Depois do alagamento, muito trabalho para os moradores de Pato Branco
O belo dia de sol de ontem nem de longe lembrava o caos que tomou conta de oito bairros da cidade de Pato Branco no fim da tarde e início da noite de terça-feira, 27. Em poucas horas o tempo fechou, e a chuva caiu incessantemente durante pouco mais de 40 minutos. Segundo o Simepar, é impossível afirmar o volume de chuva, mas estima-se que tenha ficado entre 40 e 50 milímetros. O volume esperado para todo o mês de outubro era de 200 milímetros.
A grande quantidade d?água, aliada ao estouro de alguns açudes na cabeceira do Rio Ligeiro, transformaram a baixada pato-branquense e outros bairros da cidade em um grande rio. O rastro de destruição deixado pelas águas é imenso, a enxurrada não poupou ninguém. Ricos e pobres, empresários e papeleiros. Muitos perderam muito e outros tantos perderam tudo. É o caso de Pedro, morador do bairro São João. Ele é papeleiro e mora com a mulher Quilina e uma filha na beira do riacho que corta o bairro.
Sua pequena casa foi tomada pela água em poucos minutos. ?Eu estava dobrando a roupa dentro do quarto, quando a nenê me disse que a água já tava na porta da cozinha. Quando fui olhar vi que já tinha açudado tudo em volta da casa. Eu enrolei o acolchoado na nenê pra escapar. A água me tomou o acolchoado e quase que leva a menina junto. O Jô, dono do bar, veio nadando amarrado em uma mangueira pra ver se a gente tinha conseguido escapar. Perdemos a comida, os colchões, perdemos tudo. Passamos a noite na igreja?, conta Quilina.
Toda a parte baixa do bairro São João foi alagada, incluindo a Escola Municipal Udir Cantu. É o que conta a diretora da instituição, Irma Rosa. ?Foi desesperador, as crianças estavam gritando e gritando. Foi muito rápido. De repente quando nós vimos já não tinha mais como sair de dentro da escola. Fomos com as crianças lá para os fundos, mas a água continuava subindo. Nossa sorte foi que contamos com a solidariedade das pessoas, o pessoal dos arredores fez uma corrente humana e foram pegando as crianças e passando de mão em mão até uma parte do bairro onde a água não estava tão alta. Foi muito preocupante, tínhamos cerca de 80 crianças de seis, sete e oito anos de idade?, relembra. Dentre os participantes da corrente humana realizada na escola estava a odontológa Francyanne Rech, do Posto de Saúde. Enquanto ajudava no resgate das crianças do São João, sua residência no bairro Bonato foi alagada e sua família perdeu todos os móveis e eletrodomésticos.
Segundo o secretário de Educação, Alcides Benato, quatro escolas e duas creches foram afetadas pelos alagamentos. Benato garante que as aulas serão retomadas normalmente ainda esta semana.
O setor de saúde foi muito afetado. O pronto socorro municipal, situado na Baixada Industrial, foi coberto por quase um metro de água. O diretor administrativo da Secretaria de Saúde, Ivoliciano Leonarchik, diz que as perdas são incalculáveis. ?Toda a estrutura do Pronto Atendimento foi danificada, incluindo equipamentos, insumos, móveis, os consultórios e toda a medicação da farmácia. A estrutura do programa Mãe Pato-branquense foi muito afetada, a sala de vacinas, os móveis e consultórios, tudo foi alagado. A obra da odontologia que estava quase pronta precisará de reparos. Todos o equipamentos da lavanderia e da sala de esterilização ficaram sob a água. Seis carros da secretaria ficaram completamente submersos. Ainda não sabemos se algo ainda funciona?, conta.
Ivoliciano enfatiza que a população não ficará sem atendimento e que, em caráter emergencial, todos os casos de urgência serão atendidos pelo Hospital São Lucas ou pela Policlínica Pato Branco.
Hospital do Câncer
O Hospital do Câncer, ao lado do Rio Ligeiro, também foi invadido pela enxurrada. Todos os equipamentos de radioterapia, situados na parte mais baixa da estrutura, foram cobertos por cerca de um metro d?água. ?As águas vieram de baixo. A água brotava do chão, as bocas de lobo estouraram. De todas as máquinas de radioterapia, a única que não foi afetada é o computador que comanda tudo. Se ele também tivesse sido atingido teríamos que ficar uns seis meses parados. Já cancelamos todos os tratamentos da próxima semana. Precisamos esperar secar as máquinas para saber o que estragou. Não temos seguro de nada. Meu Deus do céu! Foi a primeira vez que aconteceu isso?, conta preocupada a secretária administrativa da instituição, Giza Brandalize.
Moradores procuram os culpados
A população tenta descobrir se algo poderia ter sido feito para evitar a situação caótica em Pato Branco. Alguns procuram os culpados. Dilzoni Baroni, moradora do bairro Bonatto, acredita que a elevação da água se deve ao desvio do leito do Rio Ligeiro, efetuado há poucas semanas pela Prefeitura, para a construção do Parque da Baixada.
?Moro aqui há mais de quatro anos e nunca imaginei passar por isso. Foi horrível, foi bem rápido. Entrei em desespero. Eu não sabia se erguia os móveis ou se eu fugia. Minhas filhas e meu esposo, que tem uma deficiência na perna, eu já tinha tirado. A água chegou a 82 centímetros dentro de casa. Eu credito, pode ser que eu esteja errada, mas posso provar que a Prefeitura fez um desvio no rio. Eu imagino que o novo curso não deu vazão?, comenta a moradora.
O assessor de imprensa da Prefeitura de Pato Branco Adriano Oltramari não acredita que as obras no local foram as responsáveis pelo problema. Ele justifica que, naquela área, o rio está sendo canalizado. Adriano lembra que cinco açudes de pesque-pagues próximos do perímetro urbano estouraram. Acredita-se que isso pode ter contribuído para o transbordamento do Ligeiro.
Na próxima semana, a Defesa Civil deve iniciar um levantamento das causas que provocaram este alagamento.
Recomeçar
Dona Elza Robetti perdeu tudo. A pequena casa de madeira em que ela mora, no bairro Santa Terezinha, está condenada. Sem conter as lágrimas, ela conta: ?A água subiu até lá em cima. Foi muito rápido, nós tentamos tirar tudo o que ficava mais em baixo pra parte mais alta da casa, mas não deu. Depois que estourou o muro da Sanepar a água subiu muito e como temos duas crianças nós caímos fora. Com a movimentação da água em baixo a casa começou a querer flutuar. Não sei o que nós vamos fazer agora. Nós não temos para onde ir. Meu Jesus amado! Nós achamos que a água ia baixar. Quando saímos a água tava na altura da axila. Vamos ter que recomeçar do nada?, conta.
Através do fone 193 as pessoas podem informar sobre suas doações e aquelas que tiveram perdas também podem informar sobre as suas necessidades. (LB e FP)