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Francisco Beltrão
quinta-feira, 29 de maio de 2025

Edição 8.215

30/05/2025

REPRESENTATIVIDADE

Luciana, de vereadora a deputada

Deputada Luciana Rafagnin (PT). Créditos: Orlando Kissner/Alep
Deputada Luciana Rafagnin (PT). Créditos: Orlando Kissner/Alep

Por Gente do Sul – Luciana Rafagnin foi a primeira eleita vereadora em Francisco Beltrão (junto com Maria de Lurdes Pazzini) e a única do Sudoeste, até hoje, que, depois de vereadora, elegeu-se deputada estadual e continua até hoje. Nesta entrevista, Luciana lembra de passagens interessantes, e emocionantes, das campanhas que fez, desde a primeira, em 1992.

Em 24 anos como deputada, Luciana já obteve conquistas marcantes não só para as mulheres, mas para toda a população beltronense e da região. Uma delas, reconhecida por Luciana como a mais importante, foi o Hospital Regional Dr. Walter Pécoits, instalado em Francisco Beltrão, nasceu de um projeto dela. Depois vêm outras conquistas, como a Universidade Federal Fronteira Sul, instalada em Realeza no ano de… Delegacia da mulher, sala especial nas delegacias de polícia para o atendimento das mulheres vítimas de violência doméstica, asfalto e equipamentos hospitalares obtidos através da Itaipu Binacional, entre tantos outros.

Muitos sonhos realizados, muitas lutas de bons resultados. Nesta entrevista aos jornalistas Badger Vicari e Ivo Pegoraro, Luciana conta como foi pra chegar lá.

– Quando surgiu a candidatura da Luciana Rafagnin? Foi meses antes da eleição ou anos antes?
Luciana: Na verdade, eu venho do movimento sindical, da luta das mulheres agricultoras, eu era uma líder sindical. Comecei o meu trabalho aqui em Beltrão com o nosso sindicato e coordenando o grupo de mulheres agricultoras. A principal defesa nossa era conseguir direitos previdenciários para a mulher agricultora, fazer com que todas as mulheres agricultoras tivessem direito à aposentadoria, direito à licença maternidade. Houve uma organização muito forte em todo o país e, como coordenadora do grupo de mulheres, eu trabalhava também na importância da participação da mulher na política. Nós conseguimos, na Constituição de 1988, os direitos previdenciários para a mulher agricultora, mas, para que isso acontecesse, sentimos o quanto era importante ter na política as pessoas que conhecessem essa realidade, as dificuldades que passa um agricultor ou uma agricultora e, aí, foi despertar um pouco da importância de termos mais mulheres na política.

Quando eu saí candidata a vereadora em 1992, o PT já defendia que pelo menos 30% de candidaturas tinha que ser de mulheres. Mas eu não imaginava ser candidata, não. Como dirigente sindical, eu tinha esse trabalho importante com as mulheres e sabia da importância da participação da mulher na política, mas eu imaginava sempre uma outra pessoa candidata, não me imaginava candidata. Aí, cerca de um mês antes do registro das candidaturas, eu defini, de fato, a chapa de candidatos a vereadores e vereadoras, eu tinha uma insistência. Até quem começou a falar muito do meu nome e achar que deveria ser candidata era a Bia, a presidente do PT, esposa do Arni, que foi nosso vice-prefeito em Beltrão (1997-2000). A Bia defendia muito essa participação da mulher na política e me falou que eu deveria ser candidata a vereadora. Também em casa eu sempre tive esse apoio. Quando começou a discutir o nome, o Justino (marido) sempre me apoiou. Tinha as crianças pequenas, mas o Justino sempre falou que, se eu decidisse ir, ele me apoiava, mas eu confesso que a primeira vez que foi falado do meu nome, eu falo e brinco, mas foi verdadeiro isso, eu fiquei quase um mês sem dormir, porque eu me assustava, a campanha toda era só no papelzinho, imaginando uma foto sua num papel, pedindo voto pra você, eu não conseguia me imaginar.

Eu já era militante, já era filiada no partido desde 89, participei da campanha do Lula pra presidente em 89, antes mesmo, em 88, teve a candidatura Zeca Vigineski, e a Circe (Padilha) foi candidata a vereadora, estava envolvida. Em 88 tinha a Circe, tinha a Ana Frandaloso e a gente já fez campanha, e por isso que me assustava ainda mais de pensar em pedir voto pra mim. Era bom pedir voto pros outros, mas imaginar você colocar seu nome, a população avaliando o seu nome, se merece um voto, se não merece. E como o meu trabalho era mais voltado à agricultura, eu sabia que era muito difícil eleger, porque era o trabalho mais do sindicato, com agricultores, na época a agricultura passava por muitas dificuldades. Do sindicato, além do meu nome, também tinha o Luiz Pirin, que saiu candidato junto, então nós tínhamos dois candidatos que estavam diretamente ligados ao Sindicato dos Trabalhadores, e eu sentia que era muito difícil uma eleição. Foi a primeira vez que Beltrão teve 15 vereadores e eu imaginava que, para eu ser eleita, a nossa coligação tinha que fazer cinco. Mas foi uma surpresa muito grande.

O Arni foi candidato a prefeito, a Angela era a vice, e eu lembro sempre que morava na Nova Seção, e antes de sair o resultado, vinha acompanhando no dia da eleição, mas aqui é muito importante destacar que a minha decisão pesou muito pelo próprio grupo de mulheres que coordenavam as comunidades. Nós tínhamos uma coordenadora de cada comunidade, umas 10 a 15 comunidades mais ou menos organizadas, e esse grupo foi o que mais me fez aceitar o desafio de ser candidata.

No dia da eleição a gente começou a acompanhar a apuração, aí vimos que nós não estávamos conseguindo fazer legenda. Durou quase dois dias a apuração, porque tinha que conferir papel por papel, todos os candidatos. Acompanhamos um pouco a apuração, no Arrudão, aí vimos que seria difícil, fui pra casa, lá na Nova sessão, entendendo que a nossa coligação não iria eleger ninguém. Mas chegando em casa, ouvindo o rádio, porque é o que mais a gente ouvia, para saber das informações, e aí a última notícia que eu ouvi à noite era que, pela primeira vez, teríamos duas mulheres na Câmara de Vereadores, mas deu que seriam a Lurdes Pazzini e acho que era Atanázia (Helmann Pedron) o segundo nome, as duas eleitas.

Aí de manhã quando eu levantei, tinha a Irondina (Schmidt) que dormiu na minha casa naquela noite, ela era uma jovem que fazia um trabalho com a juventude no sindicato, e também saiu candidata, inclusive a gente fazia muita campanha junto, porque eu tinha um Fusca, ela não tinha, ela estava a pé, então tinha dias que eu saía com ela pra fazer campanha pra ela, visitava as casas, porque era bem distante lá da Ponte Nova, e eu ia com ela nas casas, mas só pedia voto pra ela naquele dia, e fazia um pouco a campanha assim juntos. A gente saiu de manhã juntas pra vir no sindicato, o Justino, eu, ela e a Teresa Suquense estavam com a gente. Na estrada, quando eu liguei o rádio, a principal notícia, a manchete, era a primeira vez que o Francisco Beltrão tem duas mulheres eleitas. Na metade do caminho, ouvindo o rádio, deu pela primeira vez, as duas mulheres eram a Lurdes Pazzini e a Luciana Rafagnin. Fizemos um grito assim, festejamos dentro do Fusca. Chegamos no sindicato, nossa, eles também tinham ouvido a notícia, nossa, foi uma alegria muito grande, primeira vez que uma mulher agricultora é eleita vereadora, primeira vez que tinha mulher na Câmara de Vereadores, primeira vez que o PT elege alguém, nunca havíamos tido ninguém, foi uma alegria muito grande.

Mas confesso que eu vejo isso muito quando você faz um convite para uma mulher ser candidata, eu falo que a política ainda assusta muitas mulheres, e eu confesso que na hora comemorei, mas depois começou a preocupação. E agora? Porque comigo eu carregava muito a responsabilidade de representar o partido, porque era a primeira vez que tinha alguém na Câmara de Vereadores, a responsabilidade de representar as mulheres, e também essa questão da agricultura familiar toda com a gente. Eu tinha uma preocupação muito grande, se eu ia conseguir realmente fazer um trabalho a contento da população, nessa expectativa, foi um trabalho muito, muito importante, bastante difícil, com grandes desafios, tinha muita essa questão, porque eu fui a menos votada, em 92 eu fiz menos votos entre os eleitos, fiz 388 votos.

Aí, quando ia fazer o trabalho, ou fazer defesa na Câmara, sentia esse peso, porque os vereadores tinham feito bastante votos* e a eu sentia que a minha votação era pequena e sentia essa diferença também, porque eu represento pouca gente, uma coisa no sentido de que não teria muita força, muito peso, mas isso não foi o que acabou inibindo a gente, ou deixando a gente para trás no sentido de não fazer um trabalho, ao contrário, era um desafio, e aí fiz, claro, sempre fiz um trabalho, procurei fazer sempre, eu defendo sempre que o político tem que trabalhar com o tripé, que é fazer bem o institucional, que é o teu trabalho, você tem que estar na base, você tem que conversar com a base, e que também é a questão partidária, você também não pode esquecer que você está lá por um partido, então, como que você constrói esse partido, como que você defende também esse partido.

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– E a candidatura a deputada, quando surgiu?
Em 94, o Arni saiu candidato a deputado federal. Nessa época, um grupo da região indicou meu nome para ser candidata a deputada, eu não aceitei, porque eu entendia que estava começando um trabalho como vereadora. Eu tinha assumido em 93, eu estou há um ano e pouco na Câmara de Vereadores, agora eu estou entendendo de fato o que é uma constituição, o que é uma lei orgânica, o que é um regimento interno, como funciona, como se faz um projeto, como se faz uma indicação, como se faz um requerimento, tudo isso foi um desafio, e em 94 a gente estava tendo esse conhecimento, ainda aprofundando um pouco o papel do poder legislativo.

Claro que era um desafio, eu falo sempre que o convite pela região de ser candidata me deixou feliz, mas eu não aceitei na época colocar meu nome, o Arni foi candidato a federal, e aí em 96 eu fui para a reeleição. Na reeleição, sim, foi bem diferente, mais tranquila, eu falo sempre dos 388 votos que eu fiz em 92, aí foi para 1.297, quase mil votos a mais, foi uma votação bem expressiva na época, e eu falo sempre que isso, com certeza, se deve muito ao trabalho, não falo só como vereadora, mas pelo fato de ter feito esse trabalho mais com a base, ouvindo bastante a população. Porque quando eu saí a primeira vez, quem conhecia mesmo mais eram os agricultores, a população urbana quase não conhecia, eram os parentes que votavam, uma referência ou outra, às vezes por você, alguém lá de uma comunidade que tinha um parente na cidade, pediu voto, foi isso. Em 96 fiquei bem feliz de ter tido mais uma oportunidade, e em 98 teve a oportunidade de ser candidata a deputada.

– Em 98 não teve como dizer não?
Luciana: Aí eu já tinha cumprido o mandato todo de vereadora, me sentia mais preparada, até porque o meu trabalho como vereadora foi no município, mas ao mesmo tempo foi pensando a região, a gente continuou com várias bandeiras na região, a própria luta pelo hospital regional, a luta pelo crédito, a luta pela habitação, que eram pautas que não ficavam só no nosso município, então, eu me dediquei só para o mandato de vereadora, eu só fazia isso, eu tinha o tempo para poder tanto fazer o trabalho no município, como também fazer um trabalho na região, porque muitas pautas que eram debatidas aqui, elas precisavam ser fortalecidas, e você fortalecia com o trabalho da região, e foi assim que eu fui referendada depois para ser candidata a deputada.

Também saí sabendo que era uma eleição muito difícil, mas que eu estaria contribuindo com a nossa coligação e que, de qualquer forma, meus votos estariam ajudando a eleger alguém. Eu pensei muito nisso, por isso que eu aceitei ser candidata, mas ficamos na época também, a eleição era do papel, então também foi dois dias de socorro, porque aí a gente chegou perto, tinha momentos na hora do resultado da eleição, momentos que a TV e o rádio nos colocavam eleita, falavam que o PT faria cinco deputados, e aí eu era quinta, depois caía, e assim foi. Inclusive, eu cheguei a dar uma entrevista na TV Sudoeste de Pato Branco, o menino Ari, na época, era o Roberto, um dos dois, que fez a entrevista comigo, aí ele falou: “Não, você está eleita, deu o resultado, você está eleita.” Eu falei: “Eu prefiro fazer a entrevista ainda esperando o resultado.”

De manhã eu acordei em casa, essa vez foi o contrário de vereadora. Quando fui dormir vereadora, não deu certo e acordei vereadora, e pra deputada eu fui dormir com essa sensação que tinha dado, que o PT faria cinco deputados e eu era quinta, e quando acordei de manhã, falou que não, o PT só fez quatro, e eu fiquei na primeira suplência. Claro que eu chorei bastante, normal de quem é candidata, subir uma expectativa. Até a campanha, fazendo a campanha, eu não tinha muito essa expectativa de ser eleita, eu fazia campanha sabendo que ia para contribuir, mas no momento que começa a contar votos, e uma hora você está dentro, uma hora você está fora, você cria uma expectativa é natural. Claro, chorei um pouco, não deu certo o resultado, mas continuamos, ainda era vereadora, até o final de 2000, mas em 1999 o deputado Colombo teve um problema de saúde, se licenciou quase quatro meses, e aí eu tive a oportunidade de assumir. Levei algumas lutas nossas aqui, como foi a própria questão do hospital regional. Apresentei já o projeto da lei da implantação do hospital regional, na época também o da habitação rural, que não tinha nenhum programa de habitação, porque eu não sabia se um dia eu ia ter novamente essa oportunidade.

– E em 2000, como candidata a prefeita de Beltrão?
Foi uma eleição bem disputada, a gente perdeu em torno de 5%, foi a diferença dos votos. Uma experiência muito boa. Eu falo todas as vezes que a campanha é uma faculdade que a gente faz, porque você aprende muito. Claro que, se a gente não ganha, você sente, você chora, você fica triste, mas, independentemente do resultado, toda campanha é uma faculdade, porque toda campanha é diferente, e toda campanha você aprende muita coisa, você adquire muito conhecimento. A campanha de prefeito é totalmente diferente da campanha do Legislativo, do que quando você está disputando uma vaga para uma Câmara de Vereadores ou para uma Assembleia Legislativa. Poder Executivo é totalmente diferente. Você precisa conhecer de fato todos os problemas, de tudo que pode ter no município, e isso é um grande desafio. Você tem que ir atrás, você tem que responder, tem que saber. O que você vai propor para o setor urbano, para o campo, para a saúde, para a educação, para o transporte, tudo isso. Mas é um conhecimento muito grande que você adquire, então é uma experiência muito boa. Eu tive essa experiência. Também foi uma experiência muito interessante no resultado dela, porque a gente concorreu para a prefeita e, ao mesmo tempo, fui eleita deputada. Na verdade, assumi como deputada, porque o deputado Péricles foi eleito prefeito em Ponta Grossa. Quando saiu o resultado, Luciana perdeu para prefeita de Francisco Beltrão e, ao mesmo tempo, a manchete era Luciana assume como deputada estadual.

– Sim, vai ser titular.
Luciana: Concorri para a prefeita e fui eleita deputada. A gente brincava na época, um pouco assim. Mas aí fiquei feliz pela oportunidade de ter dois anos como deputada. E aproveitei pra fazer um bom trabalho nesses dois anos, buscando, claro, uma eleição de fato. Então, a eleição em 2002, aí sim fui eleita de fato como deputada e reeleita em 2006, reeleita em 2010, em 2014 eu perdi e voltei em 2018. Então, nas eleições de 2018, candidata e eleita novamente e reeleita em 2022. Eu acho que nesse sentido tem algumas experiências que eu falo e vale ressaltar aqui, que eu ouço muito dos deputados lá na Assembleia a questão, nossa, quando você está deputado não é fácil, mas é mais fácil você ser eleito de novo, reeleito. Agora, você fora e voltar é muito difícil, eles sempre comentam isso, eles falam: “A gente admira você que esteve fora e conseguiu voltar”.

– Você concorda com isso?
Luciana: Quando eu pego no aspecto de ser mulher, eu concordo. Porque se para o homem é difícil, então você imagina uma mulher. Nesse sentido, é mais difícil. Porque quando você está como deputada, você tem mais condições, está ali, está apresentando um trabalho, a população está vendo, acompanhando, sabendo o que você faz, você tem contato direto com organizações, com pessoas, está tendo uma oportunidade maior do que alguém de fora. Isso vale para o homem, vale para a mulher. Mas quando eu falo para a mulher é mais difícil, porque temos menos mulheres candidatas, sabemos da dificuldade que a mulher enfrenta na política. Ainda tem preconceito, ainda tem discriminação. Nós falávamos agora do direito ao voto conquistado em 1932, mas que de fato, como obrigatório, como é do homem, só aconteceu em 1965. Então, você percebe a dificuldade. Nós falamos de uma educação onde a mulher só teve direito a ir para uma universidade em 1879, então, a impressão que a gente tem hoje, quando se vê a mulher ocupando espaço, eu falo o espaço social, o espaço econômico e o espaço político, o político ainda é um tabu para as mulheres, é maior, mas eu falo, assusta muitas mulheres, ainda precisamos trabalhar muito essa questão.

*1.260 para Celmo Salvadori, 1.224 Ivo Santos, 1.008 Deoni Tomazoni, 940 Valdomiro Azzolini, 841 Ascelide Parizotto, 790 Iclair Daros, 783 Ademir Schmitz, 771 Arlindo Mandredi, 769 Mateus Ferreira Leite, 643 Wilmar Reichembach, 637 Antônio Cantelmo Neto, 611 Luiz Carlos B[aggio, 570 Maria de Lurdes Pazzini. Após quatro suplentes veio Jair Link com 506 e, após mais 13 suplentes, a Luciana Rafagnin, com 388 votos.

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