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Francisco Beltrão
sábado, 07 de junho de 2025

Edição 8.221

07/06/2025

Entrevista com Gomercindo Sartor

Ajudou a construir Verê desde que era distrito de Pato Branco

 
 
 

Gomercindo Sartor está entre os pioneiros que chegaram no tempo em que Verê ainda era distrito de Pato Branco. Ele viveu, portanto, toda a história do município que neste mês de outubro comemora seu cinquentenário.

Natural de Caxias do Sul (nasceu em 24 de julho de 1931), viveu, com a família de 13 irmãos, também em Erechim (de 1932 a 1953), Curitibanos (53 a 57) e Videira (57 a 58). Chegou em Verê dia 16 de julho de 1958.

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Gomercindo é o terceiro dos 13 filhos de Severino e Catarina Req Sartor: Nair, Amábile, Gomercindo, Eugênio, Evaristo, Ângelo, Adelina, Ludovino, Petronila, Maria, Alzira, Rosa e Lilian.

Casou em Erechim, no mês de maio de 1951, com Íride Maria Palavicini (20.10.30 a 6.9.98), a mãe de seus cinco filhos: Zulmir (casado com Laurete Longo), Júlio (Vera Longo), Mário (Lúcia Girotto), Carlos, o “Carlinhos” (Sueli Slongo) e Roque. Zulmir tem dois filhos – Marcos e Juliana – e uma neta, filha do Marcos; Júlio tem dois filhos, Juninho e Naiara; Mário tem três filhos – Josiane, Daniela e Fernando – e uma neta; Carlos tem três filhos, Tiago, Thaís e Carolina; Roque tem dois filhos. São 12 netos e dois bisnetos.

Gomercindo comprou uma propriedade inicialmente em União da Barra, no tempo dos Lageanos, onde reside hoje o filho Carlos. Sempre participou da vida da comunidade. Foi em função de sua deficiência visual, assim como do irmão Evaristo (os dois sempre usaram óculos), que foi escolhida Santa Luzia como padroeira da capela que eles fundaram, no fim dos anos 60. Ele também participou da diretoria da cooperativa agrícola que existiu no Verê e, depois, da Camdul de Dois Vizinhos.

Após sua viuvez, mudou para a cidade de Verê, onde ele concedeu esta entrevista ao Jornal de Beltrão.

JdeB – Quando o senhor se deu por gente morava em Erechim, Caxias não lembra?

Gomercindo – Sim, não lembro.

E seu pai tinha agricultura e criava porco? 

Mais era parreiral, em Caxias e Erechim trabalhava só com parreiral, mas também tinha agricultura, milho, trigo; o feijão naquele tempo não se plantava, era isso o que nós plantava.

Mudaram de Caxias para Erechim porque a terra já estava pouca? 

A terra já tava pouca e o pai também, a irmandade dele era de 13 irmãos, a terra era pouca e para comprar lá estava meio difícil. Já tinha um tio dele que trabalhava em Erechim que tinha uma sapataria, ele veio visitar o tio dele e se agradou do lugar, aí comprou 20 alqueires de terra e se mudou para Erechim.

Quem veio da Itália? 

Meu avô e avó vieram crianças. A minha terra natal eu conheci faz 25 anos, eu não conhecia minha terra natal.

O senhor casou com 20 anos e logo mudou para Curitibanos? 

Não, fiquei dois anos morando junto com o pai ainda, com a família, depois o pai não tinha condição de comprar terra, nós éramos uma família pobre, e abriu um assentamento de terra em Curitibanos. Nós era um grupo de 100 famílias, abriu aquele núcleo e eu e meu irmão Eugênio fomos morar lá naquele assentamento, era fora da cidade, dava 30 km, distrito de Frei Rogério. Então fomos morar ali, depois era para ter vindo no Verê, o meu sonho sempre era o Paraná, e deu no acaso daquele Adelarte Debortoli, que até foi prefeito de São Jorge, ele trazia gente lá de Videira para comprar terra aqui em São Jorge e tinha um caminhãozinho F5, ele veio lá na ferraria mandar fazer uns parafuso no caminhão, umas coisinhas, e ele me convidou pra vir pro Paraná. Eu tinha o cunhado Carniel, sabia que ele morava no Paraná, mas não sabia se era no Norte ou Sul.

O Carniel morava aqui? 

Ali onde que é a (propriedade) do Perardt. Era o Juanir Carniel, ele morava lá. Daí nós passávamos no Verê e vim pra cá, me agradei bem e consegui vender minha parte da ferraria, daí eu vim pra cá em 58.

O senhor morou um tempo em Videira?

 

Não bem um ano e meio, um ano e três, quatro meses, por aí, não me acostumei com o serviço de ferreiro lá, tinha comprado uma ferraria junto com um cunhado e não me acostumei, aí abri para vir aqui no Verê, porque o meu é agricultura.

E em Curitibanos por que o senhor não ficou?

 

Um lugar muito frio e nós nunca iríamos adquirir aquelas terras, era terra do governo e nós pagávamos o arrendo, nós pagávamos 10% sobre o trigo e milho, o que predominava lá naquela época era o trigo e o milho, e eu não me acostumei, lugar muito frio, terra magra, não tinha, assim, técnica de adubo, tinha dois engenheiros agrônomos, uma cooperativa… Naquela época eu era do conselho fiscal daquela cooperativa e dava assistência, só que não pude me acostumar. Teve uns quantos que saíram de lá. Tem uns que saíram e tão aqui em São Jorge e outros por ali. Faz uns dez anos que eu e meu irmão Eugênio voltamos lá, fomos rever o lugar, mas virou um deserto, a sedezinha só tem um mercadinho e a agricultura acabou.

Agricultura mecanizada agora?

 

Nem mecanizada, não tem nada. Aquele que me comprou o direito – a gente só podia vender o direito porque a terra não era da gente -, ele tava lá com 83 anos, mas ainda tava lá, porque a terra era magra, mas o alho dava muito bem.

O senhor já tinha vindo antes ver o lugar, em Verê?

 

Sim, junto com o Adelarte Debortoli. Fui de ônibus até nas Águas (do Verê) e das Águas pra lá só tinha uma estradinha até na entrada da fazenda de São Jorge, do Rio Faxininha, e lá tinha o escritório do Rupp e pra diante era puro sertão, não tinha nada. Num domingo de manhã, saímos eu e um peão do Rupp e fomos a cavalo no meio de puro sertão e de picada até lá na Sede Paranhos. Chegamos lá era meio-dia, comemos umas coisinhas e depois voltamos. Eu tinha muita vontade de morar lá, mas no recurso aqui na saída das Águas, o lugar onde está a cidade de São Jorge, nós tava farquejando umas vigas pra montar uma laminadora e aquele que estava junto comigo disse aqui vai sair a cidade de São Jorge. Aí eu não quis e dei um jeito e comprei no Verê.

Como é que parou no Verê?

 

Já tinha um cunhado que morava aqui no Verê, foi no ano seguinte da Revolta da companhia, e daí eu, sem intenção, sem achar que podia comprar aqui, porque para vender minha ferraria lá não era fácil, porque meu cunhado não podia e vender para quem? Daí tinha um rapaz, filho de um compadre meu, aí garrei e vendi e vim pra cá.

E com aquele dinheiro comprou a terra?

 

É, eu queria comprar.

Comprou de quem?

 

Francisco Ordes, o apelido dele era Chico Polaco, comprei dele.

Ele vendeu e foi embora?

 

Ele foi ali pra Nova Concórdia. Aí fiquei morando junto com a família dos Lajeano, uma família muito boa. Depois eles foram vendendo e foram junto lá para Boa Esperança, já tinha um cunhado da rapaziada que morava lá e daí foram tudo pra lá, então o Evaristo comprou uma parte, o Gentil comprou outra e foram saindo.

O senhor que foi trazendo os outros?

 

Sim, eu que fui trazendo todo mundo. Quando o Evaristo foi lá para Erechim, o Ludovino trabalhava de empregado numa fábrica de móveis e daí pediu pra vir morar pra cá, então aquela casa que eu tinha comprado junto com o Evaristo estava desocupada e daí pediu para o Evaristo se ele cedia a casa pra ele vir para cá, aí o Evaristo disse da minha parte eu cedo, mas tem que falar com o Gomercindo, que ele tem parte. Ele voltou e me falou, eu disse pode, sim. E daí o Evaristo falou pra ele venha dar uma olhada antes. E ele que nada: se vocês dois se acostumaram, por que que eu não vou me acostumar? Ele conheceu o Verê quando veio descarregar a mudança.

Quando o senhor chegou, como era o Verê?

 

Só tinha um comerciozinho pequeno e mais nada. Tinha só um jipe e um caminhão em todo o Verê. Tinha um onibusinho precário que ia de Dois Vizinhos a Pato Branco. Saía de manhã e voltava de tarde. Quando chovia, nem pensar de ir, e quando enxugava, o Rio Santana atacava, ficava mais tempo sem ônibus do que com ônibus. No primeiro ano que eu morava aqui, eu fui picado por uma cobra venenosa, uma jararaca bem venenosa, a minha sorte é que ela me pegou mal, me beliscou só com uma presa, se tivesse me pegado bem não tinha recurso, porque médico na época só Pato Branco ou Francisco Beltrão, eu tava sem dinheiro, o jipe do Juca Busetti nem em casa não tava, só tinha uma farmaciazinha ali, me curei na dura sorte.

E não aconteceu nada?

 

Sofri bastante, descascou todo o pé de tanta febre que deu. Sorte que não me pegou bem, se tivesse me pegado bem, eu não tava mais aqui hoje.

Deram algum remédio pro senhor?

 

Não. Cachaça com cipó mil homem, os vizinhos sempre tinham lá cachaça com cipó mil homem, e eu tomava um trago, era o único remédio.

O jipe era do Juca e o caminhãozinho, de quem era?

 

Era do Juca também, ele tinha o único comerciozinho dali, onde é o posto do Miro, na esquina, depois o primeiro comerciante dele que veio foi o Paggi.

O Paggi estava no Verezinho quando o senhor veio?

 

Quando eu vim morar, ele estava no Verezinho, mas eu não cheguei a conhecer ele. Então, quando a cobra me picou no primeiro ano que eu vim morar aqui, em 58, foi em novembro que a cobra me pegou, e naquele mesmo dia queimou a loja do Juca, daí o Paggi comprou o direito ali e começou trabalhar numa garagem, o comércio numa garagem que tinha do lado. Construiu a casa e ficou ali, depois entrou o Iris Busetti em frente à igreja, e por aí foi. Tenho saudade daquele comércio da cooperativa, um dos presidentes foi o Luiz Pegoraro e eu era um dos vice-presidentes da época.

E o Juca foi embora?

 

Foi, mas logo que ele saiu daqui, ele acabou morrendo. E o Iris ficou em Beltrão, que é o pai do Ari Busetti, e depois foi entrando comércio ali.

Quando o senhor chegou, o Joaquim de Mattos estava ainda aqui?

 

Tava aqui. Conheci o filho, o velho mesmo era o Joaquinzinho de Mattos. Foi ele que me fez o contrato do terreno que comprei lá embaixo. Ele tinha o escritório ali em cima, que o Mercado Zeni era uma casinha de madeira.

O Joaquim de Mattos não morava mais aí?

 

Não, não sei se ele já tava morto. Que eu conheci os Fabiane aqui, os de Mattos, esse Juca Busetti, conheci essa gente ali.

O senhor gostou do Verê?

 

Sim, graças a Deus, mas sofri, o primeiro ano eu sofri. No primeiro ano até fome passei. Quantas vezes almocei só feijão e mandioca e não tinha outra mistura. Peguei um pedaço de mandioca onde eu peguei o terreno e milho para semente, não era fácil, era do ano seguinte da Revolta. Os colonos não conseguiam fazer roça, tudo escondido nos matos e deu a seca, era uma calamidade fora de sério, mas depois foi melhorando, graças a Deus. Comecei a trabalhar com porco e foi sempre foi muito bem, e eu gostava e dava dinheiro.

Desde que chegou o senhor criou porco?

 

É, mas não tinha porco, porque eu trabalhava de ferreiro lá em Videira, então antes de vir pra cá comprei duas novilhas e uma vaca, e quando vim, comprei o terreno, ganhei a porca e comecei por ali. Uma porca enxertada e daí outro me deu um leitão pra engordar às meias. Outro tinha uma porção de porco, me deu uma leitoa pra criar às meias e ali foi onde comecei.

Galinha o senhor trouxe?

 

A mulher deu uma galinha pra falecida esposa e uma pra cada filho. Mas naquele tempo era fácil, a terra tinha toda a fertilidade, tudo o que a gente plantava produzia bem. Depois, no ano 71, eu e um compadre meu, o José Cagnini, resolvemos comprar um trator em súcia, aí fomos largando os bois e começando com a lavoura mecanizada, aí comecei.

O senhor foi um dos primeiros?

 

Sim, fui um dos primeiros, aqui só tinha o Paulo Czarnobai que tinha o trator e o segundo fomos nós que tivemos aqui no Verê.

Durou tempo aquele trator?

 

Tá por aí até hoje, tá na mão do Vilmar Cagnini. Era um Massey 65.

O senhor viu toda a transformação do Verê.

 

Pois é, isso é uma das coisas que eu nunca pensei em enxergar na minha vida: o Verê cortado de asfalto e a eletrificação rural. A eletrificação rural, no tempo em que eu era presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, estivemos em uma assembleia em Curitiba, dos presidentes dos sindicatos, e tava saindo muitos agricultores da agricultura e indo pra cidade, então lá se preocupavam com isso aí e perguntaram qual era o meio pra segurar os agricultores na lavoura. Eu levantei e disse: uma das principais é a eletrificação rural, que daí eles tinham o conforto da casa e o principal pra segurar eles. E foram contemplados quatro municípios: Verê, Realeza e dois lá do Norte. Então aqui no Verê saiu ligação Kennedy, Alto Alegre, União da Barra e Barra do Santana. E daí foi indo, hoje não tem mais ninguém sem eletrificação rural. Eu nunca esperava que o Verê tivesse essa transformação.

Quando o  senhor chegou, não tinha energia elétrica nem na cidade?

 

Não, o Avelino Klaus tinha o moinho lá embaixo que pegava água do Rio Tigre, ele fornecia luz, mas muito precário, ele tinha um hotelzinho, a eletrificação era só para o hotel dele. O moinho era tocado com motor a diesel ainda; depois o Arnaldo Busato que conseguiu a eletrificação no Verê.

Primeiros tempos em Verê

Na criação do município, o que o senhor lembra, teve algum movimento aqui em 63? 

Não, foi criado o município, eu me recordo bem como se fosse o dia de hoje: vim de noite ali no Paggi, ele tinha a farmácia e a mulher do Gentil (Lurdes Guerra) tava doente, eu vim pegar um remédio pra ela, naquele tempo o médico e o farmacêutico aqui era o Paggi. Então tava o Arnaldo Busato e ele falando a respeito disso, pedindo o apoio ao Paggi. O Arnaldo prometeu que ia emancipar e como ele se elegeu deputado estadual, daí então ele conseguiu emancipação do Verê. (Obs.: o médico Arnaldo Busato, de Clevelândia, elegeu-se deputado estadual pela primeira vez em 1962, pelo PDC, com 7.158 votos, e o município de Verê foi criado pela Lei 4.729, de 24 de junho de 1963 e instalado em 26 de outubro de 1963)

 E a primeira campanha, como foi?

 

Até eles tinham feito, assim, um acerto para o Paggi ser candidato único, até o Paggi já tinha feito uma festinha ali e tava tudo certo, e de repende os da oposição caíram fora, daí correu dois candidatos, o Luiz Paggi e o Antônio Perardt, mas foi uma campanha pacífica, sem grande tumulto.

O Paggi era para ser candidato único na primeira eleição, mas na segunda teve oposição e ele perdeu, e durante a gestão dele ele perdeu muitos companheiros? O sistema dele não agradou?

Sim, perdeu, ele era um homem que tinha na mão dele e queria ser o dono de tudo. O grande mal dele, ele teve coisas erradas e teve coisas boas também, não é que ele não tenha os méritos dele, mas tinha essa que tinha que passar tudo na mão dele. Aí ele começou a perder os companheiros porque ele não conseguia dar conta em tudo. Depois ele correu as duas vezes e perdeu as duas vezes.

Mas ele foi uma pessoa marcante no Verê?

 

Foi, ele foi um homem marcante, e por isso que na avenida foi colocado o nome Luiz Francisco Paggi. Como digo, ele teve coisa negativa, mas teve coisa positiva também.

Na saúde ele atendia muitas pessoas?

 

Sim, atendia, nessa ele tinha uma parte positiva, ele nunca deixou de atender um que não tivesse dinheiro. No comércio ele queria ser só ele, não queria que outro entrasse, depois veio o Carletto, o Leri Dalsasso. O Leri também comprava porco na época. E muitos outros também. Um dia ele também me desacatou e eu caí fora. Não negociei mais com nele, não negociei. O mal dele foi isso aí, né.

E veio a mecanização e a população do Verê foi diminuindo?

 

Foi, foi teve uma época que me falaram, que eu não acompanhei muito bem, que tava com 14 mil habitantes e hoje tem 8 mil e pouco. Agora o último censo que foi feito da época que o prefeito ainda era o Fedrigo, se não me falha a memória, ele colocou muitos habitantes fantasmas, porque entrava arrecadação com a quantia de habitante. Assim me contaram, eu não posso dizer, mas foi diminuindo, saindo muita gente, pois a quantia de carteira de trabalho que foi feita aqui foi fora de sério e foi tudo pra Santa Catarina, Joinville, aqueles lados ali.

Das pessoas que foram embora, tem quatro dos seus cinco filhos. Não quiseram ficar aqui ou não tinha lugar para eles?

Olha, a maioria desses que entraram eram tudo de baixa renda, então eles compravam terreno pequeno. Não tinha aquela estrutura e a tecnologia de adubos naquela época não tinha, a terra foi perdendo a fertilidade e a família aumentando e não tinha mais como se manter naquela areazinha pequena, então ele vendia para um vizinho e saía procurando outro rumo, a maioria voltava pra trás e outros iam pra frente, pra outro lugar.

E seus filhos, por que eles mudaram pra tão longe?

 

Nessa época eu trabalhava na cooperativa, o secretário da cooperativa tinha terra em Tangará da Serra, no Mato Grosso… eu fiquei escutando aquilo e um dia fui pra lá olhar, me agradei e comprei uma posse lá. Só que aquela posse de terra foi mal, quando foi para legalizar, tinha outro posseiro em cima e a coisa sempre estoura no mais fraco, não tinha como legalizar. Aí apareceu outro ali de Toledo e vendi a posse praquele e ele comprou outro pedaço em Tangará. Trabalhava na agricultura, tava precária, muito precária, daí ele deixou a terra para um sobrinho meu e foi lá em Rondônia junto com uns cunhado dele, e comprou uma serraria. Ele trabalhou um ano lá na serraria, daí ele não foi tão bem, comprou umas madeiras e não pagou, mas ele não tinha vendido o terreno e ainda tem aquele terreno lá e o outro cunhado dele tinha duas serrarias, daí ele me disse me compra uma serraria e preciso de alguém pra me ajudar. Ficou com aquela serraria e pagou bem, aí se mudou pra outro lugar com a serraria, conseguido liberação do Ibama, e o Júlio então trabalhava no (banco) Bandeirantes, foi transferido em Curitiba, depois foi pra Rondonópolis, no Mato Grosso, e de lá ele foi lá pra Porto Velho, em Rondônia, e lá eles começaram outra serraria e depois ele voltou ali em Ji-Paraná, ajudou abrir outra agência e depois de lá eles queriam transferir, mas ele não quis, então fez o acerto e ficou. A terra arrendada para os cunhados dele, tem duas fazendas de gado, ele tá bem, é vice-prefeito e o Roque tem uma carreta. O Mário tá na Bahia, então ele tem três carretas, prédios lá, ele tá bem. Ele tinha mercado e alugou pra filha dele, ele cuida as carretas.

E logo que o senhor chegou no Verê, o que o pessoal falava da Revolta?

 

Era um comentário sem fim. Todo mundo falava, um falava uma história, outro falava outra história diferente. Tinha um vizinho meu, o Fiorindo, aquele tinha um medo, contava as histórias e era um alarme. Os “lajeanos”, naquela época, se achasse um que pagasse, desse um dinheiro pra pagar a mudança pra voltar lá em Lajes, eles voltavam. Abandonavam tudo. Depois, quando João Goulart desapropriou a companhia, daí tranquilizou. Mas até lá, era comentário de que voltava, daqui e dali. O pessoal dos jagunços foram prendendo tudo, foram limpando. Mas teve muita gente que morou por muito tempo no mato. E era tempo de frio, de enchente. Aqueles lajeanos, uma noite, com o Rio Santana cheio, trabalharam a noite inteira e passaram o pessoal tudo pro outro lado do rio. Um perigo com o rio cheio.

Aquilo ajudou também o senhor comprar terra mais barata?

 

Sim. No tempo da companhia, o valor que eu comprei aquela terra comprava dez vezes mais. É que eles trancavam o Rio Santana, não deixavam entrar ninguém.

O senhor não lembra quanto pagou?

 

Foi 115 mil cruzeiros, do tempo do cruzeiro. Vendi por 120. Mas daí comprei umas vacas, tinha que pagar o frete, a mudança e uma coisa e outra, daí fiquei devendo 15 mil lá. E daí pra pagar aquilo lá, não tinha mais como pagar, né. Daí eu fiz uma carroça pra mim, antes de sair e trouxe a carroça pra cá, né. O Chico, aquele que me vendeu o terreno, eu disse pra ele que queria o prazo de seis meses a um ano pra pagar, por causo que eu ia tirar o dinheiro lá do terreno. Eu não tinha mais sobra, né. Deu seis meses, veio lá e quis porque quis receber. Daí eu disse que tinha três novilho lá, a carroça e veja o que você quer pegar, porque eu dinheiro não tenho. Entreguei a carroça pra poder pagar o terreno. Então, morei seis anos numa casinha de madeira lascada. Não adiantava fechar as portas porque as fresta era maior do que a porta (risos). Depois construí uma casa de madeira ali, meio mal ainda, mas foi indo.

E saúde na família sempre teve?

 

A falecida tava muito doente, muito, muito, ih. Desde o tempo que eu casei era muito doente. Quantas vezes que eu chegava da roça e achava ela na cama, os guri sentado, um pra cá outro pra lá. Daí tinha que fazer a comida pra eles e depois vim de a pé achar um remédio pra ela, né. Mas só que ela sempre sofreu calada. Ela nunca se queixou, nunca. E depois, então, que o médico mandou levar ela num cardiologista em Pato Branco. Levei ela lá e o cardiologista me disse: Olha, o problema tá no coração. E fez um eletro no coração e disse que era defeito de fábrica. E, de fato, a família dela, tudo eles morreram de infarte. Mas foi levando mais uns 20 anos daquele jeito. Quem tratava ela era o doutor Chico, ultimamente. O músculo do coração dela era muito fraquinho, muito fraco. Até uns 90 dias antes dela morrer eu pedi pra fazer um eletro. Daí tal dia veio o médico aqui no Verê, veio e fez o eletro pra ela. E se conversavam os dois, mas eu não entendia, que era tudo conversa de médico. Aí quando fez o eletro, o doutor Chico me chamou no consultório e disse olha, a situação dela tá bem pior que eu esperava, porque só tem mais uma camadinha de músculo no coração e não tem mais o que fazer. Tem que levar assim até onde dá. Daí deu mais uns três, quatro meses e acabou falecendo.

Infarto?

 

Infarto. Achei ela morta na cama. E de tarde veio mais duas irmãs lá do Rio Grande, chegou o Valmir também, lá de Mato Grosso. O Roque já tava aqui. De tarde fizemos um leito na sala ali, com tábua boa e tudo mais. As minhas irmãs foram pousar lá no Evaristo, daí ficou o Valmir, o Roque, eu, ela e a empregada, tinha uma empregada. Daí ela levantou, quis deitar, a empregada acompanhou ela até no quarto. Ela deitou, eu cheguei lá e cobri ela bem, ajeitei bem. Aí ela disse não sei se vou poder dormir essa noite, porque dormi bastante de dia. E eu disse pra ela que se ela não consegue dormir, ia botar ela de guardião lá na rua (risos), e ela deu uma risadinha. Porque uns 30 dias antes ela queria dormir no outro quarto. Ela disse que se batia muito e não me deixava dormir. E eu digo não, não precisa, o quarto é grande, pega uma cama de solteiro, ponha aqui do lado e fica sozinha ali. Daí foi o que eu fiz, né. Coloquei ela bem e quando pegou no sono eu vi que ela respirava bem “liviana”. Porque quando começava o fôlego pesado podia dar problema, dava crise, né. Tava tudo bem. Daí peguei e dormi também. Era umas duas horas da madrugada, eu vi que ela tava quieta assim. Eu vi que ela não respondeu, liguei a luz e ela tava morta.

Qual é a data que ela morreu, seu Gomercindo?

 

Bom, ela tinha 60… fez 15 anos anteontem que ela morreu. Ela tinha um ano mais do que eu. Se ela tivesse viva hoje ela tava com 84. Ela morreu dia 6 de setembro de 98.

A seca de 78 que foi braba. Foi a pior, né?

 

Foi, foi a pior.

Naquele tempo o senhor ainda plantava milho com boi, né. Mas já tinha mecanizado uma parte?

 

Em 78 já tinha a máquina.

Mas as plantas não tinham a resistência de hoje.

 

É. Acho que foi no ano de 75 que comprei meu primeiro trator. Depois trabalhei junto, um ano, com o Caneni, daí depois vendi a minha parte pra ele. Aí comprei um do Fabiane ali. Comprei o trator deles e arrendei a terra deles ali no Planalto.

 

 
Vista parcial da cidade de Verê, vista da rua onde mora  Gumercindo Sartor.

 

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