
Há 16 anos, o são-joanense José Antonio Rezzardi fazia o lançamento de seu primeiro livro, com um título bem original: “O Escrevinhador”. Eram crônicas que ele havia publicado no Jornal de Beltrão, sobre a gente e a cidade de São João e as demais do Sudoeste do Paraná.
Em 2009, Rezzardi publicou um segundo livro com o título “A viagem de volta”. Talvez uma previsão de suas andanças, porque de São João ele mudou para Dois Vizinhos, depois Pato Branco, Guaratuba, Manaus e, enfim, São João outra vez. É dele o programa Mistura Legal, de todas as tardes (13:30 às 17 horas, com “muita música e pouca prosa”) na Rádio São João.
Sobre “O Escrevinhador”, segue uma crônica de Jorge Baleeiro de Lacerda publicada no Jornal de Beltrão do dia 27 de outubro de 2006, há exatos 16 anos hoje.
José Rezzardi lançou “O Escrevinhador”, crônicas, artigos e causos com a cara da região Sudoeste
Todo sudoestino que ama esta terra deve ler essa obra.
Por Jorge Baleeiro de Lacerda
Imagino São João, aqui no Sudoeste do Paraná, engalanada para receber José A. Rezzardi, em sessão solene da Câmara Municipal, e em palestras nas escolas. Não faria nada de excepcional. Rezzardi faz São João ingressar com 500 anos de atraso na Galáxia de Gutemberg, no universo do livro impresso, desta feita através de um filho adotivo seu. Trata-se do primeiro filho da terra que escreveu um livro denso, tratando de gente da terra que escreve um livro denso, como Pedro da Papuda, cesteiro da Vila Paraíso, onde seu pai Elmo Rezzardi de carpinteiro também vivia.
Seu livro fixa momentos de milagres de jovens rurais como o autor, nos 70. Estudava na cidade, fazia quilômetros a pé (ou “de pé a pé” como dizem muitos!) e ajudava, à tarde, na roça. Não havia o ônibus da prefeitura (mordomia posterior) para apanhar os alunos. Rezzardi não contava com a bolsa-escola!!! O sonho de uma vida melhor, “as luzes da cidade grande”, povoaram a imaginação do jovem Antoninho. Partiu para Curitiba aos 16 anos. Como hoje, milhares de jovens deixam suas famílias para “estudar fora”. Nessa página evocativa da dor da partida, das lágrimas dos pais e da ânsia de descobrir novos mundos, Rezzardi fala por todos que, com o coração envolto pela dor da saudade, mas movido pela força do desafio, pela vontade de ganhar o mundo, saem de casa, deixam sua aldeia, que um dia verão, tão importante, tão bela, síntese de tudo que haveriam de vivenciar. Aldeia universal que só os capazes de grandes voos literários expressam na sua profundidade. Há que entender a vida, sua fugacidade para escrever sobre sua linha, sua aldeia. Rezzardi a entendeu.
Cada novo livro que surge sobre o Sudoeste, o povo desta região amplia sua presença na Galáxia de Gutemberg, consolida sua colaboração no processo civilizatório do Sudoeste, deixando para trás mundos outros, singelos, quase selvagens e carentes de maior avanço em que o homem pudesse auferir o avanço circundante. O lançamento de um livro de crônicas, artigos, textos e causos como “O Escrivinhador” impede que cidades mais adiantadas culturalmente nos ironizem. “Cultura naquela região deve ser de milho, soja e feijão!” Já foi! Mudou muito! E a cada novo livro, esse tipo de brincadeira torna-se mais inadequada. Lembro-me com que entusiasmo o José A. Rezzardi e este caboclo percorreram o Sudoeste, divulgando o Congraçamento sudoestino. Foi realizado oito vezes. A ideia central era promover tudo que estivesse “cheiro” e “cor” sudoestinos. Naquela semana pensar-se-ia o Sudoeste, o que nos distingue, o que nos faz “sui generis” no contexto do Paraná. Vitor Hugo Ribeiro, cronista de talento, criador de “Boleslau Chispa”, vendedor de gravatas horizontais, amigo do Rei Vitorino II (da Realeza de Vitorino) e fundador da fictícia Academia Sudoestina de Letras, disse bem: “Já que o Congraçamento Sudoestino caiu no esquecimento, resta-nos ler o livro do Rezzardi, nós que vivemos à margem esquerda do rio Iguaçu”. Cabe registrar que Vitor Hugo, geógrafo bissexto e topógrafo honorário, foi quem dividiu o Sudoeste em Ocidental e Oriental, tendo o rio Santana como “divortium aquarium” dessas duas bandeiras geográficas. Todo sudoestino que ama esta terra deve ler o livro do Rezzardi, em que muitas páginas, mutatis mutandis, têm semelhanças com suas vidas de sudoestinas, mormente de São João, Dois Vizinhos, e Pato Branco, cidades em que o autor viveu. E como se não bastassem sua “vis literária”, a plurivivência sudoestina, Rezzardi tem o sangue de polonês com 1.000 anos de raízes na Polônia através dos Dominski, Cybulski, avós maternos e, na Itália: Os Zanchetta / Richardi (que o cartório mudou para Rezzardi), avós paternos italianos com raízes no vento há séculos, como tantos desta região. E para ampliar e consolidar a fraternidade multiétnica casou-se com Andriana M. Klein, de origem alemã, de que nasceu Josiana (Jô) Priscilla Klein. Querem família mais tipicamente sudoestina? Só lhes faltou algum sangue bugre; algumas gotas de plasma ucraniano e estaria completa a colcha-de-retalhos das etnias do Sudoeste. Ninguém mais que Ivo Pegoraro, autor de “Mitos”, vibra quando um novo livro é lançado no Sudoeste. Diz-me sempre: “Essa gente tem que publicar. Não precisa ser livro de 300, 200, 150 páginas. O importante é ampliar essa estante sudoestina”. E esse livro do Rezzardi “O Escrevinhador, lavrado em bom vernáculo, de leitura agradável, ajuda a perpetuar no mármore, momentos idos e vividos desta região. Avante! Sucesso para o Escrevinhador”.
Jorge Baleeiro de Lacerda
Autor de “Os dez Brasis” – Colunista
do Jornal de Beltrão aos sábados
Hoje, Rezzardi “escrevinha” e fala no rádio
Rezzardi continua produzindo textos e publicando em redes sociais, mais sobre São João. E ele ilustra seus textos com belas fotos, também de sua produção.
O texto que segue ele postou dia 10 deste mês.
Deus, eu e os jardins
Dizem os textos sagrados que Deus trabalhou seis dias para plantar um jardim. Terminado o trabalho, já não havia nada mais para ser feito. E foi justamente então que Deus sentiu a maior alegria. Terminado o tempo do trabalho, chegara o tempo do desfrute. E o Criador se transformou em amante: entregou-se ao gozo de tudo o que fizera. Com as mãos pendidas, seus olhos se abriram mais. Olhou para tudo e viu que era lindo. Pôs-se a passear pelo jardim, gozando as delícias do vento fresco da tarde. E, embora os poemas nada digam a respeito, penso que o Criador tenha também se deleitado com o gosto bom dos frutos e com o perfume das flores – pois que razões teria Ele para criar coisas tão boas se não sentisse nelas prazer?
