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Francisco Beltrão
terça-feira, 03 de junho de 2025

Edição 8.218

04/06/2025

Luiz Carlos Peretti

O currículo de Luiz Carlos Peretti é longo. Só de cursos que fez em seus 26 anos como funcionário da Sadia, dá um relatório. De cargos que ocupou, outro tanto. Basta citar, no município, que foi presidente do Fórum de Desenvolvimento, da Paróquia Imaculada Conceição e da Associação Empresarial de Dois Vizinhos; na região, vice-presidente para assuntos de desenvolvimento regional da Faciap, vice-presidente da Sociedade de Garantia de Crédito do Sudoeste e (atual) presidente da Coordenadoria das Associações Comerciais e Empresariais do Sudoeste do Paraná (Cacispar). Ele tem dado muitas palestras, para pessoas de todas as idades, sobre liderança, envolvimento comunitário e um tema no qual é especialista: educação financeira.

Tudo isso hoje, aos 56 anos de idade. Porque quando nasceu, em Xavantina (naquele tempo pertencia ao município de Seara-SC), dia 3 de outubro de 1956, Luiz Carlos era apenas o oitavo dos 13 filhos que teria o casal de agricultores Alice Vanazzi (hoje com 88 anos) e Alberto Peretti (falecido com quase 91 anos).

Ele estudou em seminário de padres católicos e depois formou-se bacharel em Administração de Empresas. Também fez pós-graduação em Gestão pela Qualidade, Estratégias em Recursos Humanos e Educação Financeira e curso técnico de segurança no trabalho.

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Casado com Anete Maria Martelli Peretti, tem dois filhos: Greicy (casada com Álvaro Alexandre Poffo e mãe da Sofia, que completa neste domingo 48 dias de idade) e Ricardo, que é solteiro. Após sua aposentadoria, virou empresário, junto com a esposa, do setor de confecções e imóveis e é o proprietário da empresa de consultoria e planejamento Finaplan.

Luiz Carlos Peretti é daquelas pessoas que têm bagagem para preencher todo o jornal se disser tudo o que sabe sobre assuntos pessoais e empresariais. Ele tem hoje, como município, Dois Vizinhos, e como região, o Sudoeste do Paraná.

 

JdeB – Voltando lá pra Xavantina, como era sua vida?

Luiz Carlos Peretti – Eu vivi junto com os pais até os 12 anos aquela vida de agricultura. Eu me lembro muito bem que aos 7 anos de idade eu tinha a minha enxadinha e ia pra roça, quando era época de aula de manhã se ia pra roça e de tarde se ia pra aula – e três quilômetros inclusive pra ir na aula a pé. Com 12 anos eu fui pra Ipumerim, o objetivo era estudar, que a nossa família era muito grande e não tinha muita terra. O meu irmão mais velho, Lídio, que estudava em internato, disse “pai, nós temos que dar um jeito de alguém estudar, porque a turma é grande…”. Então, ele foi o cara que motivou pra alguém sair de casa e pensar que tinha que se virar de uma forma diferente. Eu tive essa oportunidade. Estive em Ipumerim por três anos, fiz lá o ensino fundamental até a sétima série. Depois de Ipumerim eu fui pra Chapecó, onde fiquei mais três anos no internato. Saí com o propósito de internato, e foi um período também bem interessante, da mesma forma que lá em Ipumerim eu trabalhava em torno de 6 horas por dia apenas pra manutenção. No seminário ficava nas férias, que eram em julho um mês e no final do ano, dois meses. Como meu pai não tinha recurso, eu ficava nas férias pra pagar a pensão no seminário. Entrei em 72 no seminário e saí em 75. Pra mim, foi a melhor época, depois do internato, foi quando eu aprendi muito, que eu me soltei mais, porque vida no interior é de muito acanhamento, em função própria do ambiente, da cultura, eu era uma pessoa muito tímida, e o seminário me permitiu isso porque ele tinha jograis, teatro, tinha que fazer leituras, tinha tempo pra tudo, era pra estudar, pro esporte, pra dormir, pras refeições. Era uma coisa muito bem organizada e me ajudou também na minha vida a ser mais organizado. Em 76, meu primeiro trabalho foi numa loja de calçados, trabalhei 60 dias vendendo sapatos e eu descobri que tinha habilidade também de vendedor (risos). Eu nos dois meses lá tirei o primeiro lugar, fui o que mais vendeu de todo mundo.

 

JdeB – Aquele menino tímido já tinha virado conversador.

Luiz – É, de certa forma sim (risos). Na sequência, apareceu oportunidade na Sadia, em abril de 76, e eu comecei na fábrica de rações e na área de armazenagem de grãos. Isso em Chapecó. Meu trabalho era controle de estoque, emitindo produção, controle de qualidade, na fábrica de rações. No final de 76, como eu tinha 17 pra 18 anos, tive que fazer a inscrição militar, e por coincidência eu fui chamado pra servir em Brasília. Em 77, eu fui servir o Exército em Brasília no BGP, que é o Batalhão da Guarda Presidencial. Eu permaneci vinculado à Sadia, a lei permitia em função da prestação de serviço, e fiquei um ano servindo. Foi também uma experiência muito grande em termos de regime militar, porque ali é tudo bem organizado, disciplina, também tem me ajudado na minha vida nessa questão dos horários, enfim. E retornei em 78 na Sadia. Fiquei em Chapecó até maio de 81, mas tive outros cargos. Em 81, fui convidado pelo Alberto Stringhini a assumir como supervisão a fábrica de rações, área de armazém em Dois Vizinhos, que estava começando. Nós estávamos abatendo 35 mil frangos por dia e hoje vamos abater 700 mil frangos por dia, pra ter uma ideia como cresceu, então a gente, particularmente, contribuiu no crescimento da empresa, da cidade.

 

JdeB – No começo foi uma oportunidade, mas depois acabou optando por Dois Vizinhos ou pensa em sair?

Luiz – Não, pra mim a cidade em si foi uma oportunidade, eu cresci e, como eu me aposentei, a gente tem a loja, tudo está estruturado, e eu diria que não só de hoje, mas que de muito tempo, já é uma opção de vida Dois Vizinhos. Você tem uma história e você tem a oportunidade de continuar contribuindo pro crescimento da cidade. Se você analisar, comparar Chapecó com Dois Vizinhos é uma grande diferença, mas o importante é onde você está inserido, como você está se sentindo nesse meio, a rede de relacionamento que você tem, as amizades e a oportunidade que você tem de contribuir com a comunidade é muito grande. Se for pra Chapecó hoje, ali você é só mais um. Então, todas essas questões do meu lado, mas também da minha esposa, ela tem essa influência também, a participação na sociedade dentro do Conselho da Mulher Empresária, ligada às mulheres, tudo isso fez com que a gente permanecesse em Dois Vizinhos.

 

JdeB – Ocorreu uma transformação em sua vida, aquele menino tímido se transformou em uma pessoa sempre ligada com outras pessoas, com essa vida coletiva que você sempre viveu no seminário, no Exército e agora também na comunidade.

Luiz – É, se for ver até hoje, porque a princípio não é só a Cacispar, a Agência de Desenvolvimento e a associação comercial, tem também, por exemplo, a sociedade Garantidora de Crédito, agora a criação da Bolsa Mercadoria, que a gente faz parte também, a criação do Instituto de Inovação, Tecnologia e Pesquisa. As pessoas convidam a gente. Desde pequeno a gente se habituou que tem que trabalhar e tem que fazer, tanto no seminário, na Sadia, no próprio Exército, aquela cultura do fazer, de forma disciplinada, caminhos com metodologia, você sabe que chega lá e tem resultado. E a própria vida me ensinou, por onde passei, que o importante é você estar inserido na coletividade, é nas parcerias que você consegue resultado, isoladamente a gente é apenas mais um e você não consegue nada. A própria minha história e aquilo que procurei em termos de educação, aprimorar, por exemplo, cooperativismo, desenvolvimento local e regional. Você tem que pensar que quando você está fazendo pra si que seja também pra todo mundo. Sempre que você trouxer resultados pra todos, pode ter certeza que o seu também vem. Veja que um grande mal que nós temos hoje é essa carência de conhecimento da sociedade, de como se constrói o desenvolvimento do município, da região e assim por diante, mas muitas vezes as pessoas não querem, porque falta informação, falta conhecimento. O próprio Jesus Cristo diz na bíblia “homem sem conhecimento perecerá” e se tu olhar lá em Provérbios 3: “Bem-aventurado o homem que adquire conhecimento”. Tem que saber como inserir essa informação, esse conhecimento. Todo mundo quer cada dia ser melhor, quer crescer cada vez mais, mas muitas vezes falta a forma de como chegar.

 

JdeB – No seu caso, o conhecimento foi adquirido, digamos assim, com aulas presenciais, os seus cursos foram feitos junto com outras pessoas. Mas nós vemos pessoas preocupadas em adquirir o conhecimento não importa a forma, para pegar cargos mais remunerados ou ganhar bem, mas fazer pouco. Qual é a perspectiva que tem o mundo, o que vai mudar?

Luiz – Nós estávamos conversando um pouco sobre as questões da liderança, do líder que sempre foi bem abastado e do líder que teve que passar por muitos processos, por necessidades, por carência. Pra crescer, eu tive que batalhar, eu tive que pelear. O Ronaldinho Gaúcho ou o outro [Ronaldo Fenômeno], o Neymar e assim por diante, pra ser o que eles são, tiveram que passar como desafio treinar, treinar e treinar, não é verdade? Um médico, um especialista, se ele não passou por um processo, ele não vai ser bom. Essas pessoas têm um tipo de discernimento, elas têm um modo de ver as coisas diferente, conseguem mais facilmente enxergar as bases. É muito melhor ter na sociedade um líder que teve que passar pelos processos pra ele conseguir sucesso, resultados e prosperidade do que um abastado. Por outro lado, as nossas escolas hoje não têm essa preocupação de formação de líderes, de dizer assim nós temos que ter dentro da ementa acadêmica, seja lá no ensino fundamental, ensino médio, universidade, alguma coisa sobre liderança, alguma coisa sobre empreendedorismo, alguma coisa sobre ativismo, que faz com que as pessoas desenvolvam uma cultura de coletividade e com essa questão do avanço da tecnologia, da globalização, da internet. Essas coisas vão levando as pessoas muito mais pra individualidade, pra se cercar, pra isolar. Tinha que ter uma contrapartida, dessa tecnologia e inovação, que é necessário e importante, com a capacitação e formação. O Peter Grutter, que é considerado o pai da administração no mundo, um americano falecido com 90 anos, ele enxergava os líderes muito egoístas, as pessoas pensavam muito pra elas, mas isso vem muito da questão da formação, então nós temos aqui uma falha de formação, isso, na minha opinião, tem que ser trabalhado e corrigido, porque a gente não sabe o que vai acontecer lá na frente, é difícil você imaginar e prever o que vai acontecer. Se você pegar um mundo que cada vez a renda é muito mais concentrada, você sai duma pirâmide larga e de repente ela vem se estreitando, quer dizer, quanto mais ela se estreita, menos é sustentável. Se você olhar a história dos romanos, dos gregos, assim por diante, eles também tinham uma superconcentração de poder e de riqueza. Eu pergunto: sobrou alguém pra contar história? Não sobrou ninguém, a história romana é típica disso, do egoísmo, da centralização. Aí vêm as cobranças de cada vez mais impostos, daqui a pouco a população se enche e manda tudo à m…, aí desanda tudo. Na minha visão, se nós queremos realmente criar um mundo de sustentabilidade, nós vamos ter que construir esse processo de liderança com uma nova visão que é a questão da coletividade, e que essa pirâmide seja muito mais horizontal.

 

JdeB – Ainda se vê gente pensando “eu sou egoísta, mas eu não consigo as coisas, então eu quero que algum egoísta mais forte do que eu consiga as coisas por mim”. Parece que o mundo de hoje mantém muita característica do mundo antigo.

Luiz – Verdade, se você olhar, por exemplo, segmentos empresariais, hoje, patrocinam campanhas e campanhas, eles não patrocinam pra pensar no bem da coletividade, mas se procura um cara que faça, digamos um trabalho, pra coletividade de um modo em geral, sem tirar vantagem, e grandes vantagens, então isso é um erro cultural, isso é ganância.

 

JdeB – Mas você acha que está mudando isso ou não, o que se pode fazer pra mudar?

Luiz – No Brasil, a lei da responsabilidade fiscal começou com Fernando Henrique Cardoso, daí veio a lei da transparência – o legislativo e executivo têm que por isso tudo em site para que as pessoas tenham acesso -, a questão da ficha limpa, nós temos várias leis que vêm ao encontro, mas pra funcionar a gente tem que educar o povo, tem que levar essas informações na escola e tem que ensinar. Como é que eu entro num site pra ver a questão da transparência das contas públicas se eu não entendo nada de contabilidade, não entendo nada de números? Um grande desafio agora é mudar a escola, fazer com que o nosso jovem aprenda isso, mas também essas pessoas de 35 até 50 anos voltar à escola e aprender isso. Não é uma coisa assim de hoje pra amanhã, vejo uma coisa de médio a longo prazo. E se não tiver essas coisas inseridas nas escolas é complicado, porque nossas escolas têm um modelo muito acadêmico, muito na visão própria, não deixam muito entrar opiniões de fora. Numa reunião com o pessoal do Senac/Senai, UTFPR, na Associação Comercial de Dois Vizinhos, falamos sobre capacitação de mão de obra, porque empresário fala que tem deficiência de mão de obra, mas ele não se organiza pra ter essa mão de obra, não podemos esperar só do governo, tem que se organizar. A gente lançou um desafio na área de alimentos, vamos nos reunir com quem tem uma certa estrutura pra poder preparar esse pessoal, que tem conhecimento. O Senac teve dificuldade de entrar nas escolas pra divulgar que tinha um curso, por exemplo, pra formação de padeiro, de carpinteiro, algumas áreas técnicas, sabendo que o público é aqueles jovens. Então, nós temos nossa escola que não prepara nem pro ser, muito menos pro fazer.

 

 

JdeB – Uma das suas especialidades é em educação financeira. Quando começou essa sua preocupação com o dinheiro, foi ainda no tempo de garoto?

Luiz – Por incrível que pareça, não, mesmo no tempo de Sadia, que eu trabalhei quase 30 anos, nós tivemos a gestão pela qualidade, nós trabalhávamos muito essa questão e do orçamento por processo, por tipo de produto, porque o sistema lá da fábrica me dava o custo de produção, você tinha todas as informações, podia gerenciar.

 

JdeB – Mas no tempo de seminário não se preocupava para onde ia o dinheiro?

Luiz – Eu nem sabia dessa preocupação, de pensar “peraí, tenho que gerenciar aquilo que eu ganho, o meu dinheiro também, não só gerenciar o dos outros”. Uns quatro anos antes de sair da Sadia eu comecei a ter essa percepção, comecei a ler bastante, livros na área de educação financeira, por exemplo, “Pai rico, pai pobre”. Nesses últimos quatro anos eu comecei a utilizar muito melhor o meu dinheiro. Depois, fora da Sadia, pude construir muito mais do que os 20 anos passados, comecei a entender a importância de você gerenciar a sua vida, o seu negócio, e que você tem que ter no mínimo duas profissões: uma é aquela que você faz no dia a dia e a outra é cuidar do seu dinheiro. Quando saí da Sadia, eu fiz representação comercial, como a gente já tinha essa noção financeira junto com a associação comercial de Dois Vizinhos. A gente tinha uma afinidade, conversávamos muito sobre essa questão, e a gente percebeu uma necessidade de trabalhar isso em função da inadimplência. Quando você tem acesso à informação – que loucura, que inadimplência que nós temos – e você olha o universo dos empresários, por exemplo, tem poucos associados, mas tem mil e poucas empresas e dá um percentual elevadíssimo, assustador. Aí que veio a ideia de criar um projeto de educação financeira, começar a trabalhar as famílias, os empresários e na escola. Em Dois Vizinhos nós trabalhamos dois anos na turma da 7ª e 8ª, eu dei palestra, fui montando o meu material, porque não tinha material disponível no mercado, a não ser por alguns livros, e eu fui estruturando um material da educação financeira um pouco mais na realidade que precisava. Nós criamos o orçamento familiar, criei algumas cartilhas com exercícios que nas escolas a gente utilizou, depois eu dei a ideia do livro “Aprenda a cuidar do seu dinheiro”, resolvi atualizar ele e ampliar, troquei o nome coloquei “Como gerenciar o seu dinheiro”, o segundo livro é “Descubra a pessoa rica em você”, pra mostrar pra pessoa que ela tem o potencial dentro dela.

 

JdeB – Tem gente que pensa que educação financeira é só pra quem ganha bastante dinheiro.

Luiz – Não. Tem gente que ganha muito e tem pouco, é muito mais a forma como se gasta o dinheiro – como eu estou gastando, onde eu estou gastando. E a verdade é assim: gastou mais do que ganhou vai pro pau, isso é país, é Estado, é município, é empresa, é entidade, é família. O que você vê mundo afora, hoje? Os países gastando mais do que produzem, isso é ingerência, é falta de gestão. O país tá assim por quê? Porque teve gente incompetente lá na frente. Um exemplo de funcionários: eles ganhavam mil reais cada um, na família com filhos a realidade é a mesma, mas um tinha uma qualidade de vida muito superior, tinha organização. Por exemplo, se eu comprar um bem que custa 500 reais, em 10 meses dá um juro de 5% – ele vai me propiciar no final 815 reais -, mas se eu esperar um pouquinho e comprar à vista, posso comprar esse bem a 450, porque o comércio me dá desconto. Essa é a diferença da família melhor organizada, porque ela sabe como gastar o dinheiro. Maturidade financeira é entender que tem que saber esperar um pouquinho pra comprar na hora certa, aí entra disciplina, controle, enfim. Com certeza o sucesso do cara é diferente.

 

JdeB – Você falou e parece que é uma coisa óbvia, mas como é que muitas pessoas não percebem isso, elas vão na onda dos outros?

Luiz – Dentro da experiência da gente, são três causas que fazem com que as pessoas caiam nessa armadilha. O status social é uma: é você comprar coisas, frequentar lugar que você não pode. Outra é a cultura consumista: o mercado pressiona, faz propaganda, faz coisas ligadas à emoção, que nem os carros com o design, é produto com esse design que chama a atenção e isso é a lei do mercado, e isso vai continuar assim e não adianta você brigar contra ele. O terceiro ponto mais importante é falta de educação financeira, é formação do modelo mental. O Japão tem educação financeira nas escolas desde 1970, eles ensinam as crianças desde os 5 anos de idade; na China a mesma coisa. No Brasil agora, felizmente, está sendo obrigatório no ensino médio, nível estadual, é questão também das escolas irem adaptando. Se nós não educarmos as pessoas financeiramente, elas se deixam levar facilmente pelo modismo, pelo supérfluo, pela pressão do marketing e assim por diante, porque é inerente à pessoa querer, nosso cérebro é preparado pro desejo, e se você não tem uma disciplina que molde esse comportamento, é essa a tendência que está acontecendo, a pessoa compra pra se satisfazer, e algumas se tornam impulsivas.

 

JdeB – Tem gente que argumenta que o dinheiro é delas e elas fazem o que bem entendem.

Luiz – Sim, o dinheiro é delas e elas podem fazer o que querem, desde que elas gastem o que realmente ganham, que seja dinheiro delas efetivamente. Se eu ganho mil, o meu dinheiro é mil, não é 1.500 porque eu tenho um cartão de crédito. Daí chega no mês pra pagar e ela não consegue, fica com débito de 500 pagando juros de 12% ao mês, o cara quebra. Tem que entender que é meu aquilo que oficialmente eu ganho, porque nós temos que ter uma responsabilidade social, com relação até à questão de compras, as bolhas econômicas que acontecem. Bolha imobiliária dos Estados Unidos aconteceu, tá começando agora uma bolha de carros no Brasil. O cara entra, acha que o dinheiro é dele, mas compra sem dinheiro, depois não consegue pagar. Eu tenho que ter responsabilidade sobre aquilo que compro, primeiro sobre mim, sobre a família e sobre a sociedade. Se eu deixar de pagar, com certeza pra quem eu devo tem grande possibilidade também de deixar de pagar e aquele outro vai deixar de pagar um terceiro e assim vira uma bolha, um efeito em cascata; e eu posso ser um motivador de uma desgraça financeira na sociedade. Eu chamo isso de consciência, maturidade e responsabilidade social. A questão do endividamento, do dizer que eu faço o que eu quero com o meu dinheiro, não é bem assim, desde que você gaste aquilo que você ganha.

 

JdeB – As pessoas entendem isso rápido ou demoram?

Luiz – Elas entendem se passarem por um processo de educação. A criança de 5 anos entende muito mais fácil do que o adulto. Não que não possa aprender, mas ele demora um pouco mais. A saída pra isso, eu não tenho dúvida, é a educação. Até o impulsivo, que chama de uma doença oniomania, que é a doença da pessoa compulsiva, essa pessoa não adianta tomar remédio, não vai sarar, o que vai sarar é ela entrar efetivamente numa escola firme de educação financeira, se disciplinar financeiramente, é o único remédio.

 

JdeB – Sua preocupação maior hoje é a educação financeira com adultos, com crianças ou com jovens?

Luiz – Com todo mundo, desde criança, já dei palestra pra criança, pra jovens. Na Vizivali, por exemplo, passei nas turmas, gostei das ideias de pauta, introduzi isso no primeiro ano; dei quatro horas de educação financeira nas quatro turmas da Sudotec, uns jovens de 17, 18 anos, mas eu bem que queria eles com 7, 8 anos. Já dei palestra pra empresários, pra adultos, pra famílias, pra empresas, de modo geral.

 

JdeB – Idosos aposentados também têm problemas?

Luiz – Aposentados também, 83% dos aposentados hoje têm a renda deles comprometida no financeiro. O pior é que não é problemas do aposentado. Sabe onde é que o problema está? Primeiro o governo segurando o dinheiro, liberar esse negócio que os coitados podiam financiar, já tem um pouco, e daí ajudou a afundar. Daí entra o filho, entra o genro, entra não sei mais quem e é financiamento com esses caras, e os coitados se arrebentam mesmo. O dia que eles abriram financiamento pros velhinhos aposentados, vai ser o fim dos caras, porque hoje são poucos os que têm disciplina financeira. Pessoas que têm economia financeira no mundo na idade de 60, 65 anos de idade é 3%, e os outros 97%? As estatísticas mostram que esses 3% têm plano de vida de médio e longo prazo, eles sabem o que querem, eles fazem de preferência até por escrito tudo o que eles querem. Em 1953, a universidade de Harvard fez uma pesquisa para os universitários que saíram, uma das perguntas era “quem de vocês tem plano de vida de médio a longo prazo, escrito?” Só 3%. Depois de 20 anos voltaram a fazer pesquisa com esses mesmos alunos, os 3% tinham muito mais do que os outros 97% juntos, mas o resultado que é mais interessante é que eram pessoas mais alegres, mais felizes, mais saudáveis, mais entusiastas, menos estressadas… Então você percebe que é importante as pessoas terem um sonho e escreverem esse sonho. Isso a gente fala muito nas palestras, se você não tiver um sonho por escrito, você não vai a lugar nenhum, se você não sabe pra onde quer ir, qualquer caminho tá bom, nem que seja no vão do poço.

 

JdeB – Voltando à sua vida pessoal, qual foi a experiência que mais gostou: ser pai ou ser avô?

Luiz – (risos) A sensação das duas foi boa. Eu vejo que ser pai é uma emoção limpa e, como você planeja isso, pra mim foi muito gratificante o momento, mas não posso esconder que foi um grande momento de felicidade saber que nasceu bonitinha [a netinha Sofia] e você fica com uma ansiedade que parece até maior. É interessante isso, você passa a ser mais coruja, parece que você fica mais preocupado, quer dar mais atenção, principalmente como a nossa situação [Sofia nasceu prematuramente]. Mas é a vida.

 

JdeB – A sua aposentadoria mudou apenas o local de trabalho porque não diminuiu o ritmo e os compromissos?

Luiz – Não, eu me planejei, fiquei um ano planejando minha saída da Sadia e até planejando o que efetivamente ia fazer, daí eu não me preocupei. Eu até prestei consultoria uns quatro anos e meio, 10 anos já fora da Sadia, hoje eu tenho até uma empresa, a Finaplan, de consultoria e planejamento. Eu planejei da seguinte forma: preciso fazer coisas pra atender um pouco mais até as minhas necessidades pessoais, até da família, de poder viajar com mais tranquilidade, como tenho viajado bastante. O ano passado a gente viajou muito, este ano a gente resolveu dar uma segurada até mesmo em função da neta que nasceu e tem umas reformas na loja, e de estar continuando a contribuir no meio social. Eu vejo que, enquanto cidadão, a gente tem responsabilidade no meio que se está inserido, porque se esse meio no qual você está inserido não está indo bem, você também é culpado, então tenho que entender que eu tenho responsabilidade com o avanço do meu local. E eu diria que essa é uma das decepções minhas com relação a muitas pessoas na nossa cidade, porque têm todo um potencial e não se dedicam, ficam na desculpa de que não têm tempo, e não é verdade, as coisas não são sagradas e você tem tempo pra tudo se você quiser, é só questão de gestão de tempo, e é só entender que você tem que contribuir para a sociedade. Eu sempre tive isso comigo, por isso que eu sempre estou me envolvendo numa coisa ou em outra.

 

JdeB – Vamos falar um pouco do lado da fé, da religião. O senhor foi seminarista, mas desistiu, não quis ser padre?

Luiz – Na verdade, são momentos que se passam na vida e que você começa a olhar as coisas e depois você vai percebendo que esse não é o caminho melhor pra sociedade chegar, tem que entender que você tem muitos meios de como fazer o melhor pra sociedade. E eu achei que devia ter a minha família e a partir daí cuidar da minha vida profissional o melhor possível, e dar o melhor de mim pra sociedade de outra forma, que é o que eu estou fazendo, mas em nenhum momento eu descartei a fé, a questão da religiosidade, desde pequeno, até a questão cultural da família, mas principalmente da convicção que tenho que pessoa sem religião, sem fé, não vai a lugar nenhum. A gente fala que a fé é o que te impulsiona a fazer as coisas, a força do entusiasmo está nessa fé que muitas vezes você tem no acreditar, na confiança acima de tudo em você. Tudo bem você ter essa relação superior com o criador, com Deus, mas acima de tudo essa relação consigo mesmo, é você confiar em você e nos seus propósitos, nos seus sonhos. Um ditado fala que a fé proporciona poder pra você vencer, porque ela te dá inspiração e é até uma fonte de sabedoria.

 

JdeB – Uma pessoa sem religião, sem fé, é permanente ou é apenas uma fase da vida?

Luiz – Eu diria que é uma fase da vida porque, agora não me lembro qual o poeta que não acreditava em Deus, no entanto ele morreu rezando. Essa questão da fé, são fases da vida, principalmente dos jovens que acham que eles são donos da situação, aquela questão da autonomia, da independência, acham que não precisam de ninguém. À medida que vai avançando, tenho a experiência dos meus pais e muitos idosos, a pessoa se apega muito mais à oração, à fé.

 

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