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Francisco Beltrão
segunda-feira, 26 de maio de 2025

Edição 8.211

24/05/2025

A reconstrução de Manfrinópolis depois do desastre do dia 9

Dos escombros da enxurrada do dia 9, o município luta para voltar à normalidade.

 

Altair, Vitor e Jamal trabalham na limpeza das ruas de Manfrinópolis. Duas semanas depois da enxurrada do dia 9,o município luta para voltar à normalidade. 
Foto: Rubens Anater/JdeB

 

Por Rubens Anater
Já faz duas semanas que Manfrinópolis foi atingida pela maior catástrofe da história do município. Uma tragédia da qual ainda não se recuperou totalmente. Os lugares mais afetados pela enxurrada do dia 9 ostentam um cenário de desolação, com detritos, lama e rostos tristes que levam na memória o horror da tragédia.
Mas ainda que seja difícil superar a lembrança daquele fim de tarde de quarta-­feira, em que os dois rios que atravessam a cidade transbordaram, o momento não é de lamentação – é de trabalho. “Desde a noite da catástrofe, nós não paramos”, afirma o coordenador da Defesa Civil do município, Vilberto Guzzi, que também é secretário de Administração e Finanças.
Segundo Beto, cerca de 80% da cidade foi atingida pela enxurrada, 15 casas foram totalmente destruídas e outras tantas foram danificadas parcialmente, inclusive boa parte das construções do poder público municipal – de maneira tão prejudicial que o prefeito Cláudio Gubert (PP) chegou a decretar estado de calamidade pública. 
E no meio dessa destruição o trabalho tem sido grande. De acordo com Guzzi, desde o início a Prefeitura organizou abrigos e alimentação para as pessoas que perderam tudo na enxurrada. Depois disso, encaminhou doações e tem trabalhado na limpeza das vias públicas com todo o maquinário e buscado restabelecer a normalidade na cidade.
Mas, para conseguir recuperar os danos causados pelo desastre, o município vai precisar de muito dinheiro. “A maior dificuldade da reconstituição vai ser o lado financeiro”, afirma Guzzi. Nesse sentido, dois representantes da Defesa Civil do Paraná – o sargento Rogério Marcos de Souza Hammes e o cabo Ederaldo Kuller – estiveram em Manfrinópolis na terça-feira, 22, para ajudar na elaboração do Plano Detalhado de Resposta, um primeiro documento a ser encaminhado para o governo federal em busca de recursos.
Neste momento, segundo o sargento Hammes, “a solicitação é de combustível para o maquinário que está fazendo obras no município, principalmente para liberação de trafegabilidade. Agora o governo federal analisa esse plano e encaminha uma resposta diretamente ao município, e essa reposta deve vir em breve”. 
A verba do governo vai facilitar a recuperação, mas, enquanto ela não vem, o município não para. O maquinário continua recolhendo entulhos e Manfrinópolis faz de tudo para tentar voltar à normalidade. “A gente pede paciência e tranquilidade, porque os órgãos já estão ajudando a gente e o apoio não tá faltando. Temos que trabalhar e reconstruir tudo de novo”, relata o prefeito Gubert.
A Caixa Econômica Federal já garantiu que vai liberar o dinheiro dos Fundos de Garantia dos atingidos em, no máximo, 30 dias. O município também continua pedindo doação de material de construção para as casas destruídas e danificadas. Pessoas que quiserem contribuir com auxílio financeiro podem depositar na conta do Fundo Municipal de Assistência Social, no Banco do Brasil, agência 616-5, Conta 64034-4.

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Sargente Hammes, Cabo Kuller e prefeito Claudio Gubert estudam a imagem 
aérea de Manfrinópolis para entender o desastre e buscar soluções.

A causa da tragédia

Mesmo depois dessas duas semanas de reconstrução, a maioria da população continua sem entender como foi possível um volume tão grande de água invadir a cidade de maneira tão repentina e causar tamanha destruição. 
De acordo com o cabo Ederaldo Kuller, da Defesa Civil do Paraná, a catástrofe realmente é algo incomum, mas não impossível. Em primeiro lugar, por causa do fenômeno El Niño, que tem feito deste o verão mais chuvoso do Paraná nos últimos 50 anos.
Kuller, que estuda Geologia, explica que “ocorreu um evento de chuva com intensidade muito grande em um curto período de tempo e a geografia do município, em um vale, concentra a água do rio e dá a ele muita velocidade”.
A partir do levantamento de informações de outros alagamentos menores que já aconteceram no município, propiciados pela geografia, Kuller acrescenta que os pontos de Manfrinópolis próximos aos rios se configuram como locais de risco.
Por isso, o cabo da Defesa Civil afirma que voltará ao município e para outros locais da região em janeiro, junto com outros geólogos, para estudar a geografia, o tipo de solo e os índices de chuvas, alagamentos, deslizamentos e outras situações. “A partir disso pretendemos, de início, estabelecer parâmetros para podermos emitir alertas quando houver risco de eventos assim.”
Outros estudos também estão sendo realizados e Manfrinópolis ainda deve passar por processos para minimizar a intensidade de tragédias como a do dia 9 e reduzir o risco desses locais. “Nós estamos trabalhando pra ver e poder acertar o que fazer com nosso rio, se vamos canalizar, limpar, ampliar as pontes, vamos fazer alguma coisa, porque se acontecer de novo um negócio assim, morrem as esperanças”, afirma Cláudio.
No entanto, esse tipo de trabalho também esbarra no problema financeiro. “O município é pequeno e, em si, não tem condições de fazer algo assim se não tiver apoio do governo. Mas também não podemos deixar que famílias fiquem em risco, então temos que corrigir esse erro para dar tranquilidade para quem mora aqui”, conclui o prefeito.

Danos em Salgado Filho
As fortes chuvas que atingiram Manfrinópolis no dia 9 também afetaram outros municípios da região. Salgado Filho, o vizinho mais próximo, foi um deles.
Segundo o prefeito Beto Arisi (PMDB), foram poucas residências atingidas e nenhuma delas sofreu problemas muito graves. No entanto, a agricultura teve grandes danos e os prejuízos em estradas, pontes e bueiros chega perto de R$ 1 milhão. 
O prefeito ainda conta que o município já está realizando uma operação de tapa-buracos com recursos próprios e que toda a malha rodoviária já está liberada para o transporte. Mas a situação é provisória, porque as estradas precisam de reparos mais completos, então a administração também busca recursos estaduais e federais para refazer os pontos mais afetados. “Este foi um ano bem difícil para as prefeituras, e agora ficou mais complicado ainda. Mas não adianta ficar se lamentando, temos que trabalhar”, completa o prefeito Beto Arisi.

“Não dava para acreditar no que veio”

Dona Ilsa de Morais é viúva e aposentada. Depois de anos trabalhando na roça, ela vendeu o seu terreno e se mudou para a cidade, em Manfrinópolis, para ter uma vida mais calma com seu filho, Natalino, que tem problemas de saúde e não pode trabalhar, mas também – até hoje – não conseguiu se aposentar.
Devagarzinho, com o dinheiro da aposentadoria e o que sobrou do tempo no interior, Ilsa conseguiu uma casinha na cidade, mobiliou-a completamente e não faltava mais nada. Não era uma vida luxuosa, mas dava para viver e manter o filho, que no máximo consegue trabalhar em alguns bicos para ajudar na renda da casa.
Foi assim até dia 9, por volta das 18 horas, quando a água começou a subir, saiu da calha do rio e destruiu completamente a casa de Ilsa e de mais 14 famílias da cidade. “Eu vi a água subindo e falei que nunca que ia vir até a minha casa. Mas quando veio aquele dilúvio, não dava pra acreditar… Não dava pra acreditar no que veio”, conta.
“E eu perdi tudo. Fiquei só com a roupinha do corpo. De tudo que eu tinha conquistado com o meu suor, fiquei sem nada, nem meus documentos”, lamenta Ilsa ao lembrar-se da casa levada pela enxurrada.
Natalino ainda diz que foi por pouco que os dois não foram levados junto com a residência, “foi por um ponteiro do relógio”, porque quando ele e a mãe saíram da casa, a água veio com uma força inacreditável e quase os levou rio abaixo. “E eu saí só com uma bermuda mesmo, tudo molhado… Aguentei até de noite, mas tive que ir no vizinho pedir uma muda de roupa porque não aguentava mais o frio.”
Durante aquela noite, Ilsa e Natalino ficaram em residências de amigos e hoje estão morando em uma casa que o genro de Ilsa construiu para alugar, mas é só temporário. “Tudo que eu queria era meu lugarzinho de novo, uma casinha, um lugar pra gente viver.”
Situações semelhantes, de pessoas morando de favor ou pagando aluguel se repetem em mais 14 famílias que não têm nada das suas casas. Por isso, o prefeito Cláudio Gubert (PP) afirmou que a administração está buscando uma maneira de construir casas novas para essas pessoas, mas ainda é preciso recurso governamental para isso. 
Entre essas 14 famílias que perderam suas casas, duas também perderam familiares na tragédia – um prejuízo que nada poderá remediar. 

Dona Ilsa de Morais e seu filho, Natalino, na casa onde estão morando de favor. Eles e mais 14 famílias tiveram suas moradias totalmente destruídas.

 

 

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