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Francisco Beltrão
sábado, 07 de junho de 2025

Edição 8.221

07/06/2025

Entrevista com Algemiro Luiz Liston

 

Quando a família de João Liston e Brígida Fabris Liston mudou de Ibiraiaras (RS) para o Paraná, em julho de 1950, Algemiro, o antepenúltimo dos nove filhos, era um adolescente de 14 anos. Agora, aos 76, comemorados sexta-feira, 13, com grande festa pelo recebimento do título de cidadão honorário beltronense, ele completa 62 anos de Marrecas e Francisco Beltrão.

O título é um reconhecimento não só pelo tempo que viveu aqui, mas por seu espírito sempre otimista e empreendedor. Ao ser perguntado sobre o melhor período desses 62 anos, ele responde “sempre”. Ele teve a sorte de ver seus quatro filhos seguindo sua profissão de empresário. Eles têm condição de administrar sozinhos as muitas empresas espalhadas por várias cidades do Paraná, mas o pai não deixa de supervisionar. Aos 76 anos, continua com uma rotina de compromissos. Até mesmo para uma entrevista como esta o tempo é limitado. Após meia hora de gravação, o celular toca: é uma arquiteta que vem verificar um novo prédio que ele está construindo no centro da cidade.

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Seu registro de nascimento é de 13 de julho de 1932, em Ibiraiaras, hoje município, mas naquele tempo pertencia a Lagoa Vermelha.

De seus oito irmãos, o primeiro (Miguel), o terceiro (Amadio) e o quarto (Agenor) faleceram em Beltrão; o segundo, Modesto, reside em Medianeira; a Nair, o Adelar, ele (Algemiro) e o Cláudio continuam em Beltrão; a penúltima (Madalena) reside em Pato Branco.

Algemiro casou em 1964 com Sueli De Negri Liston, a mãe de seus quatro filhos: Flávio, casado com Alceni Kock, tem dois filhos (Flávia e André), reside em Curitiba e administra três empresas: a Unipeças e duas lojas da Dispeçal; Jackes, casado com Ronise Ricker, tem um filho (João Vítor), reside em Foz do Iguaçu e administra três empresas: a Interpeças, a Asupel de Foz e a Asupel do Paraguai; Rafael, casado com Dalila Marcon, tem um filho (Matheus), reside em Francisco Beltrão e administra duas empresas: Lismotor e Dispeçal; e Algemiro Luiz Liston Júnior, casado com Fabiana Destro, não tem filhos, reside em Cascavel onde administra duas empresas: Asupel e Liscar.

 

JdeB – Dos seus 76 anos, tem 62 de Francisco Beltrão. O que o senhor lembra de quando chegou aqui?

Algemiro – Eu lembro que pra se locomover daqui a Rio do Mato você tinha que passar pela ponte do Rio Santa Rosa, o Rio Tuna não tinha ponte.

 

JdeB – E vocês moravam lá?

Algemiro – Sim, nós morávamos lá. Nós fomos lá pra serraria.

 

JdeB – Como é: os Fabris trouxeram os Liston ou os Liston trouxeram os Fabris?

Algemiro – Os Fabris vieram na frente. Eram sócios lá do Guerino e do José Fabris, e daí nós pegamos a parte do Guerino Fabris da serraria e ficamos sócios do José. Durou uns 20 anos a sociedade.

JdeB – E aí serrava…?

Algemiro – Só pinheiro. Nós vendia em União da Vitória, Curitiba, Erechim, Passo Fundo…

 

JdeB – E logo que o senhor chegou, aos 14 anos, o senhor fazia o quê?

Algemiro – Eu fui direto trabalhar na serraria. Na serraria trabalhava de carregar madeira ou luvista, essa parte assim. Fazia um pouco de tudo.

 

JdeB – E era puxada a jornada?

Algemiro – Ah, era mesmo, às vezes das quatro até as oito da noite sem parar (risos).

 

JdeB – Como assim?

Algemiro – Das quatro da manhã. Tinha que começar cedo.

 

JdeB – E só uma hora pra almoçar?

Algemiro – É, só uma hora pra almoçar.

 

JdeB – O senhor ajudou no mato também?

Algemiro – Ajudei. Arrastava de bolsas assim, o que a gente limpava.

 

JdeB – E quando alguém chegava pra serraria, qual era o trabalho mais simples que se oferecia para essa pessoa?

Algemiro – O mais simples? Mas olha, praticamente não tinha (risos), porque era tudo pesado. Geralmente era assim de levar, carregar, empilhar madeira.

 

JdeB – E depois, quando já ia pegando experiência?

Algemiro – Daí nos finais de semana carregar os caminhões, carregava uns cinco ou seis caminhões.

 

JdeB – E aquele trabalho mais simples era o que menos ganhava, mas depois quem quisesse ganhar um salário melhor tinha que trabalhar no quê?

Algemiro – Tinha que ser serrador.

 

JdeB – E depois de empilhar madeira, o senhor fez o quê?

Algemiro – Ah, ia fazer fogo no locomóvel ou senão ia pro mato.

 

JdeB – Ia no mato cortar pinheiro?

Algemiro – Cortar não, ia pra puxar com os bois, e depois carregava o caminhão.

 

JdeB – Falam que a madeira, pra não carunchar, tinha que ser cortada na minguante.

Algemiro – Não, nós banhava ela. Cortava todo o dia, e ia pro banho.

 

JdeB – E era pra exportação?

Algemiro – Sim, era pra exportação. Tinha que ser madeira boa e aproveitava só uma parte do pinheiro, o resto apodrecia, tinha que deixar.

 

JdeB – E a terra era de vocês ou compravam os pinheiros?

Algemiro – A terra era nossa automática, porque se comprava títulos. Se você tinha um título, o que tava ali era teu. Só legalizou depois que veio o Getsop, porque antes era de quem tinha título. Nós cortava da nossa, das dos outros.

 

JdeB – E quando cortava dos outros como é que pagava?

Algemiro – Ah, na época eles não cobravam. Eles davam o pinheiro de graça pra limpar a terra.

 

JdeB – E o transporte era complicado?

Algemiro – É, transporte era bem complicado. Quando nós chegamos, tinha só três caminhão que tavam no mato. E daí que fomos comprando sete ou oito caminhão, puxava pra fora.

 

JdeB – O senhor falou que quando chegaram no Santa Rosa não tinha ponte.

Algemiro – Não. O caminhão passava dentro do rio.

 

JdeB – E quando o rio enchia?

Algemiro – Ah, daí não passava (risos). Depois eles fizeram uma ponte, daí nós passávamos, numa ponte baixinha, mas dentro do rio, porque se chovesse não dava.

 

JdeB – Qual foi a primeira impressão que o senhor teve, ao chegar aqui, vindo diretamente de Ibiraiaras?

Algemiro – Eu não gostei, pelo menos quando eu cheguei aqui não. Eu queria voltar (risos).

 

JdeB – Por que voltar?

Algemiro – Ah, às vezes, porque a gente era acostumado na infância no meio dos amigos, daí ter que chegar aqui e era só mato…

 

JdeB – E demorou muito pra se acostumar com a terra?

Algemiro – Não, a gente já foi formando os amigos aqui, daí já começou a gostar daqui.

 

JdeB – E quem são os seus amigos de Beltrão daquele tempo?

Algemiro – Daquele tempo? Ah, hoje tem poucos (risos), porque uns saíram, outros ficaram (risos). Mas com o tempo a gente foi fazendo novas amizades.

 

JdeB – E o senhor era bem caseiro ou costumava andar por aí?

Algemiro – Não, eu nunca fui caseiro. Eu conhecia tudo por aqui.

 

JdeB – Era de fazer festa?

Algemiro – Sim. Ah, mas todo o final de semana nós íamos pra qualquer lugar, qualquer vila, no interior nós tava sempre.

 

JdeB – Hoje Beltrão se destaca, mas naquele tempo as comunidades não eram umas maiores do que as outras.

Algemiro – Não, não tinha muita diferença, as comunidades eram pequenas.

 

JdeB – E por que é que escolheram Beltrão?

Algemiro – Por causa da serraria. Nós compramos uma serraria no Rio do Mato e acabamos ficando por aí.

 

JdeB – E a concorrência como era? Porque tinha bastante serrarias naquele tempo, não é?

Algemiro – É, tinha aqui na gleba do Getsop, tinha cento e poucas serrarias, acho que era 108 serrarias. E sobreviveram poucas.

 

JdeB – Mas por que umas duraram pouco?

Algemiro – Porque a madeira não valia nada. A gente trabalhava, trabalhava e trabalhava e não ganhava quase nada.

 

JdeB – E o transporte era caro?

Algemiro – O transporte era complicado, que se você levava uma carga de madeira daqui até Curitiba, dava Cr$ 700 ou Cr$ 800, que era cruzeiro na época. Sobrava pouco.

JdeB – E quebrava bastante caminhão?

Algemiro – Quebrava, porque era tudo estrada de chão.

 

JdeB – Encontrava fácil motoristas pra caminhão?

Algemiro – Motoristas sim. Ah, tinha que ir trocando.

 

JdeB – O senhor não chegou a dirigir um caminhão?

Algemiro – Sim, sim. Transportei também. Fui motorista.

 

JdeB – E na propriedade, vocês tinham alguma outra atividade?

Algemiro – Ah, nós plantava e também criava gado.

 

JdeB – E o que é que fazia na área que tinha sido tirado o pinheiro?

Algemiro – Nós derrubávamos, fazia lavoura, plantava milho. Nós pegamos uma área bem grande de terra.

 

JdeB – E depois, por que é que terminou a sociedade?

Algemiro – A sociedade automaticamente ela é boa até que dá, né (risos). Porque depois nós tinha duas serrarias, daí eles ficaram com uma e nós ficamos com a outra.

 

JdeB – E vocês serraram até terminar os pinheiros?

Algemiro – Até terminar tudo os pinheiros.

 

JdeB – E naquele tempo tinha o seguinte: ou você reflorestava ou pagava pra reflorestar. O que é que vocês faziam?

Algemiro – Naquele tempo era exatamente isso, teve um tempo que a gente teve que pagar pra reflorestar. Nós, por exemplo, de início, pagamos para reflorestar. Depois nós mesmo que reflorestava.

 

JdeB – E daquele reflorestamento o que é que deu?

Algemiro – Acabamos vendendo, porque não tinha valor.

 

JdeB – Era mais prático reflorestar ou pagar pra reflorestar?

Algemiro – Era mais prático pagar.

 

JdeB – E o seu pai gostava mais do quê?

Algemiro – Ah, meu pai não trabalhava automaticamente. Ele ficava mais só em casa.

 

JdeB – Era o Miguel, então, o seu irmão mais velho, que tocava?

Algemiro – É, ali era o Miguel. Depois passei eu a tocar.

 

JdeB – E quando o senhor deixou da serraria, construiu o hotel?

Algemiro – Não, nós ainda tínhamos a serraria quando construímos o hotel.

 

JdeB – Então, do que o senhor fez na serraria, uma parte tá na cidade hoje?

Algemiro – É, depois eu parti pro ramo de autopeças e aí eu fui incrementando. E fui abrindo em Cascavel, Curitiba, Foz do Iguaçu, e foi se espalhando. Teve uma época em que eu tinha 14 lojas.

JdeB – O senhor sempre foi de construir, investir em coisas novas. De onde veio isso? Porque o seu pai não era assim.

Algemiro – Não, ele não era assim. Veio por conta própria. Eu terminei agora uma construção no Paraguai muito grande, nossa! Eu investi lá também. E quando eu terminei lá, já comecei aqui.

 

JdeB – Tem gente que tem medo de fazer investimento, mas o senhor sempre acreditou?

Algemiro – Eu sempre acreditei. Às vezes alguma coisa dá errada, mas geralmente dá certo.

 

JdeB – E como foi o seu casamento, o senhor encontrou a mulher certa?

Algemiro – Sim, eu encontrei a mulher certa. Eu morava no Rio do Mato e ela morava em Nova Concórdia. E daí a gente se conheceu por lá.

 

JdeB – Casaram logo?

Algemiro – Não, levamos uns quatro ou cinco anos.

 

JdeB – E como foi a festa do casamento?

Algemiro – Ah, foi bem bom. Nós fizemos aqui no hotel, que eu estava construindo.

 

JdeB – E qual era o plano que o senhor tinha com os filhos?

Algemiro – Bom, eu comecei a pensar que eles poderiam ser, inclusive o mais velho, que eu fiquei com a ideia de fazer administração, pra tocar as coisas certinhas. E daí todos eles fizeram administração, pós-graduação e tudo, estão todos no ramo.

 

JdeB – O senhor teve sorte, é difícil encontrar uma pessoa assim, um homem com quatro filhos e os quatro seguiram a profissão do pai.

Algemiro – Sim, é verdade. E tão indo bem, cada um cuida do setor dele. O de Cascavel cuida de duas lojas, o de Foz do Iguaçu cuida de quatro lojas, o de Curitiba, três.

 

JdeB – E os netos?

Algemiro – É, os netos tão vindo. Mas eu tenho a impressão de que não vão seguir o mesmo caminho. Acho que não, as coisas mudam.

 

JdeB – Hoje o senhor voltaria pra cidade onde nasceu?

Algemiro – Não. Eu volto lá só pra passeio. Eu tenho amigos lá, parentes também. E inclusive a residência eu construí fora do centro, além desse apartamento em Foz e em Curitiba, mas a residência fixa é em Beltrão.

 

JdeB – E como o senhor recebeu esse título de cidadão honorário?

Algemiro – Ah, eu não sei se eu merecia esse título (risos). Mas foi muito gratificante.

 

JdeB – Mas 62 anos de município, são poucos que têm.

Algemiro – É, são bem poucos. E quando eu cheguei aqui, não era nem município, era Marrecas.

JdeB – E desses anos todos, qual foi o melhor tempo pro senhor aqui em Beltrão?

Algemiro – O melhor tempo? Sempre.

 

JdeB – Sempre foi bom?

Algemiro – Sim (risos).

 

JdeB – Mesmo quando tinha crises?

Algemiro – Mesmo tendo crises. Porque a gente nem pode falar em crise, a gente tem que saber administrar. É claro que tem altos e baixos, não é nada fácil, mas depende da pessoa tocar o negócio.

 

JdeB – Qual a sua escolaridade?

Algemiro – Até o terceiro ano lá no Rio Grande. Parei de estudar porque comecei trabalhar, e nas serrarias não dava mais tempo pra estudar. Porque naquele tempo não se falava em estudar, era só trabalhar.

 

JdeB – E como é que o senhor aprendeu a administrar tão bem, e viver tão bem?

Algemiro – A experiência.

 

JdeB – A escola da vida também é boa?

Algemiro – Sim, é boa.

 

JdeB – E em Beltrão, nestes 62 anos que o senhor está aqui, qual foi o melhor tempo?

Algemiro – Eu acho que nós estamos passando agora o melhor tempo. O crescimento está muito grande, tem muito aprendizado aqui, e aqui é mais valorizado do que qualquer lugar.

 

JdeB – E qual foi o tempo mais difícil de Beltrão?

Algemiro – O mais difícil foi em 56 e 57, que parou o município por causa das companhias. Muitas famílias foram embora, outras abandonaram tudo, e a cidade parou com isso.

 

JdeB – Deu prejuízo para a serraria também ou vocês continuaram trabalhando?

Algemiro – Ah, deu prejuízo, porque as companhias pegavam 30% sem fazer nada, iam lá e carregavam, só. Encostavam os caminhões no pátio da serraria e carregavam o que eles queriam.

 

JdeB – Eles levavam 30% alegando o quê?

Algemiro – Alegando que os pinheiros eram deles. Eles iam lá e viam que a gente serrava tantos pinheiros e 30% pegavam. Mas eles não davam satisfação nenhuma, iam com 10 ou 12 pistoleiros e carregavam a madeira.

 

JdeB – Que clima!

Algemiro – É um clima da pesada mesmo. Mas nós continuava no mesmo ritmo, eu acho que durou uns cinco ou seis meses eles fazendo tudo isso.

 

JdeB – E quando deu o movimento, vocês apoiaram?

Algemiro – Sim, nós apoiava, é claro, nós estava na frente, era os cabeças, acompanhando tudo.

 

JdeB – O senhor chegou a vir a Beltrão?

Algemiro – Mas direto, não parava. Desde a primeira noite.

 

JdeB – Falam que, naqueles dias que Beltrão estava tomado de gente, um dos grandes méritos das lideranças foi negociar pra que não tivesse mortes.

Algemiro – Sim, porque tinha mais ou menos umas 3 mil pessoas aqui. E tavam tudo armado, porque quem não tinha arma, vinha com garfo, vinha com foice, com facão. E foram tirando a companhia. Só que o governo apoiava, daí voltou em Beltrão e se acampou tudo, que tinha o quartel, eles (os moradores) foram tudo lá pro lado da Cango, não ficou mais ninguém aqui na cidade, que eles vieram e ficaram ali no Suplicy.

 

JdeB – Isso foi quando veio a polícia do Estado, depois da revolta?

Algemiro – É, quando tinha voltado jagunço novamente, a polícia do Estado com os jagunços. E depois correu tudo em paz, tranquilizaram tudo, depois veio o Getsop que legalizou as terras. E daí sim, quem tinha os documentos era o dono da terra.

 

JdeB – E o senhor veio armado também?

Algemiro – Ah, mas eu tinha dois ou três caminhões só puxando gente, pra dar comida pra esse pessoal todo. Pegamos das duas ou três padarias, e o restante nós ia buscar gado, entrava nas fazendas e pegava, era umas 10 a 20 cabeças de gado por dia. E foi por vários dias. E tinha que dar comida.

 

JdeB – E o senhor usava o que, um revólver?

Algemiro – Eu? Mas dois ou três (risos).

 

JdeB – Deu muito tiro?

Algemiro – Demos muito tiro, nossa! Eu partia do Rio do Mato pra Cabeceira, e um avião tava sempre lá, quando nós ia de caminhão, e eu tinha uma 12, puxei a 12 carregada com baletão e atirei. Mas nunca mais apareceu. Não sei se derrubava, mas atirava, pelo menos dava pra furar.

 

JdeB – Acertou no avião?

Algemiro – Acertei sim, e daí desapareceu, nunca mais eu vi.

 

JdeB – E de quem era o avião?

Algemiro – Era da companhia, da Citla. Ele aterrissava aqui no aeroporto, porque o aeroporto era deles. Eles tinham todo o armamento lá.

 

JdeB – O senhor fazia muita caçada naquele tempo?

Algemiro – Ah, fazia sim. Se você saísse ali pra voltar em uma hora ou duas, você voltava com um monte de caça, o que aparecia a gente atirava. Tinha muito bicho. Tinha paca, tinha veado, cutia, tinha de tudo.

 

JdeB – Onça também?

Algemiro – Não, onça até que nós não vimos. Nunca encontramos.

 

JdeB – Caçavam e vocês mesmo preparavam ou passavam pras mulheres?

Algemiro – Ah não, nós limpava e entregava, daí eram elas que faziam.

 

JdeB – E o senhor era bom no tiro?

Algemiro – Opa (risos). Eu usava espingarda 36. Pra qualquer bicho, tanto fazia, porque não eram pequenos, e não tinha nada muito grande. Passarinho também.

 

JdeB – Qual era o passarinho que mais caçava?

Algemiro – Aqui era nambu e tucano. Você voltava com uns 10 ou 20, numas duas horas.

 

JdeB – E daquela primeira eleição, do Rubens e o Cella, em 52?

Algemiro – Isso foi uma coisa triste que aconteceu.

 

JdeB – Por quê?

Algemiro – Porque nós puxava eleitor de lá pra vir votar aqui, mas eleitor era pouco. E aí, depois de elegido o prefeito, o Cella, um amigo meu falou pra mim “vai mudar, vai ficar o dr. Rubens prefeito”. Eu falei “para, rapaz!”. E eu só tinha um relógio, não tinha dinheiro e apostei o relógio e perdi. Porque 40 dias depois veio o Tribunal e deu ganho pro Rubens. Só que naquela época era lá em cima, mandava, desmandava, fazia o que queria.

 

JdeB – E as festas daqui da cidade sempre foram boas?

Algemiro – Sempre foram boas. Nós fomos festeiros várias vezes aqui, fazia promoção, rifa, nós ia vender até em Salto do Lontra, toda a região, e as festas davam boas. Nós necessitava muito gado, mas nós não comprava, ganhava. Fazia rifa de um carro e vendia as cartelas no interior.

 

JdeB – E o Frei Deodato, o senhor conheceu bem ele?

Algemiro – Conheci. O Frei Deodato foi um guerreiro aqui, ele ia daqui no Rio do Mato a pé, ele sempre foi a cavalo, mas muitas vezes ia a pé. Conversei quantas vezes com ele, nós vinha buscar ele de caminhão. Ele tinha todas as capelas do interior, ele fazia tudo sozinho e sempre de bom humor!

 

JdeB – Vocês vendiam madeira pra Cango?

Algemiro – Não. A Cango tinha a serraria dela.

 

JdeB – E aí uns falam que era burocrático, demorava vir o dinheiro, atrasava salário, mas mesmo assim a Cango teve um papel importante aqui?

Algemiro – Fez um papel importante. Ah sim.

 

JdeB – O senhor conheceu os administradores, quando chegou aqui era o dr. Suplicy.

Algemiro – Conheci. Ele pra Beltrão foi importante. A Cango que ligava toda a região ali, as estradas que fazia, tudo.

 

JdeB – O senhor é católico, vai na missa ainda?

Algemiro – Vou.

 

JdeB – Uma vez era obrigatório todo domingo, e agora como é?

Algemiro – Agora é um domingo sim e o outro também (risos).

 

JdeB – Como é que o senhor vê Beltrão hoje, com o curso de Medicina?

Algemiro – Isso é um grande avanço pra cidade. Vai ser muito bom pra região. Foz do Iguaçu tinha uma campanha, todos os carros, uma logo e coisa, a associação comercial toda envolvida pra que conseguissem o curso. Eu saí lá de Foz, vi que tava na cidade o Beto Richa, e quando eu desci já foi comunicado que eles tavam aqui pra lançar o curso de Medicina em Beltrão. Então, Foz perdeu. Uma cidade que nem Foz do Iguaçu perder o curso de Medicina pra Beltrão, isso tudo é política, mas pra Beltrão isso é muito bom.

 

JdeB – E o senhor pretende empreender muito ainda?

Algemiro – Ah sim, a gente nunca mais quer parar. Agora vamos terminar esse prédio ali, depois eu vou pensar no que vou fazer, vou reformar o hotel, fazer mais um andar, um estacionamento.

 

JdeB – A demanda do hotel está grande?

Algemiro – É, tá cada vez maior. É que a gente construiu ele em 64 ou 65, e estamos investindo sempre. Na época, eu pretendia construir uma rede de hotéis, depois eu saí logo com essas lojas, daí parei com o hotel. Construí em Cascavel, Foz do Iguaçu e Curitiba, e construí o hotel. Mudei completamente de ramo.

 

JdeB – E o que o senhor diz para os jovens? Se o senhor fosse jovem hoje, voltaria a ser um empreendedor?

Algemiro – Eu acho que eu seria mais empreendedor ainda.

 

JdeB – Mesmo do jeito que está o mundo aí, o senhor continuaria investindo?

Algemiro – Sim, eu continuaria. Porque o que você não pode é pensar que a crise só vai te atingir, que você tem que parar, porque se for pra pensar só isso, nós não investimos mais. Eu vejo pessoas que param com 50 anos, que não querem mais investir, mas cada um tem um objetivo. Eu acho que não pode parar.

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