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Francisco Beltrão
quarta-feira, 18 de junho de 2025

Edição 8.228

18/06/2025

Marcelo Forselini: Do trator ao caminhão, uma vida ao volante

Regional

Marcelo Forselini com a esposa Idione e a filha Sarah.

Foto: Flávio Pedron/JdeB

Ele mal alcançava os pedais quando aprendeu a dirigir o trator do pai, agricultor no Canela, interior de Renascença. Aos 12, 13 anos, já trabalhava com colheitadeira. Aos 17, foi para o Mato Grosso, a convite de um tio, e pela primeira vez dirigiu um caminhão — começou com um Mercedes Benz 1316, depois um Scania 111, ano 79. Enfim, o sonho do menino que ficava olhando as carretas passarem na estrada se tornava realidade.

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Marcelo Forselini, hoje com 44 anos, é motorista da Distribuidora de Combustíveis Rodoil, de Renascença. A esposa, Idione Pichi Forselini, é colega de empresa. Eles têm dois filhos: Douglas, de 23 anos, e Sarah, de 10. Quando se mudou para Tangará da Serra (MT), com o tio Aldérico Forselini, nos anos 90, Marcelo encontrou a profissão que levaria para a vida.

Os caminhões eram fichados numa fazenda e levavam grãos até Cuiabá. Na entressafra, a carga era de cerveja, que ia da capital para Tangará da Serra. “Transportava grãos pros armazéns e voltava com fertilizante, calcário, esse tipo de mercadoria própria pra fazenda. Quando era colheita, era puxado, duas, três viagens por dia da fazenda até Deciolância, que era Distrito, hoje é município, dá 80 quilômetros. Até Tangará dava 140 quilômetros, tudo estrada de chão, tinha umas serras bem feias, quando chovia, era impossível de ir, ficava dois dias atolado no mesmo atoleiro”, conta Marcelo.

Ele ficou por quatro anos no Mato Grosso, depois voltou ao Paraná, no sítio do pai. Então veio o casamento, Marcelo arrumou um emprego de transporte de grãos em Pato Branco e se estabeleceu em Vitorino. A rotina de ficar 30, 60 dias longe de casa não agradava a família. “Ela [a esposa Idione] sempre queria que eu trabalhasse com o combustível aqui, vim umas par de vez, mas não dava certo, daí quando deu foi uma felicidade geral, porque fica muito mais em casa.” Desde novembro de 2000, Marcelo transporta combustível para as distribuidoras.

Rotas perigosas
Embora consiga passar mais tempo com a família, o motorista faz uma rota perigosa no Paraná. Trechos entre Curitiba e Araucária, Lapa, Ponta Grossa, Mauá da Serra, Londrina e Maringá são visados para assaltos. Em 2005, Marcelo foi a vítima, na Serra do Cadeado. Os bandidos desconectaram a mangueira, uma técnica tradicional nesse tipo de crime. “Ela trava a carreta e já me abordaram em dois, um de cada lado da porta, é bem esquisito, não tem como explicar, levam com a maior facilidade. Eu não tive muita reação. Tava fechado lá dentro, só atendi o que eles mandaram fazer, eles não me trataram mal e eu não reagi, não fiz nada.”

O motorista passou a noite em poder dos criminosos e foi solto de manhã, perto de Londrina. “Na hora que eles soltam, te dá uma adrenalina, um desespero. Aqueles minutinhos ali não passam, é quase pior do que quando eles estão contigo”, relata Marcelo. O caminhão foi parar em Salto del Guairá. “Eu e o Idalir que fomos buscar lá. Já tava vazio, tiraram os pneus, o equipamento, depenaram bastante.”
Em 27 anos de boleia, Marcelo também sofreu acidentes. “Em novembro de 2017, tombei o caminhão carregado de combustível lá perto de Soledade (RS). Teve acidente com vítima também, perto de Pato Branco. Teve outro em Curitiba. A gente supera porque não tava errado, o cara bêbado invadiu a pista e até o acostamento, porque eu saí pra fora, mas não consegui evitar. Em Curitiba, foi um motociclista, ali foi bem complicado. Em Soledade eu saí fora da pista, um erro meu”, reconhece.

15 reais por um banho
Marcelo chega a rodar 700 km por dia. Sua “Vanderléia” tem capacidade para 47 mil litros de combustível. As viagens que leva álcool são para Araucária, Sarandi, Paranaguá, interior de São Paulo, Rio Brilhante (MS), Esteio (RS). Depois, volta com diesel ou gasolina. “Puxo bastante biodiesel também pra Erechim, Passo Fundo, Veranópolis, essa região aí.”

Como Marcelo transporta para distribuidoras e, geralmente, abastece nas bases e postos da empresa, acaba enfrentando dificuldades quando precisa parar o caminhão para dormir e até tomar banho: “Onde a gente não abastece, não é bem-vindo no pátio do posto, no restaurante, nem no banho. No Rio Grande tem lugar que pedem 15 reais pra tomar banho, a média é 10”.

Já nas estradas pedagiadas, a dificuldade é com o suporte para os caminhoneiros. “Estradas pedagiadas, como a 277, é uma vergonha, não tem terceira faixa, só dão suporte pra carro pequeno, acho que isso dá mais mídia pra eles. Os pátios de descanso que eles têm, se pôr um caminhão já fecha tudo, só que o movimento de caminhão é enorme”, desabafa Marcelo.

Cuidados com a carga
Na estrada, uma direção segura deve ser prioridade de todos os motoristas. Mas, para quem transporta cargas perigosas, como é o caso do combustível, a responsabilidade é ainda maior. Regularmente, Marcelo faz cursos de reciclagem, como o de Movimentação Operacional de Produtos Perigosos (Mopp), que é a cada cinco anos. “Apesar de o caminhão ser seguro, tem que ter cuidado redobrado, ter atenção, isso com qualquer carga. Com combustível tem que evitar o acidente porque não é igual o acidente com uma carga de grãos, de madeira, tem a questão ambiental, as multas são altíssimas”, compara.

A empresa também exige capacitação e oferece cursos próprios, além de não descuidar da manutenção dos caminhões. “A gente entra muito nas Petrobrás e são muito rigorosas, se tu carregar duas vezes no mesmo dia, as duas vezes eles fazem o check list. Tem uns quantos itens que fiscalizam, principalmente pneu e sinalização. Uma lanterna que não funcione já é reprovado. Nas usinas também é assim.”

Contando suas histórias, consciente dos perigos da estrada e de seu trabalho, Marcelo se mostra um motorista experiente. Tem muita diferença daquele jovem que começou com 17 anos? “Lembro do Marcelo de antigamente, não tem nada a ver com o de hoje, é uma cabeça diferente. O jeito que me ensinaram naquela época também é totalmente diferente, os próprios caminhões são muito diferentes, o trânsito, que na época tu andava um dia inteiro pra encontrar cinco ou seis caminhões. Hoje as rodovias tão muito carregadas e os caminhões foram aumentando de tamanho, aumentou a potência também, mas o peso aumentou mais”, responde.
Colaborou Flávio Pedron

 

A favor de mudanças, mas para todos

Desde 2015, está em vigor no Brasil a Lei do Caminhoneiro, visando contribuir para a segurança nas estradas. Entre seus pontos principais, estão aqueles relacionados à jornada de trabalho e ao período de descanso dos caminhoneiros — o motorista deve descansar 11 horas a cada 24 trabalhadas, sendo 8 horas de forma ininterrupta.

Marcelo Forselini já se adaptou à mudança: “Aqui não temos um horário. Eles só não querem que a gente extrapole. Eu gosto de acordar entre quatro e meia e cinco horas, daí faço meu chimarrão, e quando é dez e quinze, dez e meia, eu paro. Também tem os intervalos de almoço, café, cochilo da tarde”.

Já em 2019, entrou em pauta um projeto de lei do governo que altera o Código de Trânsito Brasileiro. Algumas alterações, como excluir a exigência do exame toxicológico para motoristas profissionais e aumentar de 20 para 40 a pontuação da CNH, estão dividindo opiniões. “Acho que melhora um pouco. E é caro pra renovar”, avalia Marcelo, sobre a questão de pontuação e validade maior da CNH.
Para ele, a extinção dos radares também é um ponto favorável. “Acho que o mais complicado são os radares, essas máquinas de dinheiro do governo. Eles colocam em pontos estratégicos, e não como eles dizem que ponham em colégio, onde tem movimento de pedestres. Ali em Cascavel, ponharam um antes de Santa Maria no meio do nada. É só pra arrecadar dinheiro, não é curva, é uma região agrícola, não tem nada lá, mas tem um radar.

Sobre o exame toxicológico, Marcelo é a favor, mas cita outro fator: “Sou a favor do exame, mas pra todo mundo, não só pra motorista de caminhão. Falam que causa acidente, mas a maioria dos acidentes fatais não é com motorista de caminhão, é motorista de automóvel que morre por embriaguez”.

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