Para reduzir dívidas, empresas estatais poderão ser cedidas para a União; ideia é semelhante à que liquidou os bancos estaduais nos anos 90.
O plano de socorro aos Estados, que o governo vai enviar ao Congresso Nacional como parte das medidas de reforma fiscal para reequilibrar as contas do setor público, abrirá a possibilidade de federalização de empresas estatais estaduais. Elas serão aceitas pela União e depois privatizadas.
“Cada Estado vai apresentar a empresa que acreditar que é interessante se desfazer em troca de uma redução no fluxo de pagamento de dívidas”, informou o secretário do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira. Segundo ele, as empresas de distribuição de gás são candidatas a entrar na lista. Também serão aceitas participações acionárias dos Estados em empresas.
O resultado obtido com a alienação dos ativos será aplicado, como redutor, nas prestações mensais da dívida que eles têm com a União ao longo dos cinco anos seguintes à venda.
Na primeira grande renegociação das dívidas dos Estados, em 1997, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, também foram aceitas empresas estatais, como os bancos públicos, por exemplo.
“O governo federal tem deixado claro a intenção de privatizar ou conceder empresas estatais desde quando inicou as concessões de portos e aeroportos. Acho essa política positiva, desde que seja bem regulada pelas agências e o serviço que atende a população não fique somente a mercê do interesse privado das concessionárias”, comentou o arquiteto Arthur Cantelmo, de Francisco Beltrão.

Mas ele faz uma ponderação: “Em relação ao plano de socorro aos Estados, vejo com algumas ressalvas. Em troca da renegociação das dívidas, o que é positivo, os Estados poderão entregar suas estatais à federação, que poderá privatizá-las ou não, com tudo o que isso representa: o emprego e a renda local. No entanto, na situação em que se encontra o caixa dos Estados, vejo como uma solução plausível para a retomada de investimentos e o equilíbrio fiscal”.
Cético, o empresário beltronense Edson Flessak critica os políticos. “Infelizmente os políticos que estão aí só têm interesse em se manter no poder. E as medidas em discussão são somente pra cumprir tabela e dar a entender que estão fazendo algo. Não acredito em nenhuma medida que não reduza despesa pra diminuir o déficit público”, pontuou, criticando o que considera uma nefasta tradição brasileira: “Independentemente da empresa ser municipal, estadual ou federal, a máquina pública gasta mal e necessita arrecadar mais pra cobrir a ineficiência”.

Possibilidade positiva
Para o secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, Renato Villela, a possibilidade de a União aceitar as empresas como parte dos pagamentos é positiva, porque melhora o fluxo de caixa dos Estados. “Mas é preciso conhecer os detalhes”, disse. Segundo ele, o Estado tem interesse e está estudando alternativas. Mas preferiu não citar o nome de que empresa poderia ser envolvida.
“A ideia é boa, mas, infelizmente, não sei se há condições de se reproduzir a mesma estratégia de duas décadas atrás”, disse o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas, José Roberto Afonso.
Para ele, pouca gente atentou para o fato de que a rolagem estadual de dívidas após o Plano Real foi um processo vinculado à desestatização, no âmbito estadual e nacional. “É um processo que exige vontade política, competência técnica e condições econômicas diferenciadas. Não sinto que as mesmas condições estejam postas hoje”, disse.
Prazos
No projeto atual, que altera a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e será encaminhado ao Congresso no final do março, o governo se propõe a alongar o pagamento da dívida dos Estados com a União em mais 20 anos.
O prazo dos empréstimos contratados no BNDES pelos Estados poderá ser alongado em até 10 anos. A expectativa é de redução nos pagamentos que pode chegar a R$ 36 bilhões nos próximos três anos.
Ladeira disse que o plano é positivo porque vai ajudar a melhorar o fluxo de caixa dos governadores neste momento de crise, sem que haja subsídio adicional do Tesouro na operação, já que as condições de juros dos contratos serão mantidas.