“O importante é o que você é, o que você sabe, não o que você tem. Isso ninguém vai tirar de você.”

“Sinto-me imensamente honrada e feliz por estar aqui hoje, recebendo o Título de Cidadã Honorária de Francisco Beltrão. Foi com surpresa e alegria que recebi a notícia de ter sido contemplada com esta honraria.
Não poderia deixar de, logo de início, agradecer à Câmara Municipal e aos vereadores que votaram unanimemente em meu nome. E agradecer especialmente ao vereador Silmar Gallina, o responsável direto pelo título que recebo hoje.
Em 1974, há exatos 50 anos, eu chegava em Francisco Beltrão. Foi uma grande mudança na minha vida. Jamais pensei em sair de Curitiba… Lá, passei a maior parte da minha vida, e lá estava minha família. Mas juntos, Roberto e eu tomamos a decisão de vir para cá.
Naquele dia, tomava café da manhã na casa da minha mãe, e ela, percebendo minha ansiedade e querendo me animar, disse: ‘Mirna, você vai ver… não vai ser tão ruim… numa cidade pequena se fazem boas amizades.’
Mas o que mais me preocupava era a educação de nossos filhos, que ainda eram pequenos. Minha criação foi pautada em valores sólidos, e a educação estava na base de tudo. Uma frase que ouvi muito foi: ‘O importante é o que você é, o que você sabe, não o que você tem. Isso ninguém vai tirar de você.’ Era a lição transmitida por alguém que superou as dificuldades de uma guerra, vindo para um país totalmente diferente e construindo uma nova vida.
Por isso, procuramos oferecer aos nossos filhos tudo o que estivesse ao nosso alcance em termos de educação e cultura, para que pudessem fazer suas próprias escolhas e lutar por elas. E foi isso que realmente fizeram. Meu filho mais velho, Tinho [Roberto Pécoits Filho], seguiu o caminho do meu sogro, Dr. Walter, e optou pela Medicina, dedicando-se hoje à pesquisa. Meu filho mais novo, Alexandre, depois de se formar em Engenharia de Computação, optou por retornar a Beltrão, trabalhando por muitos anos ao lado do meu marido Roberto e hoje servindo este município como secretário [do Planejamento].
A educação não foi apenas fundamental na formação dos meus filhos, mas também se tornou uma missão e um projeto de vida para mim. Escolhi o magistério como profissão e sempre assumi com muita responsabilidade a tarefa de formar jovens e adultos com mentes realmente abertas, livres de doutrinações e radicalismos, capazes de criar seus próprios valores e tomar suas próprias posições.
Como eu gostaria que a educação fosse realmente uma prioridade! Acredito que a educação traz liberdade e oportunidades, promove a igualdade… é ela que fará a verdadeira justiça social. E sabemos que a arte é um degrau superior da civilização.
Sou uma pessoa privilegiada, não só pela educação formal que recebi, mas por ter sido criada em um ambiente de muito estímulo cultural. Minha avó era artista plástica, pintora, inclusive premiada em sua terra natal. Eu e meus irmãos fomos criados por ela em Curitiba, já que meus pais passavam a maior parte do tempo no norte do Paraná devido aos negócios.
Inúmeras vezes, íamos com ela a recitais de piano, canto, orquestra e, às vezes, a peças de teatro. Saíamos de ônibus nas noites frias de Curitiba. São memórias que me marcaram profundamente. Algumas vezes, meus pais recebiam artistas em nossa casa após as apresentações, inclusive os patrocinando para desenvolver a arte em um ambiente ainda carente de estrutura. Lembro especialmente de um ator de teatro que acabou se tornando um grande amigo da família.
Desde cedo, também fui muito incentivada a ler, e na minha casa não havia censura; podíamos ler o que quiséssemos. Estudar artes, no meu caso, piano e balé, sempre foi um complemento à minha formação, graças ao grande incentivo que recebi da minha família.
Foi assim, com essa bagagem, em mais um dos momentos da minha vida em que precisei de mudanças, que me tornei professora de balé. Eram tempos difíceis, tempos de ditadura, e a exigência de apresentar um atestado do DOPS na rede pública de ensino me impediu de fazer o que mais amava e que também era importante para complementar o orçamento familiar. Foi então que surgiu o Ballet Mirna Pécoits.
Não sei se realmente fui a primeira professora de balé na região, mas certamente fomos a primeira escola estruturada, o que levou ao surgimento de outras escolas. Milhares de alunos passaram por minhas mãos; centenas se formaram em balé clássico, e muitos adotaram a dança como profissão no Brasil e em outros países. A dança deixou marcas em suas vidas, tenho certeza disso!
Nunca permiti que alguém deixasse de fazer parte da nossa escola por questões financeiras, porque acredito que a arte deve ser acessível a todos; caso contrário, perde seu sentido.
Falando em igualdade e oportunidade, gostaria de concluir meu discurso abordando a questão da mulher. Sabemos que mudanças culturais são sempre muito lentas. Foi preciso a luta de várias gerações para que a mulher alcançasse conquistas importantes, mas ainda temos muito a conquistar. Vejam, sou a oitava mulher a receber esta honraria, de um total de 62 pessoas homenageadas. Isso simboliza o quanto ainda temos a conquistar.
Fico muito honrada em representar tantas mulheres aqui presentes que igualmente fizeram um grande trabalho por este município e que seriam tão merecedoras deste título quanto eu.
Gostaria de aproveitar para agradecer à Flaviana Tubin que, à frente da Secretaria de Emprego, Mulher e Bem-Estar, desenvolve um belo trabalho em defesa e apoio à mulher no município.
Quero novamente agradecer aos membros do poder legislativo e executivo do município, que me concederam este título, em especial ao vereador Silmar Gallina.
Também quero agradecer aos meus colegas de trabalho de várias épocas e lugares, e aos meus colegas artistas, muitos aqui presentes hoje, que, como eu, assumiram a educação e a cultura como missão.
Agradeço às minhas alunas, ex-alunas, bailarinos e ex-bailarinos, que sempre me inspiraram e continuam me motivando até hoje.
Agradeço à dedicada equipe do Ballet Mirna Pécoits, que, com seu apoio diário, permite que eu continue desenvolvendo o trabalho que tanto amo.
Agradeço aos meus amigos dos primeiros tempos e aos amigos mais recentes, que confirmaram as palavras da minha mãe de que aqui eu faria boas amizades.
Finalmente, gostaria de agradecer à minha família de origem, aqui representada pelos meus irmãos Dragutin, Dimitrya e Alexandra, e pelos meus cunhados Cristina e Fernando. Apesar de estarmos separados pela distância todos estes 50 anos, permanecemos sempre unidos.
Também à família Pécoits, e neste momento me vem à lembrança minha sogra, Dona Manoela, e meu sogro, Dr. Walter, que me acolheram carinhosamente.
E não poderia deixar de agradecer à família que Roberto e eu construímos. Primeiramente ao Roberto, meu companheiro de todas as horas, e aos nossos filhos, Roberto e Alexandre, que tanto nos orgulham. Agradeço também às nossas noras, Martha e Edi, que muito agregaram à nossa família, e aos nossos queridos netos, Julia, Roberta, Rodrigo e Peter, que nos proporcionaram tantos momentos felizes.
Finalizo dizendo que a homenagem desta noite me dá uma sensação de missão cumprida.”