Palestra
De todas minhas resoluções de ano novo – que incluem decorar Faroeste Caboclo e participar de um torneio medieval vestindo armadura e tudo -, a menos vulgar delas é me tornar um renomado palestrante empresarial ao avesso, nada semelhante a essa casta que usa frases motivacionais e posa pra foto de braço cruzado, meio de lado, entendendo ser gente séria e de sucesso. Seria algo mais próximo de um profeta do apocalipse que do Gilcler Regina, um ramo ainda pouco explorado, mas tão necessário quanto o lenocínio, designer de panfletos e fabricantes de bombachas.
Apenas uma imagem da Via Láctea substituiria os comumente usados 316 slides e representaria esse nosso estado de insignificância frente a imensidão do universo e infinitas possibilidades de vidas, matérias e criações que nos rodeiam, mesmo que a gente insista no contrário e teime em escrever textão no Facebook pra reclamar do atraso de um voo. Dois de meus livros de autoajuda estariam entre os mais vendidos no gênero na subliteratura: “O bêbado e o compulsivo” e “Como ser mendigo e influenciar pessoas”.
O mundo está assim tão apático não por falta de laço, como sugeriria meu avô, mas porque precisa de mais choques de realidade. Desde o berço, muita gente é educada somente pra ter sucesso profissional, fazer uma federal, depois o mestrado, virar doutor, ser o pica das galáxias, mas no fundo continuar o mesmo bundão da 5ª série que roubava no tazo e comia o lanchinho preparado pela Neide. O pessoal precisa aprender a lidar melhor com conflitos para não se dopar de Rivotril assistindo o Programa o Gugu toda vez que leva uma mijada do chefe.
Veja que paradoxo: temos uma geração altamente instruída academicamente, gente com seus vinte e poucos anos chefiando quem tem o dobro da idade, ganhando bem, cheio de responsabilidade, com reconhecimento e torando o pau na firma, mas que não tem capacidade emocional para lidar com um fora na balada e pensa em suicídio quando não bate as metas.
Nossa vida é martirizada por uma eterna busca pelo que podemos ter em vez de ser a satisfação do que já possuímos, material e imaterialmente. Às vezes é melhor comprar uma rede pra ficar de boa depois que chega do trabalho que se fincar em um financiamento pra ampliar a casa e ter mais serviço pra limpá-la. Em vez de um carro novo, o que a gente precisa é usar melhor o velho pra conhecer lugares e pessoas e ter experiências diferentes ou até deixá-lo na garagem e sair a pé, sem pressa, mesmo nos dias úteis. Poderia enumerar trocentos conselhos pra ter uma vida mais sossegada, sem muita neurose profissional e com mais maturidade emocional, mas tenho que entregar um relatório de 128 páginas até as quatro.