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Francisco Beltrão
sábado, 07 de junho de 2025

Edição 8.221

07/06/2025

Entrevista com Ego e Edir Cattani

Desde criança, em Caçador (SC), onde nasceu, todos conhecem por Êgo, ou Nego, mas o nome é Domingos Cattani. É o segundo dos 14 filhos de Ermelindo e Ana Strapasson Cattani – Januário (falecido), Domingos, Inês, Orlando, Antoninho, Lúcia, Sérgio, Ivalides, Naturino, Terezinha, Ataliba (falecido), Salete, Oliva e Celito.

Domingos sempre foi ligado a empresas de ônibus. Antes de casar, no ano de 1961, em União da Vitória, já era motorista de ônibus. No começo, sem documento, percorria “os matos” do Sudoeste. Depois que tirou a carteira, passou a fazer a linha Joaçaba-União da Vitória. Em 1965, estabeleceu-se em Francisco Beltrão e diz que não pretende sair daqui.

Domingos nasceu em 10 de novembro de 1936, está com 75 anos e continua na lida diária da empresa de ônibus, junto com a esposa Edir Schwartz Cattani, a mãe de seus três filhos – Reinaldo, Joelson e Diego Paulo -, que já lhe deram seis netos (contando um que nasce em setembro). A Cattani Sul Passageiros, Cargas e Turismo, criada em 1997, é em sociedade com Dilma Cattani (viúva do Januário), Gilson Dal Ponte e Neide Portella (viúva do Ataliba).

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Nesta entrevista, Êgo fala dos tempos que os ônibus andavam devagar, em estradas de chão, mas sempre superlotados. Tempo que motoristas faziam muita coisa e se mantinham sempre em forma, com muita força nos braços e pouca barriga pra carregar, porque, ao contrário do conforto de hoje, tinham um dia a dia mais cheio de tarefas, muitas pesadas, e menos monotonia.

 
 
Ego e Edir Cattani: juntos desde 1961, quando casaram em União da Vitória, e em Francisco Beltrão desde 1965.

 

 

JdeB – Como era a linha de Joaçaba a União da Vitória, no tempo que conheceu a Edir, sua futura esposa?

Êgo – Naquela época saía de Joaçaba num dia, dormia na União da Vitória, no outro dia descia de volta, era tudo estrada de chão, terra, barro. E fazia aquela baldeação no Horizonte, o passageiro vinha pra cá e ia pra lá. Tudo pinga-pinga. O motorista fazia tudo. O Caçador tinha cobrador, mas aquela linha não tinha, era só eu mesmo.

 

JdeB – Começou cedo no volante?

Êgo – No volante em 56, que eu tirei a carteira. Antes dos 20 anos eu dirigia aqui no mato, que não precisava ter nada. Fazia Pato Branco a Barracão, Pato Branco a Pranchita. Aqui podia trabalhar sem carteira.

 

JdeB – Não tinha fiscal?

Êgo – Não tinha ninguém.

 

JdeB – Quem o ensinou a dirigir?

Êgo – O meu tio Domingos. Naquela época o ônibus era um pouquinho maior que uma caminhonete. Era um Chevrolet, a gasolina. Gastava bastante.

 

JdeB – Não fez muita barbeiragem quando aprendeu?

Êgo – Não, não. Nunca tombei um ônibus, nunca bati. Essa estrada aí era quase só ônibus que passava.

 

JdeB – Mas logo que chegou em Beltrão teve uma batida de ônibus.

Êgo – Não, teve, com o quartel que bateu numa escolinha que sai pro 20, numa estrada velha. O quartel tava errado, o ônibus tava na mão dele. Subiu em cima do capô. A caçamba do quartel bateu no ônibus. Uma batida feia.

 

JdeB – Dia 3 de janeiro de 66?

Edir – É, mais ou menos. Machucou umas quantas pessoas e dois acho que morreu.

 

JdeB – No tempo que fazia a linha Joaçaba-União da Vitória, o senhor pernoitava em União da Vitória. Foi lá que o senhor conheceu a dona Edir.

Êgo – Um dia pernoitava em União da Vitória, um dia em Joaçaba.

Edir – Ele me deu carona pra ir pra casa. Eu trabalhava no fórum e ele parava no hotel na frente. Quando eu saía, a gente se olhava e foi aquele clima, como dizem agora, né (risos). Um dia ele foi conversar comigo, se podia me levar pra casa. Nós nos conhecemos, namoramos um ano e pouco e casamos.

 

JdeB – E foram morar aonde?

Edir – Nós viemos direto a Pato Branco, onde moramos um tempo. E dia 30 de dezembro de 65 viemos pra Beltrão e daqui só praquele dos pés juntos.

 

JdeB – E o tempo de Pato Branco, como é que foi?

Edir – Foi bom também, só que lá eu não trabalhava, trabalhei aqui na firma.

 

JdeB – E a senhora gostou de Beltrão?

Edir – Adorei Beltrão, nossa, daqui pra sair não tem jeito.

Êgo – Só no caixão.

 

JdeB – E de União da Vitória a senhora gostava?

Edir – Sim, eu nasci e me criei lá. Eu sai de lá com 19 anos, e faz 51 que nós somos casados. Então é tempinho. Aqui é bom de morar, eu gosto de Beltrão.

 

 
Ônibus que fazia Nova Prata-Francisco Beltrão.

JdeB – O que foi de Beltrão que cativou a senhora?

Edir – Eu acho que o pessoal. A gente conhece Deus e todo mundo… A gente sai, para meia hora em cada esquina, porque encontra um, encontra outro conhecido pra conversar. E gostei mesmo.

 

JdeB – Então essa recepção que o beltronense fez aos vestibulandos de Medicina, agora, já é característico daqui, sempre foi um povo hospitaleiro?

Edir – Sempre, toda a vida, bacana mesmo.

 

JdeB – Vamos voltar no tempo, qual foi a viagem mais difícil que o senhor fez naquele trecho de Caçador a União da Vitória?

Êgo – Já fiz bastante viagens tristes, terra pura, só chão, se é morro, acorrentava cinco correntes. Era difícil.

 

JdeB – E o horário não era essa pontualidade de hoje, dependia do tempo?

Êgo – Não, não. Tudo dependia do tempo.

 

JdeB – O pessoal gastava mais tempo esperando no ponto.

Êgo – É. Nós parava até caçar na estrada. Dava aquela garoazinha e tu ia com a espingarda, se você não atirava, o passageiro pegava a espingarda e “tou”, era de matar até 15 codorna numa viagem.

 

JdeB – Parava o ônibus pra caçar?

Êgo – Pra caçar codorna. E os fazendeiros eram tudo conhecidos.

 

JdeB – E aí guardava pra depenar em casa?

Êgo – Depenava lá no hotel. Fazia passarinhada, a dona Alzira e o seo Tiagão que tavam no hotel, eles esperavam todo o dia que eu chegasse lá pra almoçar com eles. No Hotel Flórida. Almoçava lá.

 

JdeB – E domingo não viajava?

Êgo – Não domingo eu ficava em Joaçaba.

 

JdeB – Ah, ficava na casa dos pais?

Êgo – Não, meus pais moravam ali em Caçador, e Joaçaba era fora de mão.

 

 

 
Motorista Otávio, que fazia Beltrão-Dois Vizinhos.

JdeB – E  por que veio de mudança pra Pato Branco?

Edir – Nós casamos e viemos direto pra cá.

Êgo – Nós fretamos um caminhão porque compramos móveis tudo lá em União da Vitória.

 

JdeB – E quando chegou aqui continuou como motorista de ônibus?

Êgo – Pouco tempo, e depois entrei de chefe de oficina na mecânica em Pato Branco. Eu entendo um pouco de mecânica.

 

JdeB – No seu tempo de motorista tinha que consertar o ônibus também quando quebrava?

Êgo – Tinha que consertar, claro. Tinha que entender, e aquela época nós limpava o ônibus por dentro e por fora, não tinha cobrador. Não mandava lavar no posto, nós mesmos lavava, cada um lavava o seu. Naquela época tinha que fazer tudo.

 

JdeB – Lavar o ônibus, cobrar as passagens, guardar as malas…

Êgo – Guardar as malas, fazer tudo.

 

JdeB – Naquele tempo guardava a mala inclusive em cima do ônibus. Não acontecia de perder malas?

Êgo – Não, nós amarrava bem, tem uma lona.

 

JdeB – Voltando agora ao tempo que vocês chegaram a Beltrão, em 65, comparando com hoje.

Êgo – Naquela época tinha pouca coisa. Na cidade tinha o Júlio Opolski, que era a seção de peça dele. Lá em cima tinha Baldoíno Daros, também com seção de peças. No dia de chuva, na casa que nós morava a veneziana era de madeira e tinha algumas quebradas, a gente ficava olhando eles passarem na rua pra dar risada, porque caíam no barro.

 

JdeB – Mas na avenida estava começando o calçamento?

Edir – Eles começaram depois, bem depois. Porque a igreja tava no morro. Depois eles foram rebaixando até a altura que está agora. A praça era a mesma altura da igreja.

Êgo – E quem tirou aquela foi o Deni. A rodoviária era lá em cima no hotel do Liston.

 
Balsa do Iguaçu, na linha Francisco Beltrão-Medianeira.

 

JdeB – E que linhas vocês tinham?

Êgo – Nós tinha Caçador, Palmas, Capanema.

Edir – Laranjeiras, Dois Vizinhos.

Êgo – Não, primeiro tinha pra cá. Porque Laranjeiras nós compramos mais tarde. Capanema tinha época que o motorista levava dois dias pra ir lá e voltar aqui. Subia aquela serra do Capanema puro barro, fazia aquele pelotão.

 

JdeB – E acontecia muito acidente?

Êgo – Não, não acontecia. Não acontecia porque o máximo que o ônibus ia era cair na valeta e pegava trator pra tirar, ou junta de boi.

 

JdeB – Naquele tempo dava menos acidente porque corriam menos, é isso.

Êgo – Corria menos e não tinha movimento de carro pequeno, não tinha, era pouco.

 

JdeB – Nós estamos vivendo uns dias de protesto contra as mudanças da legislação. Esses anos todos o senhor já viveu algum período assim?

Êgo – Já.

 

JdeB – O pessoal acha que não dá pra adaptar a nova lei, teve alguma situação assim?

Êgo – Não, situação de lei não, os caras podiam viajar à vontade, hoje não querem que trabalhe mais, querem fazer o pessoal trabalhar pouco. E o pessoal não vai se adaptar porque a maioria quer comissão, porque eles ganham bem. Tem nego que não vai pagar o caminhão. Vai querer trabalhar só oito horas, 10 e parar. Sai daqui vai aonde? No dia Curitiba, e lá tem que parar, leva quase dois dias pra ir daqui a Paranaguá. E a carga tem que ir rápido porque senão não fatura.

JdeB – Vocês renovavam a frota com dinheiro próprio ou financiado?

Êgo – Naquela época era dinheiro, era tudo no dinheiro.

 

JdeB – Não tinha financiamento?

Êgo – Tinha, mas nós não financiava. Comprava sempre com dinheiro. Tudo à vista, mas hoje não, hoje tem que financiar tudo.

JdeB – Dava mais dinheiro aquele tempo?

Êgo – Bem mais.

 
Marmeleiro, em 1973, todos comemorando a chegada do primeiro ônibus leito da região, pioneiro no interior
do Paraná. Entre os presentes, Êgo Cattani, ex-prefeito Rigoletto Andreolli, médico Nelson Sandini, Alberto Cattani,
 Miguel Vivan, Ermelindo Cattani e o motorista Dalmolin.

 

JdeB – Por que a passagem era mais cara naquele tempo?

Êgo – É que tinha mais passageiros, hoje não tem. Cada um tem um ou dois carros, então essas linhazinhas curtinhas estão se acabando. Tudo dependia de ônibus.

 

JdeB – Todas aquelas malas que vocês carregaram, tiveram muitas vezes que indenizar alguém?

Êgo – Não, pouco. Naquela época, se eles viajavam, viajavam com roupa ruim, a mala deles era cheia de comida pra comer na viagem.

 

JdeB – A viagem demorava mais.

Êgo – Demorava mais e iam comer, parava ali e comia na beira da estrada.

Edir – Eu cansei de levar – que nós ia seguido pra União da Vitória, lá no Horizonte fazer baldeação – galinha com farofa, pão, pra comer na viagem, o leite pras crianças…

Êgo – Hoje não, hoje o pessoal para aonde quer, o cara não leva marmita junto, antigamente levava, fazia aquele monte de viagem pra Aparecida do Norte e pegava sete, oito ônibus tudo farofeiro, levava farofa pra comer.

 

JdeB – Ao invés de pegar linha curta, linha comprida é melhor?

Êgo  – É melhor. As curtas vão terminar todas.

 

JdeB – Por causa dos carros?

Êgo  – Sim, cada colono tem dois carros, convida o vizinho e vão pra cidade. E não pegam ônibus, vêm aqui e voltam rápido, e ônibus não, tem que vir e esperar o horário.

 

JdeB – No seu tempo de Caçador, seu pai já tinha ônibus?

Êgo – O meu pai foi cobrador do Km 30 a Caçador. Nós tínhamos um motorista uma semana, o meu pai de cobrador, uma semana tinha um tio meu, cobravam naquela linha “comprida”, 30 km.

 

JdeB – Como era a primeira linha que o senhor fez antes de vir pra cá, Pato Branco a Barracão?

Êgo – Pato Branco a Barracão. Nem estrada tinha, era só picado o carreirão, mas nós ia de Pato Branco cedo almoçar ali no Tateto. Depende o dia e se o tempo tava bom, chegava 7, 8 horas [da noite], e se chovia atrasava.

 

JdeB – Mas sempre chegou ou teve alguma vez que pousou na estrada?

Êgo – Não, pousei na estrada diversas vezes.

 

JdeB – Os passageiros dormiam no ônibus?

Êgo – É, dormiam ali. No Tatetos tinha aquela serra forte, enguiçava ali, atolava e descia tudo no hotel de volta. Pousavam no hotel.

 

JdeB – E a empresa pagava o hotel?

Êgo – Não, cada um por conta, tá loco, se for hoje tu tem que pagar.

 

JdeB – Porque hoje tem estrada, antes não tinha. Era como no tempo de Joaçaba-União da Vitória, ia num dia e voltava no outro?

Êgo – É, ia num dia e voltava no outro.

 

JdeB – Então, de Barracão pra Pato Branco tinha ônibus a cada dois dias?

Êgo – Um ia e outro voltava, eram dois.

 

JdeB – Sempre lotado?

Êgo – Sempre, sempre. Tomava café em Marmeleiro, se ia pra Pato Branco, ia tomar café ali.

 

JdeB – Saía de Pato Branco que horas?

Êgo – Às 6 horas. E chegava em Marmeleiro 8 horas. Tomava café e ia.

 

JdeB – De Marmeleiro a Tatetos ia até meio-dia?

Êgo – Até meio-dia. Era mais demorado.

 

JdeB – De Pato Branco a Marmeleiro a estrada era melhor?

Êgo – Naquela época não era tão boa.

 

 
As rodomoças, do primeiro carro leito Beltrão-Curitiba.

JdeB – Ali na serra de Renascença também sofria.

Ego – Deus o livre, corrente era direto. Naquela época a corrente era boa, no começo era bem temperada, e era tudo estrada de terra e a corrente geralmente estraga quando começam a largar cascalho, um pedaço era barro, um pedaço era cascalho, vai estragando daí.

 

JdeB – O senhor tinha prática de amarrar corrente?

Êgo – Ah, mas era pra já.

 

JdeB – Depois, com as mãos embarradas, tinha que pegar no volante. Tinha uma reserva de água pra lavar a mão?

Êgo – Não, não tinha, naquela época nem sabia que a gente podia levar água junto, lavava nas poças de estrada.

 

JdeB – Agora, comparando o motorista daquele tempo com o motorista de hoje, que hoje o motorista tem excesso de peso, problema de coluna, naquele tempo também tinha isso?

Êgo – Não, naquela época o motorista trabalhava dia e noite e não tinha problema, se fosse hoje estariam indo no sindicato toda hora.

 

JdeB – Naquele tempo não ficavam tanto tempo parados, dirigindo, que nem o senhor falou que de Joaçaba a União da Vitória eram 180 km e demorava nove horas, ficava quase mais tempo recebendo e entregando bagagem de passageiro do que dirigindo, porque hoje ele embarca aqui e vai a Curitiba direto, sentado.

Êgo- É, para pouco.

 

JdeB – E já tinha volante hidráulico no ônibus?

Êgo – Não, naquela época era tudo sempre duro, pesado. Hoje, se der um ônibus desse para um motorista ele nem quer, até porque não aguenta, parece até que são mais fracos, você acostuma com aquilo. A minha caminhonete é hidráulica, quando eu pego um outro carrinho pequeno, duro, é pesado, e o hidráulico não, é levianinho.

 

JdeB – A dona Edir disse que gostou muito de Beltrão. E o senhor, das cidades onde morou, qual mais gostou?

Êgo – Por enquanto, essa aqui. Caçador também eu gosto, Caçador é uma cidadezinha caprichada.

 

JdeB – O senhor volta seguido pra lá?

Êgo – É de vez em quando…

Edir – Cada duas três vezes por ano vai lá.

Êgo – Eu tenho uma terrinha em Caçador.

 

JdeB – Que mais história nós temos?

Êgo – Pra te contar, quando eu vim pra cá eu não conhecia, tinha um jipe, ali na avenida era tudo liso, e na época da [lua] crescente até o carro não derrapa muito, na minguante então a terra fica lisa, fica o chão liso, fazia cavalo de pau ali naquela avenida, o jipe não parava, era sem querer.

 

JdeB – Como é? Conforme a lua a pista fica mais lisa?

Êgo – Fica. Na crescente a terra cresce, pode ver.

 

JdeB – E aí não derrapa tanto?

Êgo – Não derrapa, e na minguante parece que desce pra baixo feito pedra, fica lisa, mas pode ver até hoje.

 

JdeB – A senhora sabia disso, dona Edir?

Edir – Não, essa não sabia, história do meu sogro, eu acho. Porque ele fazia tudo por lua,

 

JdeB – E a senhora teve período de ficar preocupada porque o marido não voltava, ficava na estrada?

Edir – Notícia ruim a gente sabe na hora, mas graças a Deus a gente sempre teve fé, nunca aconteceu nada.

 

JdeB – Na família nunca ninguém se acidentou?

Edir – Não, graças a Deus.

 

JdeB – Mas essa eu não sabia, da terra…

Êgo – Mas pode perguntar para as velharada aí sabe.

Edir – Os mais antigos.

Êgo – Na minguante acorrentava o ônibus ali e ia embora, daí ela não afundava, correntinha bem firme.

JdeB – E na crescente a corrente afunda mais?

Êgo – Afunda mais e patina mais.

 

JdeB – É diferente a terra daqui, de Pato Branco, Caçador, União da Vitória ou é a mesma terra?

Êgo – Não, é a mesma terra, a estrada não muda.

 

JdeB – Como é que controlava o tempo pra ver se ia chover?

Êgo – O tempo era só levantar e olhar, se anoiteceu e avermelhou o céu, naquelas nuvens vermelhas o nosso dia o tempo é bom, e se levantou e tá vermelho pode escrever que vai chover.

 

JdeB – E é melhor dia de chuva ou dia de muito pó?

Êgo – De pó é melhor, o pó pelo menos você vai, e dia de chuva fica atolado.

 

JdeB – E quando atolava, tinha trator pra puxar ou era boi?

Êgo – Era boi.

 

JdeB – E ai eles cobravam pra tirar o ônibus?

Êgo – Não, os colonos não cobravam. Nós tinha uma equipe em Barracão que nós descia pra Santo Antônio, tinha aqueles santinhos, pra puxar nós subia a serra de Barracão eles iam lá pra engatar com seis juntas, naquela época não tinha trator.

 

JdeB – Uma junta só não tirava?

Êgo – Ah, não tira. Antigamente era brabo ali.

 

JdeB – Aqueles que participaram da revolta também…

Êgo – Aquela revolta em 57 eu estava lá em Santo Antônio, daí fizeram aquela revoltona com os colonos, trancaram a saída e eu fiquei com o ônibus lá em Santo Antônio, e de noite vamos fazer o que tinha os Santin. Eu tinha arma, tinha um 38, vamos tomar a delegacia de Santo Antônio, fomos lá e tomamos a delegacia.

 

JdeB – Foi atirado no delegado?

Êgo – Não, não foi atirado. Foi atirado só pra cima, aqueles Santin tinham a Winchester, a melhor arma que tinha.

 

JdeB – E o senhor conheceu o Augusto Pereira, que era um dos líderes?

Êgo – Conheci, e lá era o Pedro Santin, o João Santin, o Adelino Santin, Ivo Santin, tem outro, não lembro o nome dele, o cara matou, ele ia a cavalo, os dois a cavalo, o cara passou a faca no pescoço do Santin.

 

JdeB – Naquele tempo da revolta o senhor fazia qual linha?

Êgo – Pranchita-Pato Branco, passando por Barracão. Até com pedaço de pau os caras iam de brabo que estava, ali antes de chegar na delegacia de Santo Antônio, pro lado de baixo na capoeira, ia só pra ver a negada indo mato pra baixo, se escondendo.

 

JdeB – Mas ninguém se machucou?

Êgo – Não, ninguém se machucou.

 

JdeB – Falam que o delegado saiu machucado.

Êgo – Naquele dia que eu fui, não.

 

JdeB – E aí liberaram o ônibus?

Êgo – No outro dia só. De noite foram naquele escritório do delegado do Lupion e tinham medo de entrar pensando que tivesse dinamite lá dentro, quebravam os vidros com a espingarda.

 

JdeB – Lá em Santo Antônio, o senhor presenciou isso?

Êgo – É, eu presenciei.

 

JdeB – Mas aqui em Beltrão o senhor não veio naquele tempo?

Êgo – Não, não.

 

JdeB – Mas ficou um dia preso…

Êgo- É, daí liberaram porque os jagunços correram tudo, fugiram pra Argentina.

 
Estrada de chão, todos desembarcam pra empurrar o ônibus.

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