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Francisco Beltrão
quarta-feira, 04 de junho de 2025

Edição 8.219

05/06/2025

Renato Krindges: A disciplina herdada dos pais

Renato Krindges, empresário do Sudoeste que virou destaque estadual neste ano com o prêmio Honra ao Mérito da Fiep (Federação das Indústrias do Estado do Paraná), se considera uma pessoa igual às outras, com limitações e risco de cometer erros, mas sua história mostra que vem de uma família que desde cedo lhe ensinou a disciplina no trabalho e o respeito às outras pessoas. É o que ele mostra nesta entrevista, concedida em seu escritório da Krindges Industrial Ltda, no centro de Ampere.
Tanto o pai de Renato (Arthur Krindges) como a mãe (Hilária Ludwig) são descendentes de alemães. Casaram em Venâncio Aires (RS), onde nasceram os três primeiros filhos: Maria Carmelita (Carmen), Renato e Luiz. Depois que a família mudou para Guaraciaba (SC), nasceram Rosane e Jorge.
A mudança para Santa Catarina foi para facilitar o trabalho do pai, que transportava madeiras. Mas a mãe, que era costureira, acabou levando toda a família para o ramo de confecções. Nos anos 70, Renato percorria o Sul do país vendendo produtos fabricados pela família. Em Ampere, recebeu a proposta de abrir uma loja. Ele topou e trouxe a família. A loja prosperou e, daquele grupo, em 1997, surgia a Krindges Industrial Ltda, uma das maiores indústrias de confecções de todo o Sudoeste, com mais de mil funcionários.
O pai faleceu em 1996. A mãe continua em Ampere, aos 80 anos. Renato é o diretor presidente da Krindges, empresa que conta também com os irmãos Carmen e Luiz. A esposa de Renato, Clareni Fistarol, que também participa com ele da direção da empresa, é de família tradicional de Ampere. Eles casaram em 1985 e têm dois filhos: Leonardo, de 22, e Ricardo, de 17 anos. Segue uma parte da entrevista.

JdeB – A gente poderia começar contando como é que um gaúcho de Venâncio Aires virou corintiano.
Renato – Quando eu era menino, eu torcia pro Internacional, era colorado e tal, mas depois, com 16 anos, meu pai me levou a São Paulo, fiz umas viagens com ele, ele me levou pra assistir alguns jogos em São Paulo e, por coincidência, sempre fomos ver jogos do Corinthians. Meu pai indiretamente também era corintiano, ele gostava, e realmente quem assiste um jogo com a torcida do Corinthians, vira corintiano sem querer, muita emoção. E meus filhos também, minha família toda é corintiana, vamos assistir jogo e tudo.

JdeB – E no Grenal, o senhor torce pra quem?
Renato – Ah, no Grenal eu sempre sou colorado. (risos)

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JdeB – Agora, além dessa influência na definição do time, o seu pai lhe herdou algo muito importante: o segredo de abrir portas. Como é essa história?
Renato – Na verdade o meu pai, primeiramente a grande dificuldade que ele teve foi a questão da língua, porque ele era um alemão que falava português, mas muito arrastado, muito mal, a escolaridade dele foi toda em alemão, e ele foi realmente uma pessoa que enfrentou, foi ele que abriu as portas em São Paulo pra gente, ele conseguiu  uns créditos iniciais, e esse tipo ele passou pra gente. A mãe também, ela passou a parte da costura; ela casou muito nova e ensinou todos os seus filhos a trabalhar. Uma família de enfrentar, de muita luta e sem temer qualquer coisa, de trabalhar, de alcançar as metas, os objetivos, e isso parte da minha mãe, isso é próprio dela, hoje ela está com 80 anos, e sempre foi aquela pessoa que pra ela não tinha hora, o que ela gosta mesmo é do trabalho, de realizar, e a família toda, o pai também tem grande influência na nossa educação e isso parte muito da família, ela foi criada em volta de princípios morais, como se fala, princípios de coisa boa.

JdeB – Ele era daqueles alemães que falavam com sotaque?
Renato – Sim. Até minha mãe, hoje ela tem sotaque forte, em casa ela fala tudo alemão, meu pai e minha mãe só falavam alemão. Quando a gente ia lá passear, quase todo dia, antes dele falecer, a gente só falava alemão. Eu também treinei bastante a língua, hoje falo razoavelmente o alemão, quando vou pra Alemanha. Graças a Deus, eu tenho me virado muito bem.

JdeB – E em casa, quando pequenos, vocês falavam só alemão?
Renato – Só alemão.

JdeB – Mas a língua não foi empecilho pra abrir portas?
Renato – Não, não, porque na verdade a língua até contribuiu. Nós (alemães) temos alguns princípios, diz que a gente teima, nunca teime com um alemão porque o alemão sempre tem razão, sempre quer ter razão. Mas quem conhece a Alemanha sabe muito bem disso, eles são muito, muito certos, eles querem as coisas certas e isso, graças a Deus, herdei do meu pai e da minha mãe.

JdeB – Então um dos ensina- mentos do seu pai foi a honestidade?
Renato – É, a honestidade, a pessoa certa, a pessoa bem na vida, ela pode ter algumas dificuldades, mas ela sempre, a honestidade, ser correto, em qualquer situação. E lá na frente você sempre sai ganhando, a pessoa correta consegue alcançar os seus objetivos.

JdeB – O seu pai começou como agricultor. Como foi que ele entrou no comércio?
Renato – Meu pai faleceu com 69 anos, mas ele, na verdade, o início da vida, tanto a minha mãe como o meu pai, quando ela tinha uns 14 anos, ela fez corte e costura, e todos nós herdamos a profissão, foi o princípio de tudo. Mas a família toda é da parte de agricultura.

JdeB – Então essa parte de confecções vocês aprenderam com a mãe?
Renato – Com a mãe. Nós começamos muito cedo. Eu com 11 anos costurei o meu primeiro terno. Isso que foi graças a ela, ao ensinamento dela, porque com cinco anos a gente já ficava do lado dela com ferrinho de costura, meio brincando, fazendo de conta que tava trabalhando e com isso ela conseguiu que a gente aprendesse rapidamente a profissão. Então eu já costurava calça, por exemplo, e com 11 anos eu costurei o primeiro terno, como alfaiate um menino de 11 anos. Eu tenho hoje fotos disso, a minha mãe, graças a Deus, ela registrou esses momentos e isso hoje faz parte da nossa história. Conhecendo a sua profissão, conhecendo aquilo que você faz, você tem grande chance de crescer.

JdeB – O seu trabalho, então, foi esse de confecção?
Renato – É, eu sempre, desde menino, trabalhei na confecção. Fiz contabilidade, trabalhei na área de vendas, na área de comerciais, e isso sempre fez abrir mais horizontes, porque a gente começou com isso, tanto eu como meu irmão, na contabilidade, mas basicamente temos trabalhado desde menino.

JdeB – E como seu pai entrou nas confecções, ele era caminhoneiro de transportar madeira?
Renato – Quando o meu pai veio morar em Guaraciaba (SC), o pai e a mãe acharam por bem de ele ficar mais por casa e tal, porque são viagens longas e na época não existiam estradas. Falo de uma coisa assim de uns 50 anos atrás, eu era muito menino, eu cheguei em Guaraciaba com 6 anos e hoje estou com 56. Meu pai puxava madeira, tinha um posto de madeira em Venâncio Aires (RS), e houve uma época que era muito complicado, sempre tem as dificuldades, em cada atividade que você faz, e meu pai sempre conta que houve uma época que tinha muitas dificuldades com estrada, de coisa, praticamente era impossível esse transporte de Guaraciaba e Venâncio. Ele chegava a ficar parado, pegava um mês de chuva não tinha estrada. Chegou uma altura que ele cansou disso, aí a minha mãe animou ele, e ele acabou aprendendo a profissão de alfaiate.
Aí trabalhavam juntos, em Guaraciaba, montaram uma lojinha e tal e, com a profissão de alfaiate os dois, foi como nos deram sustento. Sempre agradeço a eles, consegui através deles ainda fazer um curso técnico de contabilidade e isso me ajudou muito na vida, porque vamos falar de uma coisa ali de 35, 38 anos atrás, faculdade nas nossas regiões aqui não existia, a faculdade mais próxima do Paraná era Curitiba, em Santa Catarina era Florianópolis, faculdade era coisa pra poucos. Quem tinha um curso de contabilidade, o contador era o doutor da época. Graças a Deus, meu pai e minha mãe conseguiram me dar esse estudo e eu agradeço até hoje porque tem me ajudado muito na vida, porque o técnico de contabilidade naquela época a gente aprendia realmente a fazer uma contabilidade numa empresa.
Muitas vezes, hoje, a pessoa sai duma faculdade, mas não sabe fazer contabilidade, já quer fazer cursos, pós-cursos, e nós não, a gente já saía de lá técnico mesmo, a gente saía de lá sabendo a profissão e isso tem realmente me ajudado muito na minha vida, porque hoje você analisa um balanço, você sabe se uma empresa está bem, ou se uma posição está correta ou não está correta, ou você pode discutir com qualquer assessor da empresa, qualquer pessoa, hoje você tem condições de chegar e dizer “olha, você está correta, ou não está correta”, então isso tem me ajudado muito, graças a eles, e esse esforço que eles fizeram pra dar estudo pra mim. E todos tiveram a mesma oportunidade de estudar e praticamente todos aproveitaram.

JdeB – Pela lei atual, um menino de 11 anos não poderia produzir um terno, não poderia trabalhar. O senhor concorda com essa lei?
Renato – Olha, eu, na verdade, em parte, se fosse aprender uma profissão eu até concordo, eu acho que uma criança com essa idade deveria brincar, mas na época a coisa era diferente, os antigos tinham como meta o filho praticamente a caminhar já tinha um afazer, tinha que trabalhar em casa, fazer aqui, fazer lá, era próprio da época. Lógico, as leis foram mudando, eu hoje concordo plenamente que a criança, dentro da sua idade, tem que brincar, porque ela se desenvolve também, tanto quanto trabalhar. Se tiver um acompanhamento, ela pode se desenvolver mais do que você ficando em cima de um único trabalho, mas eu acho que o brincar muitas vezes desenvolve muito. Mas eu também brinquei muito, a minha mãe, ela tinha horário pra tudo, horário pra brincar, horário pra nos alimentar, pra trabalhar, horário pra estudar, era tudo detalhado, tudo por minuto.
O alemão, é próprio dele, o pai não dizia assim: “meio-dia vamos almoçar”. Se ele falasse “meio-dia e um minuto”, era meio-dia e um minuto, tinha que estar todo mundo na mesa! Não tinha chegar meio-dia e dez. A oração da noite, era naquele horário, a hora de dormir era naquele horário, nós sabíamos o que tinha que fazer em cada etapa do dia, e isso foi o que a gente também aprendeu que quando se marca alguma coisa, você tem que ser pontual, e isso queira ou não queira, a pessoa aprende. Muitas vezes eu fico muito indignado porque marca uma coisa pra um horário e eu chego, depois de meia hora chega alguém pra uma reunião, eu acho isso uma falta de consideração aos que cumpriram horário. Existem momentos que, por um motivo ou outro, o cara pode ter um imprevisto, aí tudo é justificado, mas muita gente que tem por costume chegar sempre atrasado, parece que isso já faz parte do dia a dia deles, isso eu não acho correto, e graças a Deus eu estou fazendo de tudo pra introduzir isso pros meus dois filhos, que são uma parte muito importante. Se você marca alguma coisa, deve estar sempre 10, 15 minutos antes pra se inteirar no assunto, e não chegar 5 minutos atrasado que você entra na coisa perdendo o fio da meada, do negócio. Então a pontualidade é um dos princípios fortes pra pessoa, pro ser humano obter sucesso.

JdeB – Mas essa disciplina certamente seus pais não aprenderam com o povo de Venâncio Aires e sim com os avós e bisavós que vieram da Alemanha.
Renato – Sim, com os meus avós. Quem já visitou a Alemanha sabe muito bem disso, lá um ônibus, um trem, alguma coisa é num segundo, não é nem num minuto, é num segundo. Um trem chega ali aos 59 minutos e não sei quantos segundos, quer dizer, é próprio deles, a questão de organização. Eu acho que esses princípios foram importantes e estão sendo importantes pra você ganhar aquilo que você quer na vida. Eu tenho usado muitas coisas hoje, existem grandes dificuldades na atual desenvoltura do país que muitas vezes pra esses princípios realmente funcionarem, num país que nem o nosso, nós temos grandes dificuldades. Não que as pessoas estejam erradas, mas muitas vezes eles não têm isso dentro deles, essa cultura.
Talvez até eles vivam melhor que a gente, porque passam pela vida despreocupados, não ficam com tanta responsabilidade, porque tudo pra gente é responsabilidade: horário, levantar, dormir, tudo é de responsabilidade porque você tem aquele horário pra cumprir. E muitas vezes essas pessoas passam pela vida mais desapercebidas, elas têm assim um outro lado, muitas vezes não o mesmo resultado, mas se tem que sair viver, muitas vezes essas pessoas vivem mais tranquilas e vivem mais, por isso que às vezes aquela pessoa que é mais metódica, que busca a perfeição, que tem um custo, até além do que imagina, porque por dentro você sofre. Uma reunião às 9 e a pessoa chega às 9:10, poxa, você fica “mas por que eu tenho que estar aqui e a outra pessoa não?” Muitas vezes você fica constrangido com isso, mas a gente vai se acostumando. Vamos fazer 33 anos de empresa, eu passei por muitos momentos aqui, passei por muitas pessoas, graças a Deus eu fico muito feliz, a gente fez muitos profissionais bons que estão na região, que estão no mercado hoje, e todos que passaram pela gente, e pessoas que são muito gratas àquilo que aprenderam, porque na verdade ela sempre foi uma escola, pra mão-de-obra e pra vida da pessoa, se a pessoa vai pro mercado de trabalho e fala “passei pela Krindges”, ele sabe que…

JdeB – É uma referência.
Renato – Eles têm referência, eles têm um bom princípio. Aqui a gente tem uma metodologia de trabalho e disso a gente não abre mão, é uma questão de ir aprimorando naqueles momentos, em cada momento você deve estar sempre inovando e aperfeiçoando pra que realmente nada daquilo que você está fazendo fique ultrapassado. A gente tem que sempre estar inovando. Essas inovações, tanto de tecnologia como em preparação da mão-de-obra, em preparação dos profissionais. Por exemplo, a gente não aprendeu a trabalhar com computador porque era menino. Nós éramos no tempo da Facit, do tempo da máquina de escrever, coisa e tal, tinha que fazer curso de datilografia, e do tempo do telex. Hoje é uma outra tecnologia e não quer dizer que nós não vamos acompanhar essa tecnologia. Seria totalmente fora de qualquer proporção você dizer: “Não, você vai ter que trabalhar hoje com uma Facit, vai ter que trabalhar hoje com uma máquina de escrever”, não existe mais isso, um telex, em vez de passar um e-mail você passava um telex, isso não existe. Cada momento é cada momento. Nós temos que acompanhar as evoluções, a evolução é própria do homem. Tenho 56 anos e eu ainda, se Deus me der saúde, me der vida, eu vou ter muita coisa pra ver e pra gastar, eu tenho certeza que com 80 anos, se eu estiver na ativa, com certeza eu vou me adaptar tão fácil como hoje, porque isso é próprio da pessoa, a gente tem que ir inovando.

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