“A espera prolongada de atendimento nos casos de câncer significa condenar um paciente com potencial de cura, selar seu destino da pior forma.”
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Reunião com representantes do Ceonc e da Associação Regional de Saúde.
Fotos: Leandro Czerniaski
A pandemia de coronavírus não está causando apenas mortes por Covid-19 no mundo, há uma grande preocupação com o aumento dos casos de câncer. As medidas de isolamento social fizeram muitas pessoas deixarem de lado seus exames de rotina e retardar o diagnóstico da doença. Segundo estimativas das Sociedades Brasileiras de Patologia e de Cirurgia Oncológica, desde o início da pandemia de Covid-19 no País, ao menos 50 mil brasileiros deixaram de ser diagnosticados com câncer. Outros milhares de pacientes, já com o tumor detectado, tiveram os tratamentos suspensos. Só em abril, cerca de 70% das cirurgias de câncer foram adiadas. Há uma recusa de pacientes com outras doenças ou sintomas em procurar hospital ou clínica por medo de pegarem o coronavírus.
De acordo com o oncologista Daniel Rech, médico do Centro de Oncologia de Francisco Beltrão (Ceonc), ao longo desse período houve uma enorme redução na procura de atendimentos e esse fenômeno está acontecendo em todo mundo. “Infelizmente, o medo dessa nova doença causada pelo coronavírus desmotivou a população. Sabemos que as incidências das outras doenças, sejam elas de origem cardíaca, pulmonar, ou mesmo câncer, continuam existindo; elas não desapareceram num passe de mágica. A espera prolongada de atendimento nos casos de câncer significa condenar um paciente com potencial de cura, selar seu destino da pior forma. A legislação nos determina o tratamento em até 60 dias após o diagnóstico, ou seja, esperar esse tempo todo não só é ilegal como irracional.”
A redução aproximada no Ceonc de Beltrão foi de 48% nas consultas ambulatoriais e procedimentos e as estimativas são ainda piores quando se vislumbra os serviços de prevenção e imagem, como a mamografia. “Nesses últimos recai a maior preocupação, pois é nessa prevenção que conseguimos modificar a história dos pacientes”, comenta.
O oncologista falou aos prefeitos da região na manhã de ontem, 26, em reunião da Associação Regional de Saúde do Sudoeste (ARSS) e pediu que os municípios não deixem de lado o tratamento de outras doenças. “Lentamente estamos tentando retomar nossas atividades com os devidos cuidados e restrições de contato, sabemos que isso é difícil, mas estamos tentando fazer o possível.”
Segundo ele, o medo dos pacientes os impede de procurar atendimento, e além disso tudo parece se voltar para o Covid-19, todos os recursos e pessoas parecem direcionados para esse fim, colocando em segundo plano as outras condições de saúde, sejam elas quais forem.
Dr. Daniel salienta que o Ceonc está tomando todos os cuidados necessários para manter os tratamentos dos pacientes oncológicos. “Procuramos manter o distanciamento entre os pacientes, uso obrigatório de máscaras, álcool gel. Restrições nos acompanhantes e visitas, além de evitar o acesso de pessoas e pacientes com sintomas gripais de qualquer tipo.” A recomendação da Sociedade Brasileira de Oncologia é de não interromper os tratamentos, pois sabe-se que esses pacientes não terão uma segunda chance.
Situação financeira
Muitos hospitais privados do País estão enfrentando dificuldades financeiras também, pois seus atendimentos despencaram. O Ceonc, por exemplo, já teve que fazer demissões e reduzir seu quadro de profissionais. “Estamos fazendo o possível para manter a normalidade, mas sem a procura devida dos pacientes, assim como nos outros hospitais do País, fica inviável a manutenção das atividades. O Ministério da Saúde, através da prefeitura, mantém os pagamentos conforme portaria recente, garantindo algum financiamento das atividades, mas sabemos que isso não se sustenta por muito tempo, é preciso manter o funcionamento. Aqui ressalto que não adianta nada a promessa de recursos se os pacientes chegarem tardiamente para o atendimento, com doenças incuráveis. Nossa situação atual é buscar alternativas para receber os pacientes que necessitam de auxílio, tentar preservar o hospital e deixá-lo livre do Covid-19, embora saibamos que isso é um luxo quase impossível.”
Diagnóstico precoce salva vidas
A presidente da ONG Mão Amiga, Lurdes Giacobo, também observa que, por diversas razões, a principal delas medo de contágio do coronavírus, as pessoas não estão procurando atendimento médico. “Por medo, por pensar que vão esperar a pandemia passar, só que o câncer não espera. O diagnóstico precoce pode salvar vidas. Principalmente os que estão com sintomas e ainda não têm o diagnóstico, pensam que podem aguardar a pandemia passar e é aí que mora o problema. Um mês, dois meses podem fazer muita diferença quando se trata de um diagnóstico de câncer.”
Lurdes ressalta ainda que muitos especialistas no assunto falam que haverá logo uma epidemia de doentes de câncer em estágio avançado, comprometendo a vida dos pacientes. “Como são tratamentos mais caros para o sistema de saúde, também poderá ocorrer falta de vagas nos hospitais de câncer. Porque nesses meses da pandemia não deixou de ter câncer, as pessoas é que estão deixando de tratar. Nós estamos fazendo um trabalho de conscientização nas redes sociais da Mão Amiga e nas rádios chamando atenção da população para isso”, comenta Lurdes.
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