Um dos médicos mais conhecidos de Francisco Beltrão e toda a região veio do Rio Grande do Sul já formado e com um pouco de experiência, mas ainda era solteiro. Devia substituir o dr. Walter Pécoits que assumia o cargo de deputado estadual. Os dois acabaram sendo sócios, junto com Euclides Scalco. Nesta entrevista concedida à equipe da Rádio Onda Sul, dr. Mário recorda aqueles primeiros tempos e outros também marcantes. E ele também faz críticas à medicina de hoje. E recebe mensagens dos ouvintes.

Mário Vargas Junqueira da Rocha é natural de Passo Fundo (nasceu em 2 de maio de 1934), filho de Laura e Antonio, tinha seis irmãos. No vestibular para Medicina, ficou em 16º lugar.
Após trabalhar um tempo em Barra do Rio Azul, próximo a Erechim (RS), instalou-se em Francisco Beltrão no ano de 1962, e aqui exerceu a medicina. Aqui também casou com dona Ivone Vanzin e teve seus dois filhos, Fernando e Ricardo, hoje ambos médicos também.
Sobre a fama do Dr. Mário na região, no seu 70º aniversário (2004), foi publicado no Jornal de Beltrão o seguinte texto: “Em cada cantinho deste Sudoeste, há sempre alguém que foi atendido, tratado, ou operado pelo Dr. Mário, que não precisa que seu sobrenome seja citado para que venha logo a identificação. Quando se fala em Dr. Mário, aqui no Sudoeste do Paraná, todos sabem que se trata de Mário Vargas Junqueira da Rocha”.
Quinze anos atrás, sua ficha de pacientes já era de 80 mil. Mesmo depois de ter deixado a direção da Policlínica, ele continuou exercendo a medicina e ampliando sua lista de pacientes.
Nesta entrevista, concedida à equipe da Rádio Onda Sul (Luiz Carlos Bággio, Ademir Macagnan e Éverton Leite), ele conta desde o início de sua carreira de médico.
Desde a formatura a sua vida em medicina foi em Francisco Beltrão?
Fiquei três anos num pedacinho do céu, Barra do Rio Azul, e um dia o pai do dr. Walter chegou lá no hospitalzinho e me disse: “Eu vim lhe buscar para ir pro Paraná”, e eu: “Não estou interessado”. Ele: “Não, mas o rapaz passa aqui amanhã e te leva”. Falei com as freiras do hospital, e uma freira, a chefona do hospital, disse que não, mas uma freirinha, a dona Clotildes, muito boazinha, disse: “Vai, nunca se nega uma oportunidade na vida”. Aí eu fui a Passo Fundo, minha mãe era viva e eu disse: “Mãe, acho que vou para o Paraná”. Ela: “Ah, meu Deus, o que você vai fazer no Paraná? Está louco?” Eu: “Eu vou ali pro Sudoeste.” Ela: “Deus me livre, uma terra de bandido!” Eu: “Mas mãe, eu não vou brigar com os bandidos, eu vou tratar dos bandidos”. Aí ela ficou meio assim. No outro dia eu e um morador da Barra do Azul viemos, o Nelson Granzoto, numa Rural do dr. Walter
Só estrada de chão?
Poeira, poeira e poeira. Nós chegamos aqui marrom, e aqui na esquina tinha barbearia. Nós fomos na casa do dr. Walter, no hospital de madeira, e a moça disse: “ele foi fazer a barba”. Ali o dr. Walter olhou bem e disse “subam lá pra Idalina dar um banho em vocês”. Cheguei lá pra empregada e falei “mandaram nós dar banho aqui”. Aí ela arrumou dois banheiros e nos fez tomar banho e ficar com um ar de gente, né, aí fiquei 5, 6 dias aqui e voltei pra Barra, arrumei um colega que era de Erechim para ficar lá e vim embora. Eu cheguei definitivo aqui em 23 de janeiro de 1963. Cheguei às 14h e, às 14h30, o dr. Walter pirou pra Curitiba, porque ele tinha sido eleito deputado. Aquele rapaz que me acompanhou na primeira visita aqui faleceu, e a senhora dele mora aqui em Beltrão, ela morava ali perto do Araucária fazendo agnoline, e agora diz que está fazendo agnoline ali perto do Ítalo, não fui lá ainda. Então cheguei aqui, Beltrão era pouco mais do que nada, se tinha seis mil habitantes, eu atendia no hospital de madeira
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Onde era?
Aqui em cima onde tem dois prédios, na Rua São Paulo antes do Araucária, pra baixo da Escola de Dança da Mirna, ali tinha um hospital de madeira e eu atendia. Com seis meses eu cheguei no farmacêutico e disse pra ele: “Se nós não fizer um hospital eu vou embora”. E ele me disse: “Eu e o dr. Walter não vamos fazer um hospital”. “Está bom, então eu vou embora”. Levou mais uns seis meses e naquela época eu saía, era solteiro, e não tinha jeito, saía ao meio-dia e ia comer em casa estranha, saía de noite e ia tomar sopa de agnoline, eu acho que em um ano aqui eu devo ter tomado umas 250 sopas de agnoline, no fim do ano eu não podia nem ver galinha viva. Daí mais um tempo eu cheguei e disse pro (Euclides) Scalco: “Eu vou fazer um hospital”. Aí comprei do Pedro Marcon que morava ali no Vila Nova, era um dos poucos moradores do Vila Nova, os lotes da Policlínica e telefonei pra Erechim porque eu era solteiro e quando trabalhei lá em Barra do Rio Azul era 20, 29 km de Erechim e eu ia todo final de semana para Erechim e tinha um companheiro lá de festa que era engenheiro, o Ruther, era alemão. Telefonei pra ele: “Luther, eu preciso fazer um hospital”. Ele veio aqui, foi pra lá e me mandou a planta. Aí eu cheguei a abrir a farmacinha do Estado, uma escrivaninha tosca branca e mostrei: “Olha o meu hospital” e ele pegou e me disse “humm” e o Ruther tinha vindo da Alemanha e tinha feito um curso de hospital e me mandou uma planta estilo enxaimel, aquele alemão, com beiral pra fora. Ele me mandou aquilo e dali uns 15 dias ele veio ali, olhou o terreno e me disse “corte assim, assim e assim”. Digo “mas aqui não tem pedreiro”. Aí o Ruthes disse que arrumava uma turma e eu pensei comigo “vai sair o olho da cara, mas fazer o que”. Mais uns dias, o Scalco chegou e disse “eu entro na sociedade”. O dr. Walter veio de Curitiba e eu não sei o que que o Scalco disse pra ele “eu também entro”, levou mais uns dias e o Scalco disse assim “eu e mais uns fizemos uma firma de construção, você nos deixa construir o hospital?” “Deixo, né.” A firma era a Empretec, doutor Deni (Schwartz) grande amigo, o irmão dele o Ademir, o Scalco, se não me engano, o Natalino Faust e mais um, e não me convidaram, ninguém entendia nada, acho que eu entendia mais de construção do que eles

E não te convidaram para sociedade?
Não me convidaram, quando estavam terminando o primeiro corredor da metade pra lá na Policlínica, ali que desce que era cozinha e área de serviço, eu fui lá e disse “aquele corredor está torto” mas o pobre do menino que arrumaram para ser o chefe usava um óculos que tinha dois fundos de garrafa. Mas a Policlínica saiu, no que ficou pronta virou “O hospital do Dr. Valter”, eu nunca fiz as coisas pra aumentar meu nome, a única coisa que tem na Policlínica é um erro que é meu, Paula, porque o hospital do Dr. Valter é São Vicente de Paulo, e na hora que nós sentamos para discutir como íamos fazer eu disse “vamos botar Policlínica São Vicente de Paula”. Por que Paulo? Vamos colocar Paula daquela cidade da Itália, Paula”. Aí ficou Paula.
O senhor foi o 2º médico a chegar em Beltrão?
Não, quando eu cheguei aqui tinha saído o dr. Laercio e tinha saído um que trabalhava com o dr. Arizone e o dr. Kit já tava aí. Em 63 já estava com o hospitalzinho dele, depois vieram quilos de médicos
Hoje são mais de…
Ah, deve ter uns 200, tem gente que me dão o nome e eu pergunto quem é, é médico.
Inclusive tem uma senhora que mandou um recado, a dona Marizete Araújo, ela disse que você fez o parto da filha dela, que hoje está no 5º ano de medicina fazendo plantão no hospital Regional, e ela quer parabenizar o Dr. Mário pelo profissionalismo e excelente pessoa, muita gente elogiando o dr. Mário, agradecendo e parabenizando pela entrevista, ouvinte dizendo: “Muita gratidão ao dr. Mário, que fez muitos partos e sempre cuidou muito bem da minha mãe, que Deus abençoe, muita saúde a ele, quatro de nós nascemos com o dr. Mário, amor e gratidão, Sueli. Dr. Mário, uma coisa que o senhor estava comentando hoje, muita gente tenta simplificar a medicina, por exemplo hoje a gente fala em Alzheimer, qualquer doença de idoso a gente fala que é Alzheimer
O ser humano não tem direito de envelhecer, se ele chegar a uma certa idade “ah, esse cara está com Alzheimer” e isso é muito ruim porque tira uma parte do tempo de vida. Você falou ali dos irmãos que nasceram comigo, eu tenho um menino que andava de parapente, o Ademir Rosseto que fez 50 anos. Faz 50 anos que eu dei umas palmadinhas nele pra depois amarrar o umbigo, e agora o menino está mal em Pato Branco, mas isso são as vontade de Deus
Como era ser médico naquela época, nos primeiros anos de Francisco Beltrão?
Muito melhor do que agora. A gente tinha recursos, olho, ouvido e mão e a gente era instruído dentro deste princípio, aproveitar os seus conhecimentos e a sua sensibilidade. Agora estão falando de medicina pela internet, à distância. Pra mim a humanidade está em degeneração e nós estamos perto de sofrer aquilo que os dinossauros sofreram, o fim da raça humana, porque os homens não fizeram nada pra merecer, destruíram tudo o que tinha de bom nesse mundo, hoje em dia não tem recurso em lugar nenhum, pobre não tem vez, rico é atendido por medo que se botem contra os donos do poder, existem donos do poder por todo o mundo, alguns deles são idiotas perfeitos, não respeitam a coisa que eu aprendi a respeitar, a vida. Esses dias me falaram que eu não acreditava em Deus. Aí que está o engano, eu acredito no Deus que fez o homem, não nos deuses que os homens criaram
Ser paciente do dr. Mário, gostaria até que ele confirmasse ou se é uma lenda, muitos pacientes não bastavam o medicamento para melhorar, eles tinham que ver o dr. Mário, é verdade isso?
Um pouco é lenda, mas eu ainda to atendendo, dando receita pros pobrezinho que pedem remédio na farmácia da Prefeitura, e os colegas não dão uma receita sem cobrar uma consulta e a cada seis meses eles chegam ali pra reformar, e às vezes me dizem “que bom que ele vive”, mas não tenho nada de santo (risos)
Dr. Mario o senhor falou que o recurso que vocês tinham era a visão, a fala e a audição, por que hoje em dia, eu sempre lembro de você quando as pessoas me falam, a pessoa vai no médico, o médico pede um monte de exames aí manda pra um especialista daquela área que pede mais exames e às vezes não é aquele problema, manda pra outro especialista, hoje a medicina está muito fragmentada, tem especialista de tudo, muita especialização e a pessoa tem que fazer peregrinação por muitos médicos, um punhado de exames para descobrir
É, o encarecimento da medicina tem prejudicado muito, mas muito mesmo.
Na sua época pediam-se poucos exames?
O Dr. Paulo Virmond veio pra cá anos depois que eu estava aqui, que foi o primeiro laboratório, eu tinha um raio x no hospital que era um pouco mais do que um fusca velho, a gente tinha que examinar. Eu discordo com muita coisa que tem na medicina, acho que tem muitos entrando na medicina com outros interesses além da medicina e lamento por aqueles que têm vontade de ser médico e tem uma medicina em escolas inclusive, e tivemos a infelicidade de ter abertura de muitas escolas de medicina que não resultam em grandes favores para a população. Tem uma história que eu não vou contar mas se a Cintia que foi secretária de Saúde quiser ela conta, a respeito da nossa faculdade aqui.
Já são muitas manifestações aqui, o Jair Reis está dizendo assim: “Bom dia, estamos ouvindo o dr. Mário, eu e minha esposa, nós temos as mãos desse abençoado em 1965 que Deus abençoe esse homem. Outro ouvinte mandando “que legal a entrevista com o dr. Mário, a gente fica sabendo um pouco da história da nossa cidade, dos tempos passados e também das dificuldades, obrigado a todos os pioneiros da nossa cidade e que Deus abençoe o dr. Mário. Ouvinte que mandou Andréia dos Santos: “que bom escutar essas histórias, que belo programa, nossa ouvinte Jair Valter, “grande dr. Mário, cuidamos do Rotary por oito anos. Dona Adelina hoje com 84 anos está mandando um abraço pro Dr. Mário, “Oi, bom dia, sou a Nelci Galvan, lembro bem disso quando era criança o dr. Mário foi médico de toda a minha família, família Galvan, hoje o filho do dr. Mário, é nosso cardiologista, dr. Ricardo”. Dr. Mário e quando o senhor veio pra cá, você levou um susto muito grande com Beltrão, o tamanho da cidade? Sempre acostumado com um centro maior?
Eu nasci em Passo Fundo, com 17, 18 anos fui pra Porto Alegre cursar medicina e depois vim pra Barra do Rio Azul, lá se tiver 300 habitantes hoje tem muito, é um município do Rio Grande do Sul, a 29 km de Erechim. Tem 147 km² o município, fica perto de Barão do Cotegipe, Aratiba…
Quantos da família Nesi o senhor trouxe ao mundo?
Ah, não sei, eu dei umas palmadinhas nos Nesi mas eu não contei, também não sei quantos mil eu tive a felicidade de ver nascer.
Sobre a natalidade infantil que hoje se perde muitas crianças, como era na época?
Olha, era bastante raro, ainda no hospital velho faleceu um menino de poliomielite, um dos poucos pacientes que eu tenho uma lembrança como se estivesse vendo, não tínhamos recursos, não tínhamos tratamento nada e veio mal, ele tinha quatro anos, e muitos anos que eu tive a oportunidade que eu não gostaria de ter tido de ver passar a eternidade que deixar lembrança, agora esse menino, ele até me emociona lembrar dele mas nós não temos o dom da vida, nós temos o dom de ajudar quando possível
O componente emocional, a fé, é importante para o processo de cura?
Eu acho que é, e a tranquilidade do médico, a impressão que ele passa para o cliente ajuda muito.
Por que tanto câncer hoje?
É muito fácil, você pega qualquer coisa como esse copo da água e veja embaixo, ah, é um produto com açúcar, etc etc e depois? Corantes, acidificantes, tudo que é princípio químico tem ali e os nossos pais, nossos avós foram criados comendo banha de porco, que a banha de porco já foi vilã e agora está voltando porque as indicações vão e vêm, ovo, não pode comer ovo, agora tão mandando comer quatro ovos por dia isso aí é por que não tem certeza do que dizem nem o que fazem e infelizmente a medicina sofre com isso porque nós temos que ser racionais, pensar naquilo que estamos comendo, que preparamos para a família inteira comer e não é produto orgânico, gorduroso, ou isso e aquilo que vai fazer mal. O que faz mal são as adições químicas que tem na alimentação.