Projeto demonstra potencial do etanol como combustível renovável.

Por Niomar Pereira
O planeta Terra está dando sinais visíveis de esgotamento, e há uma urgência por mudanças no modo de vida da sociedade, sobretudo no aspecto do transporte. Os veículos a combustão emitem níveis elevados de gás carbônico (CO2) na atmosfera, o que os torna um dos principais vilões do aquecimento global e das mudanças climáticas. Criar um veículo sustentável que mantenha um consumo baixo de combustível passou a ser uma exigência inegociável da sociedade. Por isso, as universidades estão desafiadas a formar profissionais do futuro preocupados com essa mudança de paradigma.
Na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), campus de Pato Branco, o projeto Pato a Jato está em andamento desde 2009 com seu foco voltado para a sustentabilidade e eficiência energética. Sob a coordenação do professor doutor Luiz Carlos Martinelli Junior e do professor doutor Bruno Bellini Medeiros, a equipe conquistou o recorde latino-americano de 767,9 quilômetros por litro de combustível em 2023. Isso mesmo que você leu: um carro voltado para competições de eficiência energética que percorre toda essa distância com apenas um litro de etanol. Mas essa marca não veio da noite para o dia. Até alcançar seu melhor desempenho, a equipe participou de inúmeras competições de cunho energético sustentável, aprimorando-se ano após ano. O projeto envolve os cursos de Engenharia Mecânica, Engenharia Civil, Engenharia Elétrica, Engenharia de Computação, Administração, Ciências Contábeis e Letras; todos do Campus Pato Branco.
Um projeto modelo
A Pato a Jato já conquistou quatro vezes o 1º lugar – de 2017 a 2022 – na Shell Eco-marathon Brasil, uma competição anual que desafia estudantes a projetar, construir e pilotar veículos com alta eficiência energética. O objetivo é percorrer a maior distância com a menor quantidade de combustível possível, promovendo a inovação e o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis no setor automotivo. Em 2023, os alunos e professores conquistaram o 2º lugar no Shell Eco-Marathon Américas, nos Estados Unidos, quebrando o recorde latino-americano. Os alunos participaram novamente neste ano, no mês de abril, obtendo o 4º lugar. Além disso, o time coleciona vários primeiros lugares na categoria off-track Shell Eco Marathon (fora de pista), como em segurança, design, inovação tecnológica, segurança, entre outros.
A pesquisa é fundamental
Segundo o professor Luiz Carlos Martinelli, mais importante do que os prêmios é o fato de que os alunos estão colocando a cabeça para funcionar e aprendendo a superar o desafio da eficiência energética com pesquisas. Há uma célula de projetos, recém-implementada, voltada para pesquisa, desenvolvimento e extensão. Já foram realizados oito Trabalhos de Conclusão de Curso (TCCs), todos focados em inovações do protótipo, que está em sua 12ª versão.
Essas atualizações, baseadas em pesquisa, incluem desde melhorias na análise aerodinâmica do carro por meio de simulação até a substituição da estrutura da carenagem de PVC por fibra de vidro e fibra de carbono, visando reduzir peso e aumentar a eficiência do protótipo.
Desde 2013, o projeto utiliza somente o Etanol como combustível, por ser de fonte renovável. Aliás, este é um diferencial, pois na categoria de carros a combustão é a única equipe que usa o Etanol, todos os demais veículos consomem gasolina.
Martinelli relata ainda que a equipe possui dois projetos de iniciação científica: um na área estrutural, que envolve o uso de fibra de Juta, uma erva lenhosa e fibra têxtil vegetal; e outro na área eletrônica, que consiste em uma telemetria que fornece análise, por meio de diversos sensores, da condição em tempo real do carro. Além disso, há uma pesquisa focada em aumentar a eficiência elétrica do veículo, visando reduzir o consumo de energia.
Existe também uma linha de pesquisa voltada para um carro elétrico estilo urbano, onde o acadêmico está desenvolvendo um controlador para o motor do veículo. “Todos os processos de pesquisa contribuem para o protótipo e para a equipe como um todo.” Embora seja um veículo de competição específico, todos os projetos e processos oriundos da pesquisa, podem ser traduzidos do meio acadêmico para o comercial, desde a metodologia de laminação do protótipo até a versatilidade da telemetria para ser aplicada em outros setores.
Veículos híbridos com etanol e baixa emissão de carbono

O professor Luiz Carlos Martinelli, que possui mestrado e doutorado em Engenharia Mecânica, entende que o futuro da mobilidade urbana será muito mais limpo do ponto de vista da pegada de carbono emitida pela locomoção humana. “Especialmente no Brasil, contamos com uma matriz energética muito diversificada, majoritariamente renovável, e a estrela dessa matriz, na nossa ótica, é o etanol. Vemos um enorme potencial nele, pois existem muitos indicativos de que ele é um elemento de transição energética muito importante.”
Segundo ele, a atual matriz energética não comporta uma forte ascensão de veículos puramente elétricos. No entanto, o etanol, quando aliado a veículos híbridos, pode ser uma solução muito viável por diversos motivos que merecem destaque. O primeiro é a flexibilidade para o motorista abastecer seu carro. O segundo é a eficiência energética desse combustível quando combinado com um sistema híbrido. “Facilmente encontramos veículos híbridos flex que conseguem médias de consumo próximas a 20 quilômetros por litro de combustível.”
Martinelli menciona que outro ponto positivo é a emissão de carbono muito reduzida do etanol; estudos comprovam que o combustível emite até 90% menos carbono em sua cadeia, quando comparado à gasolina. O pesquisador ressalta que, quanto à mobilidade e aos veículos, nota-se uma grande demanda por carros puramente urbanos, ou seja, de pequeno porte. “Os populares compactos e subcompactos são a pedida do momento para enfrentar a selva de pedra e contornar muito bem os apertos a que o trânsito submete o motorista.”
Para ele, esses veículos, com baixo peso e baixa potência, fazem sentido serem puramente elétricos, pois não demandam tanta energia e potência de carregamento. O ponto negativo é que a maioria deles possui um alcance próximo de 150 a 200 quilômetros com uma carga completa, o que é perfeito para a cidade, mas não recomendado para viagens longas.” Diante desse cenário, Martinelli afirma que os cursos de engenharia procuram incentivar o pensamento criativo dos estudantes, com o objetivo de formar profissionais versáteis, capacitados para desenvolver tecnologias e soluções para áreas como essa.
Alunos destacam aprendizado e experiência internacional na Shell Eco Marathon Américas

Sobre a participação na Shell Eco Marathon Américas deste ano, nos Estados Unidos, os alunos destacam a importância do aprendizado e do convívio com equipes de outros países.
A acadêmica Andrielly Berthe (Administração), por exemplo, diz que a participação na Shell Eco Marathon Américas deste ano proporcionou à equipe uma visão muito importante para o futuro. “Nesta oportunidade, competindo com equipes de diversos países, conseguimos identificar pontos cruciais para o desenvolvimento do nosso protótipo. Além disso, destacamos a importância do espírito de equipe e da reflexão sobre onde queremos chegar, plantando uma semente de sustentabilidade para as próximas gerações.”
Segundo ela, além do desenvolvimento pessoal e profissional, a equipe conseguiu implementar projetos e colocar em prática os aprendizados da sala de aula. “Na equipe, é possível atuarmos em diversas frentes, realizarmos pesquisas, participarmos de projetos com a comunidade e desenvolvermos competências importantes para o mercado de trabalho.”
Para Victor Soares (Engenharia Civil), apesar de o pódio não ter vindo neste ano, a competição serviu para trazer experiência para os membros estreantes que, a partir de agora, irão compor a nova gestão da equipe. “Poder trabalhar com a equipe neste período de competição é sempre gratificante, claro que com os desafios e responsabilidades exigidos. Viajar internacionalmente, conhecer pessoas de diversos países, se comunicar em uma língua estrangeira com todos os desafios que surgem, representando o Brasil e a universidade em uma competição dessa magnitude, em um dos maiores autódromos (Indianápolis-EUA), na capital mundial da corrida, é a experiência de uma vida.”
O aluno Gustavo Caldato (Engenhara Mecânica) destaca que, além de compartilhar conhecimento e experiências, todos os problemas e desafios que surgem durante a competição estimulam os integrantes a trabalhar em conjunto para buscar novas soluções de forma rápida.
Gabriel Paulichen (Engenharia Mecânica) finaliza: “Cada etapa dessa jornada me possibilitou ampliar meus horizontes. Além disso, essa experiência me fez perceber a importância da inovação, do trabalho em equipe e da sustentabilidade nos dias de hoje.”