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Francisco Beltrão
sábado, 24 de maio de 2025

Edição 8.211

24/05/2025

Dona Otília Vacari, da Cango, é um exemplo de vida

Dona Otília está com 91 anos. Dedicou 50 pra igreja.

Otília Constantino Vacari é natural de Orleans (SC). Nasceu dia 10 de outubro de 1934. Aos 6 anos, ela e seus pais, Boaventura  Constantino e Alícia Bacherotto, mudaram para  Tupiranga, cidade capital da cebola. Foram morar na Comunidade Rio das Pacas. Eram 9 irmãos, Otília é a segunda.

Aos 13 anos, ela trabalhava na roça, ajudava seu pai arrastar madeiras do mato com junta de boi. Era um  serviço pesado. A escola ficava longe. No inverno, sofriam muito: andavam descalços, os pés ficavam congelados, rachados, devido ao frio.

Otília tinha 18 anos quando, durante uma festa da comunidade, iniciou o namoro com o vizinho Meni Vacari. O sítio deles ficava a dois quilômetros um do outro. No domingo seguinte, Meni foi até a casa de Otília pedir aos seus pais se poderia namorá-la. Eles aceitaram. O namoro era só aos domingos à tarde. Meni ia a pé. Foi um ano de namoro.

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Em 19 de dezembro de 1953 casaram-se,  num  sábado às 9h, na igreja do Rio das Pacas. Otília foi a pé, vestida de noiva, pra igreja. Antes de chegar na igreja tinha que passar pela  casa do Meni. Daí seguiram juntos a  pé, com vários convidados. A igreja não ficava longe. Havia 60 convidados. A festa aconteceu na casa do Meni. Carnearam um porco, galinha, cozinharam arroz, feijão, macarrão, mandioca, bolacha, cuca e pão. Pra beber, vinho e gasosa. Os convidados passaram  a tarde com os noivos. “Não teve dança, só prosa”, diz Otília.

Foram morar na casa do patrão de Meni, dono de uma  serraria, que era  um homem muito rico. A casa era “de material”, bem grande. No patrão, morava com  sua esposa, seus dois filhos e seus pais. Ainda sobrava bastante espaço.

Moraram com eles por seis  meses. “Nos trataram muito bem”, diz Otília. Daí o patrão fez uma casa nova  de madeira e mudamos. Um ano depois nasceu a primeira filha, Irene, daí vieram a Íria, Maria Ivonete (falecida), Izolete, Wilson, Neri, Marli e o Sérgio (falecido). Irmã da Otília, a Angelina casou com o Mário irmão do Meni.  Trabalharam na serraria por cinco anos. Depois  arrendaram um sítio. Meni e Mário souberam que no Paraná tinha terras muito boas, não igual ao areião onde plantavam. Resolveram mudar pro Paraná. Otília vendeu a vaquinha que ganhou de  presente de casamento do seu pai, para pagar o frete. Vieram Otília, Meni e três filhos. O Mário e a Angelina. Foram cinco dias de viagem. Passaram muito frio na estrada, todo dia amanhecia branco de geada. Dormiam na carroceria do caminhão, que era  coberto por uma lona.

Dia 24 de junho de 1960 chegaram em Beltrão, onde hoje tem a Cattani. “Era só mato.” Otília e Angelina ficaram  desesperadas, imaginavam outra coisa. Só não voltaram com o mesmo caminhão porque não tinham mais dinheiro. Alugaram uma casa, estavam perdidos. Otília lembrou que seu tio, o Dilo Matilde Constantino, também tinha vindo para o Paraná. Souberam que já  existia uma rádio, a Rádio Colméia, hoje Rádio Princesa, foram até ela e colocaram um recado pra localizar os tios. E deu certo. Oito dias depois, Dilo chegou a cavalo. Ele estava morando no interior do Verê. Então arrumaram uma carroça pra levar a mudança, e foram com o Dilo.

Pra chegar lá não tinha estrada. Ao lado do sítio do Dilo havia um terreno e uma casinha feita de tábua lascada e coberta de tabuinha. “O  buraco menor era a porta”, diz Otília. O dono morava em outro sítio. Foram morar ali e começaram a derrubar o mato daquele terreno.

Dilo falou “quando o dono vier, explicaremos a situação de vocês pra ele, não estamos invadindo”. Fazia dois  meses, quando chegou um homem a cavalo, estava armado e pediu calmamente o que estava acontecendo. Na  casa, no momento, só Otília e Angelina. Elas ficaram com muito medo. Era o dono do terreno, ele se chamava Santino Girardi.

Santino também havia vindo da mesma cidade deles. Então, sabendo da situação, Santino fez uma  proposta que naquele ano eles  poderiam morar ali e não precisariam pagar a arrenda. “Estou fazendo isso pra ajudar vocês”, disse Santino.  “Só me pagam partir do próximo ano.”

A terra realmente era muito boa, eles colheram tanto milho e tanto feijão com aquela colheita, que conseguiram comprar um sítio na comunidade de Santa Lúcia, em Dois Vizinhos.

Uma das lembranças que Otília não esquece era que o pessoal de lá rezava os terços da tarde na igreja. Otília pediu se eles poderiam rezar de manhã. O pessoal aceitou, Otília e Angelina cantavam bem, Meni Mário também eram bons na música, “cantavam igual dois canários”, recorda Otília. Em pouco tempo, devido à animação das músicas durante as rezas, toda a comunidade passou a rezar com eles de  manhã. Em 1966, Meni e Mário queriam voltar “de todo jeito” pra Santa Catarina.  Nesse mesmo ano a família de Otília também veio pro Paraná. Então o pai da Otília fez eles ficaram, pois lá estava pior que aqui.

Meni e Mário compraram dois lotes no Bairro da Cango, na Rua Senador Vergueiro, esquina com a Rua Santa Maria. Pagaram num 200 mil cruzeiros e 250 mil  pelo da esquina. Venderam o sítio e construíram as casas. Os pais da Otília ficaram morando em Santa Lúcia. Mário foi trabalhar de pedreiro (ele que construiu a atual igreja da Cango). Meni foi  trabalhar de guardião para a empresa Getsop.

Otília foi na Prefeitura pedir emprego para o prefeito Antônio de Paiva Cantelmo e começou de zeladora no colégio Frei Deodato. Meni trabalhou de guardião por cinco anos, até que o Getsop foi encerrou sua missão. Daí  começou de pedreiro junto com o Mário. Meni e Otília compraram mais um lote na Rua Marques de Abrantes, e estavam construindo uma casa nova. Faltou sala de aulas no Colégio Frei Deodato, então cederam a casa para os alunos estudarem. Durante quatro anos, de  manhã e  de tarde, mais de  40 alunos. Nunca cobraram nada.

Daí veio o projeto Rondon e foram construídas mais salas de aula. Em 1980, Meni faleceu de câncer, aos 45 anos. Otília sempre foi uma pessoa bondosa, pensava mais nos outros do que em si mesma. Ela dedicou 50 anos de sua vida para a igreja. Sempre fez tudo com muito amor, carinho e respeito. Dona Otília trabalhou no colégio por 30 anos, e nunca faltou um dia no trabalho. Lá, fazia um pouco de tudo. Além de zeladora, foi cozinheira e professora. Otília foi catequista, participou do coral municipal, do grupo de idosos, das missões, cantava no Morro do Calvário, por 20 anos foi coordenadora do apostolado da oração.

Sempre se deu bem com todos os padres do decanato. Criou o Terno de Reis em Beltrão. Fez muitos cursos de formação, viajando pelo Brasil. Trabalhava nas festas da igreja, seus filhos ajudavam também. Coordenava os  grupos de famílias no interior, comunidades do Divisor, Rio Tuna, Nova Concórdia, Rio do Mato e Seção Jacaré. Muitas vezes cantou sozinha durante a missa, sem som, ela dava conta do recado.

Quando morava com seus pais, Otília e sua irmã Rosa trabalhavam cantando. Cantavam músicas sertanejas e antigas, de  Zilo e Zalo, Teodoro e Sampaio. As vozes delas bem afinadas, se ouvia de longe, no silêncio do interior. Os vizinhos ficavam contentes com as cantorias. Eles não tinham rádio, aprendiam vendo outros cantarem em festas. Na segunda vez que ouviam a mesma música, já aprendiam.

Otília diz que sente muita saudade do tempo que lavava roupa nas então águas limpinhas do Rio Marrecas, saudades dos padres, Afonso, Agenor e Vitorino. Otília fica feliz quando recebe a visita dos padres Vitor, Cezar e Marcos. Ela está com 91 anos, mora sozinha no Bairro da Cango; uma moça ajuda de  manhã com os serviços. Mas é ela quem faz seu almoço, está bem de saúde. Cada  noite vem um  filho  pousa com ela. Otília vive muito feliz e está contente, pois geralmente encontra seus alunos de catequese e pessoas do interior dos grupos de família, que a tratam com muito carinho. Isso é  muito bom, diz Otília, pois sabe que o seu dever foi cumprido.

Dona Otília tem 8 filhos; acima, está com a filha Íria, que é a segunda.

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