É possível doar um rim, parte do fígado, pulmão ou medula estando vivo. No caso do rim, a compatibilidade maior é com membros da família. O transplante entre amigos e conhecidos não é tão comum e precisa de autorização judicial.

Por Gente do Sul – Antigo Hospital do Coração Nossa Senhora da Salete, Cascavel, setembro de 2020. Elizangela e o amigo Adair estão na maca, lado a lado, preparados para uma cirurgia que vai mudar a vida de ambos. “Se quiser desistir, ainda é tempo”, diz Adair Cassimali, um homem de meia idade que precisou renunciar a muita coisa e passar por hemodiálises rotineiras, devido à insuficiência renal. Elizângela vai doar um de seus rins para ele. “Eu tinha certeza que estava lá pra fazer aquilo, bem consciente, e não ia ser nesse momento que eu voltaria atrás”, relembra a doadora. Mas, para chegar até o momento da cirurgia, o processo não foi fácil.
Como doador e receptor não possuem nenhum grau de parentesco, o transplante teve que ter consentimento da Justiça. A empresária Elizângela Caretti Rufatto precisou provar que não estava cedendo um de seus órgãos em troca de dinheiro ou outro tipo de benefício. Uma bateria de exames mostrou a plena saúde da doadora e os testes sanguíneo, de histocompatibilidade e prova-cruzada indicaram que a conformidade entre os dois era de 75%.
Foram meses de preparação e autorizações, veio a pandemia que adiou a cirurgia, mas a decisão estava tomada e dela Elizangela não recuava. Eles se conheciam há alguns anos por conta da proximidade entre seus familiares. Ao ver como a saúde de Adair havia definhado devido ao problema renal, sabendo que não havia parentes compatíveis e que a fila de espera tinha mais de mil pessoas, ela refletiu sobre a possibilidade de doação. Foi quase um ano até se dispor a oferecer um de seus rins para o amigo.
O procedimento chamado de doação intervivos é legal, segura e não compromete a saúde de quem cede. Depois que entraram para a cirurgia – que correu bem –, Elizângela e Adair viraram “irmãos de rim”. “A mãe dele é como se fosse minha, nos falamos quase que diariamente e tem até um quartinho pra mim na casa deles”, conta. Ela reside em Francisco Beltrão e ele em Cascavel, onde o transplante foi realizado. “Eu discuti muito a questão da doação com a minha família, tive apoio, e senti que isso foi um exemplo que dei para meus filhos, mas porque meu coração dizia pra fazer aquilo, ajudar outro ser humano da forma que eu podia”, completa Elizangela.
A cirurgia para retirada do rim é como uma cesárea, compara Elizângela. O pós operatório foi um pouco dolorido e ela hoje precisa passar por uma série de exames semestralmente, além de não poder tomar anti-inflamatório e cuidar um pouco da alimentação. Cuidados pequenos diante do gesto de devolver qualidade de vida a um amigo. Adair teve complicações após o transplante, se recuperou, pegou dengue, covid, mas hoje não precisa mais de hemodiálise e pôde voltar a se satisfazer com pequenas coisas na vida, como comer melancia.