinha três ranchos lá em cima, nem igreja existia. A Catedral, ali onde era o posto Sabiá que hoje não é mais, mas três ranchos, a pensão da “Zilda” que recebia dez pessoas só, porque não tinha pra mais dez e era de chão, e pra baixo tinha um barzinho, uma bodeguinha, pra baixo ali do lado da ponte, que não tinha nem a ponte e logo em seguida foi feita a ponte e passavam as máquinas, carroças passavam pra cima dessa ponte que nós temos aqui, tinha o passadouro quando o rio tava baixo, porque quando tava cheio não passava. Lá no Vila Nova, rancho mais pra lá e pra cá tinha mais, o que tinha era aquilo ali. Lá onde o pai comprou os quatro alqueires tinha rancho também. Depois comprou mais seis, mas tinha mais, um que outro de rancho, mas dizer que tinha o que? Tinha nada, nada, nada, nada.


JdeB – E mesmo depois que você se estabeleceu aqui também mudou bastante, esse terreno quando você comprou era barato?
Nildo – Ah sim, o que eu paguei naquela época, até primeiro de tudo eu tinha comprado um que tinha dez metros de 76, depois comprei da véia Zalda, até quando comprei ela disse mas eu te vendi, eu disse, mas tu vendeu ou tu me vende eu disse assim, não te vendo, aí entramos em contato, ficamos oito dias ela oferecendo uísque Cavalo Branco pra nós tomar, aí ficava uns oito dias eu fiz o negócio e comprei aqui, daí o Izidoro meu compadre agora tem que vender aqueles ali, mas digo não dá, homem, não, não, tem que me vender, paguei por 51 e 300 e vendi por 51 e 300 aquele e aqui eu paguei 140, daquele dinheiro, em 1975.


JdeB – Foi barato?
Nildo – Sim, sim. Eu não sei assim no dinheiro de hoje, naquele tempo não era real, acho que era cruzeiro. 140 eu paguei, a prazo ainda. Dei o carro e mais 40 mil e depois cinco mil por mês.


JdeB – Mudou bastante.
Nildo – Mudou, inclusive esse terreno ficou sem pagar nada seis meses porque ela queria que desse de volta e não tinha mais condições de voltar. Eu digo não, não tem, não posso mais agora porque vendi lá, não tinha transferido mas vendi documento, vendi, vendi. Depois de seis meses ele quis receber daí, eu queria judiar dela e depois até paguei adiantado.


JdeB – Hoje está tudo construído?
Nildo – Sim, hoje sim, tem dois metros aqui a trás mas tem um telhado, de frente e tem atrás.


JdeB – No futebol você acredita que Beltrão pode voltar pra 1ª divisão?
Nildo – Eu acredito que pode voltar também sim, desde que o comércio dê um apoio e você sabe que pra manter um time depende de bastante despesas e quando eu tava lá junto com o Osmar umas horas nós estava falido, o Osmar tinha 90% e eu tinha 3% e daí eu tive que dizer pro Osmar, vamos fazer assim, “somos tudo parente” no ano de 68, aí o que você quer? Primeira coisa eu vou comprar aqui, o Vilson ……… segunda coisa, você não pega mais 1000 reais num fim de semana aqui porque depois segunda nós temos que pegar 1000 pra pagar as duplicatas e se pega 1000 pra pagar os coisas e o jogador que chega de rancho aqui na base só no papo e daí naqueles 200 e poco mil pagando juros no ano de 68, ai mudamos, abrimos o rancho……. com cavalo pra falar a verdade e nós tinha mais ou menos 600, 700 rancho aí … Zaqueti, abrimos né e começamos a trabalhar. No ano de 70 eu disse Osmar nós vamos te comprar o estoque, eu e o Antônio, porque ele tinha uma cota também, e ele sim, vendemos sim. Quando foi em 72 nós estamos prontos pra comprar o estoque, não agora eu não vou te vender mais, mas tudo bem, deixamos sem dívida, assim sem ser duplicata, sem juros, tinha acabado todo o dinheiro, aquele a juro eu tinha devolvido e tava com a duplicata normal, depois o sobrinho dele falecido achou que a coisa, a gente “comprava ….. e ele pegava e comprava três, quatro e daí entrava no juro e depois faliu praticamente. Então ali a gente peleou pra depois ele “bancou o espertinho também”, tinha condições de pagar.


JdeB – Mas desde aquele tempo o futebol já era caro?
Nildo – Meu Deus do céu, era caro. O Osmar perdeu, no dia de hoje seria mais de um milhão porque desde o clube que hoje é Barra Preta e Barro Preto se juntaram tudo ali, por exemplo. Naquela época ficou 17 milhões pra receber da construção. Telhado que foi posto primeiro ali de zinco nossa, “não ganhamos” um centavo daquilo ali, ali tem muita coisa que ficou ali, quem que pagava que não tinha dinheiro, não recebi nunca, mas foi um monte de dinheiro e ele aguentou porque situação tava … se fosse mais um pouco estava falido, nós não ia sobrar nada da copa também. Aquela vez não que foi melhor que as outras, não, mas que segurei as pontas e tive que falar aquilo que eu não podia falar, não tinha o direito de falar porque você tem 90% e eu tenho 3% o que eu mando aí? “Não podia dizer fico quieto mas também não podia meter o bico” porque poderia dizer assim né, mas ele não, ele catou e daí eu comecei a controlar.

JdeB – E a seleção brasileira?
Nildo – Olha, se ele botar vontade tem condições de ganhar.


JdeB – Tem medo das manifestações?
Nildo – Não, tenho até visto aí. Algum torce até contra, não sei, tem uma pessoa ali que não dá pra entender, se você der carne, comida boa, coisa de primeira, ainda não tá bom (risos). 

No futebol, os gordos ganhavam dos magros

Por que parou de jogar bola com 22 anos?
Nildo Zancan – Ah, casado e daí isso e aquilo e não tinha tempo, as coisas não se ajeitaram. Fiquei 20 anos parado, daí nós fazia as partidas loucas, com o Porto Alegre (Olívio Poletto, da Cango), nós fazia três ou quatro partidas por ano e os gordos com os magros. Até jogamos um amistoso no campo do União e o velho Vêscovi foi o nosso goleiro, ele tinha 150 quilos e ganhamos o jogo, nunca perdemos. 

O senhor  jogou pelos gordos?
Sim, eu tinha 93 quilos. Eu tava parado, não corria, não me mexia, não fazia nada. E nós, os gordos, nunca perdemos o jogo pros magros. Nunca perdemos. Todas essas partidas loucas eram assim. Nós tínhamos um cara que pesava 119 quilos, trabalhava no matador do Antoninho. Ele não corria, mas ele sabia o que fazer com a bola no pé. Fizemos um jogo nesse intervalo e jogamos contra o meu compadre, o Nino Rodrigues, e ele é magro, e daí o Porto Alegre que era o nosso goleiro não pode ir e foi o Adroaldo Faedo, meu cunhado, e esse Nino, meu compadre, mas deu certo, que o meu cunhado, rolou a bola pra mim, e eu só fiz que ia pegar a bola, e ele veio, e eu deixei a bola, e saí tocando pra lá, e ele veio e não conseguiu se afirmar, e foi uns cinco ou seis metros de bunda no chão, e eu toquei a bola pra fora e deitei. Eu nunca me esqueço alguma jogada de como aconteceu. Depois, no Bangu, teve três jogos, um aqui, um em Nova Esperança e um em Clevelândia. Nós fomos em 12 e em cinco minutos nosso zagueiro se machucou, e aí perdemos de 5×3, e entrou um outro que tava fora e foi a 5 a 5, 6 a 5, e foi indo, um fazia o gol e o outro time fazia o outro, fomos para 110 minutos, quando eles fizeram 8, ficou 8 a 8 e daí paramos o jogo, mas nunca mais. 

Prorrogação até empatar?
Sim, até que nós não empatasse não parava. Teve muitas partidas, mas teve umas que mais nos marcou. Em Nova Esperança, fomos em 12 e levamos um bombeiro pra jogar também. Chegamos lá em cinco varzeanos e seis veteranos. Vamos embora o César dizia, e eles davam a carne quando nós ia lá, que nem aqui nós dava, e aí eu disse vamos jogar, se perdemos, perdemos e pronto, mas vamos jogar. O único jogo que eu mandei os caras fazerem e fizeram o que eu mandei. Eu não sou melhor que os outros, mas muito pelo contrário, eu escalei o time e disse que hoje eu era o número seis e aquele que queria ia ficar lá de lateral. Aí botei o Ivo Alberdi, o Selvino que jogava os dois, e o goleiro nosso era o Capanema.

E depois o César, o Arci, o Kiko de centroavante, eu na direita e assim ia indo. E eu digo vocês não driblem ninguém, eu vou tocar pra vocês, e o Kiko e o Arci sempre meio perto. Depois o César: o que é que aconteceu, ganhamos de 5 a 0. Eles cruzavam a bola, o Kiko fez três gols de cabeça e o Arci fez dois gols de pé. Naquele tempo, eu tinha 48 anos, deu uma jogada pro meu lado, e eu vi que o cabra vinha ferrado, eu toquei a bola pro Milton, e ele veio e me jogou contra a cerca, mas eu toquei a bola e pulei pra cima, e ele disse bem assim: não sabe o que é futebol? Eu disse futebol eu sei, mas esse aí não.

Ele ficou bem brabo, imagina, eles tavam perdendo. Aí o César queria surrar ele, e eu disse não, deixa quieto. E aí corri três vezes na esquerda, e quando chegou na terceira vez ele disse quantos anos você tem? E eu perguntei quantos anos ele tinha e disse que tinha 30. Pedi o porquê que ele tinha perguntado isso. E ele é, vou ter que parar de tomar cachaça, porque das três corridas com você eu perdi as três (risos). Bom, daí é problema teu, né. 

E outra vez que nós jogamos aqui no Bangu, jogamos lá na Volta do Marrecas, e não sei se empatamos lá, e daí viemos aqui, e nós tava em 11, num sábado, e o campo ainda tinha um pouco de terra, e um velho da Volta do Marrecas puxava a bola pra cá e pra lá, e fez do Arci e o Kiko dançar um par de vezes. De repente eles fizeram um gol, e aí o Arci e o Kiko pegaram as camisas e jogaram e não tinha mais ninguém, nós tava em nove. Jogaram de camisa no chão. Daí eu disse não cagão que nem você pode ficar pra fora . Daí empatamos, e eles bem assim: hoje aqui vocês não jogam mais (risos). Eu disse vocês aqui são uns cagão frouxo, e vocês não jogam mais, podem jogar outra partida, mas essas não jogam mais, e aí foi assim. 

Não sei se você sabe que o velho lá da volta do Marrecas, o Amélio Mendes, não conseguia jogar com a chuteira, quando terminou o primeiro tempo, ele disse não dá pra mim terminar a chuteira, porque eu não me acerto muito com a chuteira, e aí nós tava perdendo de 11 a 0 e não é que empatamos, e fizemos 12 (risos). E essas coisas ficam marcadas. 

Você lembra quando começou a jogar de chuteira?
Ah, desde piá. Sempre teve chuteira, mas eu me acostumei desde piá a jogar com a chuteira. 

E  sempre jogou em que posição?
A maioria lateral direito e às vezes pro esquerdo, mas 90% lateral direito, meu lado mesmo é o direito.

Se machucou muito?
Nunca me machuquei. Uma vez, no Ajuricaba eu caí de quatro metros de costas. Naquele tempo vinha aqueles sacos cheios de papelão, e eu e um cara que hoje é falecido tinha que empilhar e olhar pra que ficasse reto, e era três ou quatro puxando e um empilhando, e me escapou e eu fui de costas. Sorte que achei uma pilha de sacos novos, e caí lá, bati a cabeça e me sentei assim. Me amoleceu as duas pernas, fiquei trinta dias sem trabalhar e depois voltei a trabalhar normal. Nunca tive um problema de coluna, nunca. E olha que eu trabalhei, não tinha tamanho de sacos, era 92 quilos, 80 direto e trabalhamos três anos eu e o Damázio e o Bonetti, nunca ninguém ficou mais que dois dias, e não vinham receber de vergonha, porque não aguentavam, e nós três aguentamos os três anos, direto, quatorze caminhões pequenos descarregaram na balança e nós carrega mais quatro, tudo no mesmo dia. 

Às vezes nós trabalhávamos até dez, onze da noite. E eu chegava em casa, como eu era solteiro, tinha que pegar as pernas e massagear, porque tava duro que nem um pau, e era morro pra subir, empurrando a bicicleta. Depois mudei, fiquei quase quatro anos, e daí no atacado era uma brincadeira, porque carregava sal, querosene, açúcar. Nós fazia um jogo em cima da minha cabeça pra carregar, cento e cinquenta quilos, quantas vezes, carregava quatro caixas de chumbo e duas caixas de cerveja. Eles ponhavam em cima e faziam trinta ou quarenta metros. Faziam de cento e sessenta quilos, farinha que carregava um saco e depois mais dois, e três sacos de cimento cansei de carregar, hoje nós temos um piá aqui que carrega desse jeito e é magro.

E nunca deu problema de coluna, nem hoje?
Não. Nunca deu problema. Eu pegava saco de cinquenta, sessenta quilos e jogava pra cima da cabeça. 

Naquele tempo que você ficou parado só engordou?
Sim, porque eu só voltei a jogar em 82, pra subir em cima da caminhonete pra mim era a coisa mais difícil, não conseguia de tão duro, de ficar tanto tempo parado. 

E depois que voltou a jogar bola emagreceu?
É, com o tempo. Depois me deu algumas doenças passageiras que também prejudicou, e aí eu emagreci. Depois o meu peso ficou em 76, por aí. Eu fui operado da apendicite, eu jogava três quatro vezes por semana, aí no sábado e domingo eu parava, e aí ia pra 78. Na semana ficava em 76 de novo. Depois que eu operei, fui pra 82, 83 e 84, e agora pra baixar meio quilo é difícil.

Mas nunca mais voltou aos 90?
Não, o máximo que eu fui acho que foi 85.

E a tua alimentação como é?
Olha, a gente come quase de tudo, mas procurando mais salada e bastante peixe. Sempre tem peixe no freezer, que eu vou pescar,. Quando não tem eu compro. Mas bastante peixe, três vezes por semana, peixe eu gosto muito, gosto de pescar.

E o vinho também não falta?
Ah, o vinho sim, já fazem uns quantos anos que eu tomo todos os dias, um vinho de meio-dia, uma taça de vinho. Mas procuro pegar sempre vinho da nossa região, vinho puro. Esse da Argentina eu não consigo tomar, não me serve, mesmo aqueles do Rio Grande também, que eles colocam conservantes, não me servem. Depois que eu comecei a tomar vinho assim, não parei mais, e quem me ensinou foi o meu sobrinho, já fazem uns dez, doze anos. Antes, quando tomava vinho me atacava o fígado e me dava dor de cabeça, mas aí tomando esses vinhos de qualidade não me dão mais. 

E na parte de comercial como foi? Qual foi seu melhor período?
Na parte comercial por exemplo, é claro que eu comecei no Osmar Brito anos 60, eu entrei com 150 mil de dinheiro que eu não sei, fiz uma safra de trigo, uma safra de feijão e um pouco de dinheiro foi do pai. Entrei com 150 mil no Osmar Brito anos 60. No ano 72  eu saí. Nesse intervalo eu tinha deixado 500 mil pro falecido Vilmar, no ano 64 que ele queria que trabalhasse com ele, mas como o Osmar não me deixou e começou a melhorar, melhorou a cota e tal e não fui com o Vilmar e daí no ano 72 e meio saí do Osmar Brito e daí a cota que eu tinha lá de 17 milhões e 400, o do Guiomar deu 16 milhões e 400. Aí eu apurei 40 milhões naquele dinheiro e entrei com o Sadi Crestani que esses 40 mil em dinheiro nós compramos uma camionete, depois comprei a fábrica do Pedro Petrycoski e deixamos um bolo junto, três partes iguais. Quase em 75, não deu mais certo e cada um pegou sua parte. Eu peguei minha parte e comprei aqui e me instalei, em75.

E sempre foi crescendo?
É,  teve um ano que eu ganhei dinheiro com cimento, e nunca se ganha dinheiro com cimento. No ano 76 pra virar 77, não tinha cimento, 2 mil sacos, nós entregávamos mil quando entregava, porque era uma crise. Aí eu comprei um caminhão Vox, mas a Icavel não tinha e fui pegar em Cascavel e com ágio. Pra equipar foi mais ou menos 40 dias e do dia 10 de dezembro até o dia 20 de janeiro, mais ou menos, o comércio total fechou e eu tinha que pagar o caminhão. Eu dei 300 mil e custou 620 o caminhão e mais 200 para equipar, custou 820. Eu fiquei com o comércio aberto, acho que no material empatamos, cano, essas coisas assim e no cimento tirei o caminhão 0 km, só no cimento. Nunca mais vai ser igual. O que eu fiz? Vendi mais de 20 mil sacos de cimento, ninguém funcionava e eu primeiro pagava e no outro dia de manhã cedo me cobravam 10% de reajuste porque tinham subido e daí eu disse me mande três caçambão que vinham 900 sacos cada um, não dava nenhum centavo, de manhã, por exemplo, ligavam às quatro horas da tarde, de manhã cedo tava os três caçambão aqui na frente, nem descarregavam, tudo em cima de caminhão, dos meus e dos outros, de tarde telefonava e manda mais três e me mandavam sem eu mandar um centavo. Primeiro pagava e não me mandavam. Aí eu trabalhei 40 dias dessa forma assim.

Vinha de onde o cimento?
Da Votoran, da fábrica de Curitiba, que até hoje, na soma que aqui eu vi, comprei um caminhão 0 km. Não, nunca mais. Quando eu estava lá na época, seu Sadi Izidoro, nós ganhamos num ano uma barbaridade, nós compramos mais de 200 mil quilos de chapa, arremata no estoque e deu crise de chapa no Brasil, 20 centavos nós pagamos o quilo e vendia a dois reais, não sei quantos mil quilos e fogão nós plantava dez por dia, nós começávamos às oito da manhã e ia até as dez da noite todo dia. Primeiro vinha o dinheiro pra depois nós ir plantar fogão. Era uma fome que não existia daquele tamanho, lá nós ganhamos também dinheiro. Eu vim pra baixo com mais de 600 fogão pronto, quando vim aqui, só que depois de um tempo patinou.

E agora está num período bom?
É, agora tá equilibrado. Nós tivemos muitos comércios um pouco desonestos que atrapalhou muito. Perdemos muitas contas, as contas uma vez você não perdia e agora ultimamente se perdeu muita.

Como o senhor acompanhou o desenvolvimento da cidade. Quando chegou aqui, se perdia no meio do mato e agora é tudo urbanizado.
Até ontem mesmo eu, pensando comigo, vê a quantia de carro que tem hoje. Até falei pra uma pessoa ali na frente, que pra você ver um carro era uma coisa difícil, nem tinha, pode-se dizer, e hoje você não tem lugar pra estacionar em qualquer rua. Foi um crescimento extraordinário, muito grande, muito forte, eu quero ver daqui a dez anos como que vai ficar. 

Quando chegou aqui, imaginava que ia ser uma cidade grande?
Não, se eu contar que quando chegamos aqui tinha três ranchos lá em cima, nem igreja existia. A Catedral, ali onde era o posto Sabiá que hoje não é mais, mais três ranchos, a pensão da “Zilda” que recebia dez pessoas só, porque não tinha pra mais dez e era de chão, e pra baixo tinha um barzinho, uma bodeguinha, pra baixo ali do lado da ponte, que não tinha nem a ponte e logo em seguida foi feita a ponte e passavam as máquinas, carroças passavam pra cima dessa ponte que nós temos aqui, tinha o passadouro quando o rio tava baixo, porque quando tava cheio não passava. Lá no Vila Nova, rancho mais pra lá e pra cá tinha mais, o que tinha era aquilo ali. Lá onde o pai comprou os quatro alqueires tinha rancho também. Depois comprou mais seis, mas tinha mais, um que outro de rancho, mas dizer que tinha o que? Tinha nada, nada, nada, nada.

E a seleção brasileira?
Olha, se eles botar vontade, tem condições de ganhar.

Tem medo das manifestações?
Não, tenho até visto aí. Algum torce até contra, não sei, tem uma pessoa ali que não dá pra entender, se você der carne, comida boa, coisa de primeira, ainda não tá bom (risos). 

E mesmo depois que você se estabeleceu aqui também mudou bastante, esse terreno quando você comprou era barato?
Ah sim, o que eu paguei naquela época, até primeiro de tudo eu tinha comprado um que tinha dez metros de 76, depois comprei da véia Zalda, até quando comprei ela disse mas eu te vendi, eu disse, mas tu vendeu ou tu me vende eu disse assim, não te vendo, aí entramos em contato, ficamos oito dias ela oferecendo uísque Cavalo Branco pra nós tomar, aí ficava uns oito dias eu fiz o negócio e comprei aqui, daí o Izidoro meu compadre agora tem que vender aqueles ali, mas digo não dá, homem, não, não, tem que me vender, paguei por 51 e 300 e vendi por 51 e 300 aquele e aqui eu paguei 140, daquele dinheiro, em 1975.

Foi barato?
 Sim, sim. Eu não sei assim no dinheiro de hoje, naquele tempo não era real, acho que era cruzeiro. 140 eu paguei, a prazo ainda. Dei o carro e mais 40 mil e depois cinco mil por mês.

Mudou bastante.
Mudou, inclusive esse terreno ficou sem pagar nada seis meses porque ela queria que desse de volta e não tinha mais condições de voltar. Eu digo não, não tem, não posso mais agora porque vendi lá, não tinha transferido mas vendi documento, vendi, vendi. Depois de seis meses ele quis receber daí, eu queria judiar dela e depois até paguei adiantado.

Hoje está tudo construído?
Sim, hoje sim, tem dois metros aqui a trás mas tem um telhado, de frente e tem atrás.

No futebol você acredita que Beltrão pode voltar pra 1ª divisão?
Eu acredito que pode voltar também sim, desde que o comércio dê um apoio e você sabe que pra manter um time depende de bastante despesas e quando eu tava lá junto com o Osmar umas horas nós estava falido, o Osmar tinha 90% e eu tinha 3% e daí eu tive que dizer pro Osmar, vamos fazer assim, “somos tudo parente” no ano de 68, aí o que você quer? Primeira coisa eu vou comprar aqui, o Vilson ……… segunda coisa, você não pega mais 1000 reais num fim de semana aqui porque depois segunda nós temos que pegar 1000 pra pagar as duplicatas e se pega 1000 pra pagar os coisas e o jogador que chega de rancho aqui na base só no papo e daí naqueles 200 e poco mil pagando juros no ano de 68, ai mudamos, abrimos o rancho……. com cavalo pra falar a verdade e nós tinha mais ou menos 600, 700 rancho aí … Zaqueti, abrimos né e começamos a trabalhar. No ano de 70 eu disse Osmar nós vamos te comprar o estoque, eu e o Antônio, porque ele tinha uma cota também, e ele sim, vendemos sim.

Quando foi em 72 nós estamos prontos pra comprar o estoque, não agora eu não vou te vender mais, mas tudo bem, deixamos sem dívida, assim sem ser duplicata, sem juros, tinha acabado todo o dinheiro, aquele a juro eu tinha devolvido e tava com a duplicata normal, depois o sobrinho dele falecido achou que a coisa, a gente “comprava ….. e ele pegava e comprava três, quatro e daí entrava no juro e depois faliu praticamente. Então ali a gente peleou pra depois ele “bancou o espertinho também”, tinha condições de pagar.

JdeB – Mas desde aquele tempo o futebol já era caro?
Nildo – Meu Deus do céu, era caro. O Osmar perdeu, no dia de hoje seria mais de um milhão porque desde o clube que hoje é Barra Preta e Barro Preto se juntaram tudo ali, por exemplo. Naquela época ficou 17 milhões pra receber da construção. Telhado que foi posto primeiro ali de zinco nossa, “não ganhamos” um centavo daquilo ali, ali tem muita coisa que ficou ali, quem que pagava que não tinha dinheiro, não recebi nunca, mas foi um monte de dinheiro e ele aguentou porque situação tava … se fosse mais um pouco estava falido, nós não ia sobrar nada da copa também. Aquela vez não que foi melhor que as outras, não, mas que segurei as pontas e tive que falar aquilo que eu não podia falar, não tinha o direito de falar porque você tem 90% e eu tenho 3% o que eu mando aí? “Não podia dizer fico quieto mas também não podia meter o bico” porque poderia dizer assim né, mas ele não, ele catou e daí eu comecei a controlar.

E a seleção brasileira?
Olha, se ele botar vontade, tem condições de ganhar.

Tem medo das manifestações?
Não, tenho até visto aí. Algum torce até contra, não sei, tem uma pessoa ali que não dá pra entender, se você der carne, comida boa, coisa de primeira, ainda não tá bom (risos). 

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