“Antigamente a gente tinha o pedreiro que fazia tudo, desde a fundação, cobertura da casa, reboco, pintura e até a parte elétrica, mas isso mudou muito”.

De alguns anos para cá, o setor da construção civil no Brasil passou por uma transformação significativa, impulsionada pelas novas exigências do mercado e pela busca por maior eficiência e qualidade nas obras. Um dos aspectos mais marcantes dessa mudança é a setorização das atividades, que tem levado os profissionais da área a se especializarem cada vez mais em segmentos específicos.
Se antes um mestre de obras ou pedreiro precisava ter conhecimentos generalistas para atuar em diversas frentes, hoje a demanda exige que esses profissionais se aprofundem em setores como fundações, alvenaria, acabamento, hidráulica, elétrica e até sustentabilidade e novas tecnologias construtivas. Esse movimento tem sido impulsionado por fatores como o aumento das normas técnicas, a adoção de materiais inovadores e a necessidade de maior eficiência nos prazos e custos das obras.
A especialização dos trabalhadores tem gerado impactos positivos tanto para os profissionais quanto para as empresas. Para os trabalhadores, significa mais oportunidades no mercado, melhores salários e valorização de suas habilidades. Para as construtoras, a setorização permite um planejamento mais eficiente, reduzindo desperdícios e aumentando a qualidade das construções.
Segmentação eleva padrão de qualidade
Vinícius Perin, presidente da Sudenge (Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Sudoeste do Paraná), avalia que a segmentação das funções dentro da construção civil trouxe um salto de qualidade para o setor: “A exigência de um padrão de qualidade aumentou bastante nos últimos anos. Antigamente era aquela casa calfinada, enfim, passava só uma pintura. Mas hoje em dia mudou muito, seja a questão da estética, do conforto da residência, entre outros fatores. E isso começou a exigir mão de obra qualificada. O material de construção já vem industrializado, tem um padrão de qualidade e começou a exigir dos profissionais qualidade no assentamento, ou iniciando desde um esquadro benfeito da parede, um porcelanato bem assentado, uma pintura muito bem feita, bonitinha, enfim. Isso é uma exigência dos nossos clientes, da nossa população. E o quê que isso acarreta? Numa especialização, nas setorizações dos profissionais. Então, antigamente nós tínhamos o mestre de obra, o pedreiro, que fazia tudo, começava desde a fundação, cobertura da casa, reboco, pintura, fazia até a parte elétrica, mas hoje em dia cada profissional atua numa parte da obra: uma equipe faz a fundação, outra faz o levantamento da alvenaria, muitas vezes tem uma equipe só para cortar e dobrar o aço da obra, dependendo do tamanho da construção. Você tem uma equipe de azulejistas, uma equipe de eletricistas, gesseiro, vidraceiro, enfim. É uma gama gigantesca de profissionais que atuam dentro da obra. Aí você tem um padrão de obra muito superior ao que a gente encontrava há 15 ou 20 anos. E isso é uma consequência dessa setorização.”
Quem não se especializar, vai ficar para trás

Vinícius Perin dá a dica para engenheiros e arquitetos recém-formados: “Essa mudança não ocorre somente com o profissional lá da mão de obra, mas também com os profissionais que projetam, que executam as obras. Hoje, se você pegar, tem um arquiteto que faz o projeto da residência, muitas vezes você pega um outro arquiteto especialista na parte de decoração para fazer a ambientalização interna. Você tem um engenheiro, muitas vezes, que vai fazer só o projeto estrutural, um outro engenheiro que vai fazer os demais projetos complementares e, muitas vezes, um outro engenheiro que vai executar a obra. Cada um dentro do seu conhecimento. Lógico que o engenheiro sai habilitado da faculdade para fazer todas essas áreas, mas eles também se especializam para fazer algo benfeito e sempre evitar uma dor de cabeça, algum problema que possa surgir na obra. E isso é uma tendência, cada vez mais, aqui na nossa região. E até fica uma dica para o engenheiro recém-formado: quanto mais ele se especializar, mais mercado, mais trabalho ele vai ter. Porque se ele ficar no generalista, digamos assim, vai ter dificuldade. Você tem que achar o seu nicho de mercado, aquilo que você gosta de trabalhar.”
Vai faltar mão de obra?
Para o engenheiro presidente da Sudenge, a falta de obra já é uma realidade, mas tende a ficar ainda pior: “O Brasil tende a ter esse problema também, de falta de mão de obra. Isso já vem acontecendo. A nossa população, os nossos mestres de obras, vamos colocar aqui, são pessoas mais de idade, é difícil você ver um mestre de obra na faixa dos 30, 40 anos de idade. A maioria já passou dos 50. E a tendência é que se aposentem nos próximos anos. E nós vamos ter uma séria consequência dessa falta de mão de obra nos próximos anos. A gente já começou a sentir um pouco disso. Você, muitas vezes, está pensando em reformar a sua casa, querendo construir, vai procurar um mestre de obra, uma equipe de construtores, vai conseguir somente daqui dois ou três meses. Um profissional bom você não encontra. É fila de espera, muitas vezes de mais de um ano. Isso é uma consequência da falta de mão de obra qualificada e de profissionais na construção civil. É uma preocupação para o futuro da construção civil, também aqui na nossa região.”
Mas Vinícius Perin faz um alerta: na falta de mão de obra é que surgem as boas remunerações aos profissionais: “Se está faltando profissional no mercado, a renda é boa. Não é raro um mestre de obra experiente ganhar mais do que um engenheiro civil recém-formado. Já acontecem casos assim. A área técnica está em déficit de profissionais. Então, quando você tem uma demanda muito grande e não tem quem suplementa essa demanda, no caso aqui os profissionais, o salário tende a aumentar.”