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Francisco Beltrão
quarta-feira, 28 de maio de 2025

Edição 8.213

28/05/2025

É preciso romper o ciclo da violência contra as mulheres

Muitas vezes as mulheres insistem em relacionamentos abusivos, mas isso tem explicação.

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Luiza Carla Beal, advogada do Numape. Foto: Leandra Francischett/JdeB.

Por Leandra Francischett – Há muitos casos em que as mulheres fazem o boletim de ocorrência, denunciando violência doméstica ou de gênero, mas acabam desistindo e até mesmo tentam retomar o relacionamento. Para entender esta questão, a advogada Luiza Carla Beal, do Núcleo Maria da Penha (Numape), da Unioeste de Beltrão, explica que é preciso considerar que existe o ciclo da violência, que é formado por três etapas.

A primeira é o aumento da tensão: relacionamentos aparentemente saudáveis, mas com início de conflitos e violência psicológica. A segunda fase é o momento da explosão, que é quando se observa a violência física, por exemplo. “É nesse momento que cai a ficha, de que se está num relacionamento abusivo. A grande problemática é que depois dessas duas fases, vem a fase da lua de mel, que é quando existe uma atribuição de culpa, há uma negociação para tentar resolver a relação, o autor da violência diz que não vai mais fazer.”

Luiza destaca que, muitas vezes, o que vai ser entendido como violência é somente aquele momento da explosão, mas essa violência vinha crescendo há muito tempo. “Por isso que às vezes existe a volta da relação, não porque se queira ficar numa relação violenta. No atendimento psicológico, no processo terapêutico, procura-se recuperar a autoestima desta mulher, para se autodeterminar melhor e observar outras formas de afeto.”

A advogada ressalta que quebrar o ciclo da violência é muito mais do que uma denúncia, para isso é necessário o diálogo na sociedade, para garantir amparo àquela mulher. “Esses momentos do ciclo da violência não são lineares, então pode ser que a fase de tensão dure anos, mas o ciclo se repete, isso se percebe quando se traça a linha da relação.”

Serviço especializado e gratuito

O Numape é um projeto de extensão presente em dez universidades estaduais do Paraná. “O Numape leva o ensino que é desenvolvido pela Unioeste para a comunidade por meio da atuação nos casos que envolvem a Lei Maria da Penha, então é um projeto que atua prestando serviço especializado e gratuito para mulheres que estão em situação de violência no Sudoeste do Paraná, mais especificamente em Beltrão.”

Segundo Luiza, por ser um projeto de extensão, atua na parte pedagógica, fazendo o trabalho preventivo; na parte jurídica,  atua tanto na área criminal, quanto do Direito de Família, em casos de divórcios, guardas e outras causas; também na parte psicológica, através da psicoterapia breve.

Como chegar a esse atendimento?

O Numape atende com horário marcado, pois devido à grande demanda não é possível atender de portas abertas. Além das demandas espontâneas, há o encaminhamento da Delegacia da Mulher e dos outros órgãos de proteção do município. Os telefones disponíveis são (46) 99126-9188, para atendimento psicológico; (46) 98421 4733, para atendimento jurídico; e o telefone fixo (46) 3520-4861. Nas redes sociais, como Numape FB.

“O que se nota é que a demanda é crescente desde sempre, progressiva. Durante a pandemia houve uma oscilação no número de boletins de ocorrência, mas ainda assim teve um aumento e agora, em 2022, também a gente tem notado. O aumento é constante.”

A que se deve isso? “Como a violência de gênero e a violência doméstica são fenômenos culturais, é difícil atribuir uma causa específica para aumento das denúncias e dos casos de violência. Por um lado, tem aumentado a informação sobre os cinco tipos de violência, mas também pode ser que a violência social esteja aumentando”, responde Luiza. 

Há cinco tipos de violência previstos na Lei Maria da Penha: física, sexual, psicológica, moral e patrimonial.

O Numape é coordenado pela professora dra. Andrea Regina de Morais Benedetti e conta com a orientação dos professores drs. Sônia Maria dos Santos Marques e Guilherme Welter Wendt. Integram a equipe Izabela Spezzia, bolsista de Direito; Andressa Antonioli, psicóloga; Renilson da Paz, advogado; Gabriel Borçato, bolsista de Direito; e Bruna Lanfredi, bolsista de Psicologia.

É preciso evitar que a voz da mulher seja calada pelo feminicídio

Por Leandra FrancischettProfessora dra. Sônia Maria dos Santos Marques, orientadora do Numape, explica a importância da compreensão de que a violência é um fenômeno complexo, isso envolve um pensamento interdisciplinar, portanto, é preciso que várias áreas do conhecimento se reúnam com este objetivo. Também é intersetorial, ou seja, é preciso que os diversos órgãos dialoguem. E é interseccional, pois há diferentes tipos de mulheres.

“Se não discutirmos gênero, nunca vamos acabar com a violência; a educação é central, para produzir novas relações de gênero, por isso a importância da formação e da informação, para que as mulheres tenham acesso ao que está disponível no serviço público.”

Sonia cita ainda a necessidade de investimento público em recursos humanos, pessoas que se especializem neste fenômeno e investimento econômico, com casas de acolhimento e de abrigamento. “Além da efetivação da lei, porque quando acontece situações limítrofes, como feminicídio, a primeira questão que as pessoas fazem é criticar a lei Maria da Penha, que é uma lei maravilhosa, o que temos que fazer é encontrar formas para que ela se efetive. A educação é fundamental para tentar produzir novas percepções de relacionamentos nos quais a violência não seja uma constante. É fundamental discutir com as crianças as formas de se relacionar, para que a violência não seja a mediadora das relações.” 

De acordo com Sônia, o Numape é uma tentativa de olhar para o fenômeno da violência a partir de sua complexidade, saber que ali é um lugar de acolhimento, de tentativa de diálogo com outros setores. “Temos um repertório que nos ajuda a caminhar e o desejo de aprender cada vez mais sobre a violência e as formas de desvelar esta violência, para que a voz de uma mulher não seja calada pelo feminicídio.”

Ato pela vida das mulheres neste sábado

A sociedade beltronense está se organizando para o “Ato pela vida das mulheres”, neste sábado, dia 2 de abril, às 10h, no Calçadão. Durante 30 minutos, a população estará se manifestando pelo direito à vida da mulher e o direito de ela escolher com quem se relacionar. As organizadoras convidam para que as pessoas participem de camiseta preta, representando luto. A manifestação está sendo organizada por quatro mulheres que se uniram em solidariedade à morte de Miriam e a outras mulheres que já sofreram por feminicídio. 

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