O mês de setembro finda hoje e encerra também o período da campanha “Setembro Amarelo”, focada na prevenção ao suicídio. Contudo, o que não termina é o trabalho de autoridades e profissionais de saúde em prol de combater este mal que assola a sociedade e ceifa vidas inesperadamente, muitas vezes pelos motivos mais banais.
Diante disso, e preocupadas em observar com mais detalhes a atual situação do município, profissionais da Secretaria de Saúde de Francisco Beltrão fizeram um levantamento sobre doenças relacionadas a depressão, transtornos mentais e casos de suicídio. A psicóloga Marina Thibes e a enfermeira Kátia Fabielly Schmidt desenvolveram o levantamento de dados, que culminou em um artigo sobre o assunto.
Conforme o estudo, baseado em dados da Secretaria de Saúde e do Departamento de Vigilância em Saúde de Beltrão, entre os anos de 2012 a 2016, foram notificados 57 casos de morte por suicídio e 140 casos de tentativas. A maior causa dos suicídios foi por enforcamento e as tentativas foram por uso de medicação, sendo que 82% dos óbitos foram concretizados por homens e 72% das tentativas foram efetivadas por mulheres. “O que chama muito atenção e nos preocupa é a idade desta população, pois a maioria tem entre 20 a 39 anos, ou seja, pessoas muito jovens. E existe também um número grande de tentativas em idade menor ainda, entre 14 e 20 anos. Em relação à escolaridade, possui fundamental incompleto. Quanto ao local de ocorrência, a maioria dos suicídios, bem como das tentativas, aconteceu na própria residência”, comenta a enfermeira Kátia Schmidt.
De acordo com dados da OMS, o perfil de Beltrão não difere do perfil nacional. Considerando o alto índice de suicídios e tentativas de suicídio na região, o atendimento a este público está sendo prioritário. A Secretaria de Saúde está desenvolvendo ações junto à rede de assistência à saúde, como a busca ativa destas pessoas que foram notificadas por tentativas de suicídio e a elaboração de protocolos que possam dar um suporte mais adequado e rápido nestes casos, ofertando serviços especializados.
De olho nos ‘sintomas’
“Quando ouvimos um relato de tentativa de suicídio, ouvimos uma pessoa falar de um sofrimento insuportável e de uma angústia tamanha, impossível de explicar. Relatam que os momentos que antecederam a tentativa foram tomados por um sentimento de tristeza ou de raiva de grande proporção que o levou a querer ‘terminar com isso'”, abordam as profissionais.
O texto ainda reflete sobre a intenção de morte. “É como se o sofrimento atingisse seu ápice e a morte surgisse como a única solução possível, mas não porque se deseja morrer, na verdade não sabemos o que é morte, pois não existe um registro no inconsciente do que seja. É impossível imaginarmos a própria morte, sempre que tentarmos fazer isso, ainda assim estaremos presentes enquanto espectadores. Mas por que então alguém que não quer morrer acaba investindo contra a vida?”.
Ainda segundo Marina, nos transtornos mentais severos como esquizofrenia, o sujeito pode ser levado a tentar contra a vida em função dos delírios e alucinações decorrentes do transtorno. “O suicida não quer morrer, ele quer matar o sofrimento que o habita. Mas que sofrimento é este? É muito individual e faz parte da história de cada pessoa, e quase sempre é algo desconhecido até mesmo para o próprio sujeito, é daí que surge a angústia que toma conta, mas que não sabem explicá-la”, argumenta.
Sintomas depressivos, como tristeza profunda, apatia, isolamento e raiva costumam ser comuns nestas situações. Para Marina, isso tudo é desfecho de uma série de fatores que se acumulam na vida e serão quase sempre os precipitadores da ação, da ‘passagem ao ato’, como se diz na psicanálise.
Qual o melhor caminho?
Na opinião das profissionais, para prevenir é preciso dar voz aos sintomas, já que é através deles que se conseguirá amenizar o sofrimento e prevenir o suicídio. “O suicídio por si só é uma questão muito complexa, por estar relacionado a transtornos mentais severos, a sofrimentos e conflitos psíquicos que não podem ser mensurados e, somando-se a isso, ao estigma social que os transtornos mentais carregam, dificulta muito a procura por ajuda. A prevenção muitas vezes não é discutida porque não há entendimento de que o suicídio, além de ser um problema de saúde pública, envolve questões sociais, de educação, de cidadania e direitos e de trabalho”, reforça Marina.
Quando se pensa em políticas públicas efetivas no sentido da prevenção, a psicóloga destaca que é necessário “um trabalho integrado, envolvendo educação, esportes, assistência social, em que vários setores atuem no sentido de melhorar as condições de saúde dos cidadãos, sempre levando em consideração o contexto em que esta pessoa vive e trabalha ou estuda”.